TRANSFERÊNCIA DE ESTABELECIMENTO
Responsabilidade do Sucessor - Exclusão da Multa

RECURSO Nº 672/95 - ACÓRDÃO Nº 1.160/96
RECORRENTE: (...)
RECORRIDA: FAZENDA ESTADUAL
(Proc. nº 01522-14.00/1988)
PROCEDÊNCIA: PELOTAS - RS
EMENTA: ICM

- Impugnação a Auto de Lançamento.

- Acolhida a preliminar argüida, pelo voto de desempate do Presidente da Câmara Suplementar do TARF, assim transcrito:

"Tendo havido empate na votação da preliminar argüida pela recorrente, cabe a esta Presidência dirimir o impasse.

Compulsando os autos, verificamos que a firma (...) não era integrada por nenhum dos sócios de (...). Quem isso informa é a própria ‘Réplica Fiscal’ à fls. 92 a 101, corroborando as alegações da defesa. Os componentes de (...) eram empregados de (...) como está comprovado pelos documentos juntados à fls. 192 a 212.

A Firma (...), está legalmente constituída e opera regularmente desde que adquiriu o estabelecimento de sua antecessora em maio de 1986.

Configura-se ‘in casu’, sem dúvida, a situação prevista no art. 133 do CTN. A empresa (...) é sucessora de (...). Aliás o próprio Fisco a reconhece como tal, pois todas as intimações que fez à empresa, sempre a qualifica de sucessora de (...) (fls. 187 e 189), inclusive quando procedeu a intimação do Auto de Lançamento lavrado o fez na pessoa de (...), Gerente de (...), sucessora de (...).

Isto posto, o que resta decidir é se a Empresa (...), como sucessora de (...), deve ou não deve pagar as penalidades propostas no Auto de Lançamento em causa e confirmadas na decisão de 1ª Instância.

O texto do art. 133, ‘caput’, do CTN é claro. O sucessor é responsável pelos tributos. A ‘Réplica Fiscal, à fls. 93, admite isto, que a empresa (...) é responsável pelos tributos.

Surpreendentemente, a decisão monocrática, a fls. 219, não se manifesta claramente sobre o problema, dizendo apenas que a sucessora deve pagar tributos e acessórios. Identifica penalidade como acessório do tributo. ‘Data Vênia’, não é possível aceitar tal entendimento, que contraria toda a sistemática do Direito Tributário vigente, expresso nos artigos 3º, 113, 136 a 138 do CTN, entre outros dispositivos legais. Tributo é uma coisa, penalidade é outra, distintos desde a origem. O primeiro decorrente de ato lícito e a segunda significando punição a prática ilícita, ação ou omissão contrária a uma norma tributária.

Identificar penalidade com tributo constitui, ‘data máxima vênia’, verdadeira heresia jurídica severamente censurada por muitos dos tributaristas nacionais, como por exemplo, Paulo de Barros Carvalho no seu "Curso de Direito Tributário".

Para firmar nosso ponto de vista sobre a presente controvérsia, consultamos mais de vinte obras versando a matéria, de autoria de renomados tributaristas brasileiros, desde os clássicos, a partir de Rubens Gomes de Souza, Fábio Fanucchi, Aliomar Baleeiro, Ruy Barbosa Nogueira, até os mais modernos como Geraldo Ataliba, Paulo de Barros Carvalho, Bernardo Ribeiro de Moraes, Ives Gandra da Silva Martins e outros.

Todos são unânimes em afirmar que o sucessor, nos termos do art. 133 do CTN, só é responsável pelo tributo devido pelo sucedido, não lhe competindo satisfazer penalidades.

Para não alargar em demasia este voto, mencionamos expressamente as opiniões dos comentaristas do CTN, ao se referirem ao citado artigo 133.

Aliomar Baleeiro, no seu ‘Direito Tributário Brasileiro’, diz que o sucessor é responsável pelo tributo somente, citando jurisprudência do STF.

Tavares Paes, em seus ‘Comentários ao CTN’, afina pelo mesmo diapasão, apontando também jurisprudência a respeito.

Washington Coelho, em ‘C.T.N. Interpretado’ e Ives Gandra da Silva Martins, em seu ‘Comentários ao CTN’, volume III, não destoam dos outros antes referidos.

Também Arnaldo Borges, procurador da Fazenda Nacional, em sua clássica monografia "O Sujeito Passivo da Obrigação Tributária", é pelo mesmo entendimento.

A jurisprudência de nossos pretórios, em sua quase totalidade, ratifica a posição adotada pela doutrina, como podemos constatar nas decisões constantes da Revista vista de Direito Tributário, edição da Revista dos Tribunais.

Sabemos que existem diversas teorias relativamente à possibilidade de responsabilizar o sucessor pelo pagamento das penalidades, aliás referidas no brilhante voto do eminente Juiz Revisor, Dr. Ivori Jorge da Rosa Machado.

No entanto, temos lei a respeito, que não podemos ignorar.

O C.T.N., em seus artigos 131 a 138, segundo sustenta Ives Gandra da Silva Martins, nos seus já referidos ‘Comentários ao CTN’, volume III, adotou o princípio da ‘personalização da pena’. Esta não deve passar da pessoa do infrator. Para que alguém seja obrigado a pagar a multa é preciso que, de algum modo, tenha agido ou se omitido em contrário a uma norma tributária, como nos casos dos artigos 134 e 135 do CTN, por exemplo.

Por isso as considerações doutrinárias não podem prevalecer, impondo-se a observância da lei, como sempre tem feito esta Câmara e este Tribunal.

Nem mesmo a interpretação econômica da legislação tribuária pode ser invocada. Ela não foi admitida no Direito Brasileiro. O único País que a adotou plenamente foi a Alemanha em 1920. Hoje, conforme alertou Ramon Tella, professor de Direito Tributário da Universidade de Madrid, em artigo publicado na R.D.T., nº 65, até mesmo a jurisprudência de seus tribunais reduziu consideravelmente a amplitude de sua aplicação, subordinando-a ao princípio da segurança jurídica, característico dos modernos Estados de direito.

Alegou-se também, na discussão da matéria durante o julgamento do recurso, que eliminada a responsabilidade do sucessor, o Estado não poderia cobrar do sucedido a penalidade cabível.

Poderá sim. Diz Aliomar Baleeiro, ao comentar o art. 133 do CTN, no seu ‘Direito Tributário Brasileiro’, que os dispositivos do código não podem ser interpretados como impeditivos da cobrança do alienante de tudo que for por ele devido e que não couber na responsabilidade do sucessor. O alienante, segundo o emérito Tributarista, pode ser chamado, administrativa ou judicialmente, a satisfazer seus débitos para com a Fazenda.

Por derradeiro, ainda se alega que um julgamento favorável à recorrente, abrirá perigoso precedente, ensejando a burla da Lei, pela simulação da sucessão.

Ora, verificada a fraude, constatada que não houve a sucessão, ao contrário do ocorrido ‘in casu’, haverá o abuso da forma, configurando-se a responsabilidade plena de todos os envolvidos, incidível até o art. 135 do CTN.

Por outro lado, não se pode ignorar a preliminar argüida, porque a intimação foi feita pelo Fisco à sucessora, quando deveria fazê-lo aos sócios da sucedida.

A Firma (...), foi trazida aos autos pela Fazenda. Se intimada tivesse sido a sucedida, aí sim caberia discutir-se a responsabilidade pelas penalidades somente na execução judicial, como previsto na Lei Federal nº 6.830/80.

A situação, como está posta, nestes autos é deveras interessante. Diz-se que os sócios da recorrente seriam administradores da sucedida, sem qualquer prova disto. Ao contrário, toda a documentação acostada ao processo evidencia o oposto, como antes se demonstrou. Parece até que os sócios de (...) devem pagar a multa por serem filhos dos integrantes da firma infratora.

Faz-nos lembrar aquela antiga fábula latina do lobo e do cordeiro. Se tu não fizeste, o teu pai fez. Não acreditamos seja esse um critério aplicável em nossos julgamentos.

Por todo o exposto, acolhemos a preliminar suscitada, acompanhando o voto do Juiz Relator e do Dr. Nielon José Meirelles Escouto."

- Quanto ao mérito, dado provimento parcial ao recurso voluntário, no sentido de excluir apenas a multa aplicada. Provê-se, no demais, o crédito tributário constituído, face a Súmula nº 09 - TARF (DOE 06.05.94).

- Incabível quebra técnica e desproporcionalidade entre galeto simples e completo invocados pelo recorrente.

- Maioria, com voto de desempate do Presidente.

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que é recorrente (...), de Pelotas/ RS, e recorrida a FAZENDA ESTADUAL, ACORDAM os membros da Câmara Suplementar do Tribunal Administrativo de Recursos Fiscais, por MAIORIA DE VOTOS, com o voto de desempate do Sr. Presidente, vencidos os Juizes Ivori Jorge da Rosa Machado e Abel Henrique Ferreira, que rejeitavam a pré-facial e negavam provimento, em acolher a preliminar argüida e, no mérito, dar provimento parcial ao recurso voluntário.

Porto Alegre, 30 de abril de 1996.

Vergílio Frederico Périus
Relator

Rômulo Maya
Presidente

Participaram do julgamento os Juízes Ivori Jorge da Rosa Machado, Nielon José Meirelles Escouto e Abel Henrique Ferreira. Presente o Defensor da Fazenda Luiz Carlos Flores Muniz.

Índice Geral Índice Boletim