EXPORTAÇÃO DE SERVIÇOS
DISPOSIÇÕES
PARECER NORMATIVO COSIT/RFB Nº 01, de 11.10.2018
(DOU de 16.10.2018)
Assunto. NORMAS DE INTERPRETAÇÃO - CONCEITOS EXPORTAÇÃO DE SERVIÇOS – CONCEITO PARA FINS DE INTERPRETAÇÃO DA LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA
Considera-se exportação de serviços a operação realizada entre aquele que, enquanto prestador, atua a partir do mercado doméstico, com seus meios disponíveis em território nacional, para atender a uma demanda a ser satisfeita em um outro mercado, no exterior, em favor de um tomador que atua, enquanto tal, naquele outro mercado, ressalvada a existência de definição legal distinta aplicável ao caso concreto e os casos em que a legislação dispuser em contrário.
LOCALIZAÇÃO DA PRESTAÇÃO – ATUAÇÃO DO PRESTADOR DE SERVIÇOS NO MERCADO DOMÉSTICO
O prestador de serviços, enquanto tal, atua a partir do mercado doméstico quando inicia a prestação em território nacional por meio de atos preparatórios anteriores à realização material do serviço, relacionados com o planejamento, a identificação da expertise indispensável ou a mobilização de recursos materiais e intelectuais necessários ao fornecimento.
LOCALIZAÇÃO DA PRESTAÇÃO – ATUAÇÃO DO TOMADOR NO MERCADO EXTERNO –DEMANDA POR SERVIÇOS NO EXTERIOR
O tomador de serviços, enquanto tal, atua no mercado externo quando sua demanda pela prestação ocorre no exterior, devendo ser satisfeita fora do território nacional.
LOCALIZAÇÃO DA PRESTAÇÃO – ATUAÇÃO DO TOMADOR NO MERCADO EXTERNO –SERVIÇOS EXECUTADOS EM BENS IMÓVEIS OU EM BENS MÓVEIS INCORPORADOS A BENS IMÓVEIS
Se o tomador de serviços, enquanto tal, atua no mercado externo e os serviços são executados em um imóvel ou em um bem incorporado a um imóvel, a demanda se considera atendida no território onde se situa o imóvel.
LOCALIZAÇÃO DA PRESTAÇÃO – ATUAÇÃO DO TOMADOR NO MERCADO EXTERNO –SERVIÇOS EXECUTADOS BENS MÓVEIS NÃO INCORPORADOS A BENS IMÓVEIS CUJA UTILIZAÇÃO SE DARÁ APENAS NO EXTERIOR
Se o tomador de serviços, enquanto tal, atua no mercado externo e os serviços são executados em um bem móvel não incorporado a um imóvel, uma vez demonstrado que aquele bem será utilizado apenas no exterior, a demanda se considera atendida no território ou nos territórios onde esse bem deverá ser utilizado.
LOCALIZAÇÃO DA PRESTAÇÃO – ATUAÇÃO DO TOMADOR NO MERCADO EXTERNO –SERVIÇOS EXECUTADOS BENS MÓVEIS SEM CONEXÃO COM DETERMINADO TERRITÓRIO OU EXECUTADOS SEM REFERIMENTO A UM BEM FÍSICO
Se o tomador de serviços, enquanto tal, atua no mercado externo e os serviços são executados em um bem móvel sem conexão necessária com determinado território ou são executados sem referimento a qualquer bem físico, a demanda: a) quando uma parte relevante da prestação deva se realizar necessariamente em determinado local com a presença física do prestador, se considera atendida naquele local; b) quando, embora dispensada a presença física do prestador, for necessária sua presença indireta (por subcontratação) ou virtual (pelo acesso compulsório a serviços eletrônicos locais sem os quais se tornaria obrigatória sua presença física direta ou indireta), se considera atendida onde sua presença indireta ou virtual for indispensável; e c) não havendo qualquer elemento de conexão territorial relacionado com o resultado da prestação, se considera atendida no local onde o tomador tem sua residência ou domicílio.
Dispositivos Legais CF/88, art. 149, § 2º, I, art. 153, V, art. 155, § 2º, X, alínea a e XII, alíneas e e f e art. 156, § 3º, III; Lei nº 9.841, de 13 de agosto de 1997, art. 1º, inciso XI; Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, art. 79; Lei nº 10.637/02, art. 5º, II; Lei nº 10.833/03, art. 6º, II; MP 2.158-35/01, art. 14, III; Dec. nº 6.306, de 14 de dezembro de 2007, art. 15-B. nº do
e-processo 10030.000022/1207-02
Relatório
Trata o presente parecer da definição do conceito de exportação de serviços pra fins de interpretação da legislação tributária federal, levando em conta a intenção do legislador de incentivar a atividade econômica no mercado interno sempre que afasta a incidência tributária dessas operações de exportação, ressalvadas as disposições legais específicas em contrário aplicáveis a determinados impostos ou contribuições, tendo em vista a necessidade da Secretaria da Receita Federal do Brasil de uniformizar a aplicação da legislação aplicável a essas operações.
I
CONCEITO JURÍDICO INDETERMINADO: DA INEXISTÊNCIA DE UM CONCEITO DE EXPORTAÇÃO DE SERVIÇOS E DAS QUESTÕES A ESTE ASSOCIADAS EM SEDE TRIBUTÁRIA
2. O conceito de exportação1 é incontroverso se atinente à movimentação de bens físicos (produtos ou mercadorias) que transitam pelas fronteiras de um país. O mesmo não acontece se a operação envolve serviços e o dispositivo legal que adota tal expressão sem delimitar-lhe o alcance estatui norma aberta, posto que a exportação de serviços per se equivale a um conceito jurídico indeterminado. 2 Não existe na doutrina ou na jurisprudência um consenso sobre o que seria exportação de serviços. Por outro lado, o legislador tributário nacional se omite quanto ao tema, limita-se a prever a incidência, a não incidência ou a desoneração das operações que envolvem o comércio internacional de serviços, geralmente sem oferecer ao aplicador/intérprete da norma parâmetros que orientem sua subsunção aos casos concretos da vida econômica.
3. O problema não é exclusivo do direito brasileiro e tem sido enfrentado de modo variado pelo legislador estrangeiro que, pragmático, busca evitar o uso do termo exportação (e também importação) ao tratar da tributação de operações que envolvam serviços, pautando a matéria tributária relacionada às operações de comércio internacional ora por meio da prescrição de normas gerais ou específicas que permitam determinar3 o local onde se dá a prestação de serviços, ora pela definição do regime de imposição tributária a ser aplicado conforme a localização do prestador ou do tomador do serviço.
4. No Brasil temos no âmbito federal, p.e., a legislação do IOF e a legislação da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins, que podem requerer do hermeneuta uma elaboração complexa antes que este se habilite a reconhecer ou não a ocorrência de uma exportação de serviços e possa, via de consequência, decidir qual o regime de tributação aplicar em determinadas circunstâncias. Situação similar sobrevirá eventualmente em relação aos outros impostos ou contribuições federais, ou aos impostos estaduais ou municipais, sempre que incidentes sobre serviços.
I - A
IOF e o conceito de exportação de serviços
5. O imposto federal incidente sobre operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários (CF/88, art. 153, V), conhecido por IOF, é regulamentado pelo Dec. nº 6.306, de 14 de dezembro de 2007. No seu Título III, “Da Incidência sobre as Operações de Câmbio”, referido decreto prevê no seu art.
15-B (incluído pelo Dec. nº 8.325, de 2014) a redução a zero da alíquota do imposto incidente sobre operações de câmbio conexas com a exportação de serviços:
“Art. 15-B. A alíquota do IOF fica reduzida para trinta e oito centésimos por cento, observadas as seguintes exceções:
I - nas operações de câmbio relativas ao ingresso no País de receitas de exportação de bens e serviços: zero; (...)” (grifos nossos)
6. Para a correta aplicação do dispositivo que prevê a redução da alíquota é preciso, portanto, estabelecer um conceito de exportação de serviços. Porém, a desoneração representada pela aplicação da alíquota zero nas operações relativas ao ingresso de receitas de exportação de serviços não vem acompanhada de outros critérios normativos que permitam vislumbrar, de pronto, o que seria essa exportação. Para solucionar a questão assim aberta, é inevitável buscar referências externas à legislação específica do tributo. I - B PIS/Pasep e Cofins e o conceito de exportação de serviços
7. A CF/88 veda a incidência das contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico sobre as “receitas decorrentes de exportação” (inclusive de serviços), conforme disposto no art. 149, § 2º, I, em texto introduzido pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001. Já o legislador infraconstitucional, afastou da incidência dessas contribuições as receitas decorrentes das operações de prestação de serviços para a pessoa residente ou domiciliada no exterior. Se a aplicação do disposto no art. 149 requer o enfrentamento dos mesmos desafios indicados acima, nos itens 5 e 6, por outro lado impõe-se o exame das normas infraconstitucionais à luz da limitação imposta pela EC nº 33/2001, de modo a assegurar que sua aplicação não resulte em desobediência à vedação imposta pelo texto vigente da Carta.
8. Fato é que o art. 14, III da MP 2.158-35/01 – que é anterior à EC nº 33/01 e se refere à incidência das contribuições sobre receitas sujeitas ao regime cumulativo – já isentava as receitas dos serviços prestados a pessoa “residente ou domiciliada no exterior” antes da inovação constitucional que passou a prever a imunidade das receitas de exportação.
9. Na mesma linha, a legislação aplicável ao regime não-cumulativo dessas contribuições previu a “não incidência” da Contribuição para o PIS/Pasep quando o tomador for “residente ou domiciliado no exterior”, conforme se apreende da leitura do art. 5º, II, da Lei nº 10.637/02, idêntico em conteúdo ao art. 6º, II, da Lei nº 10.833/03, este último aplicável à Cofins (ambos com redação dada pela Lei nº 10.865, de 2004):4 “Art. 5º. A contribuição para o PIS/Pasep não incidirá sobre as receitas decorrentes das operações de: (...) II – prestação de serviços para pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada no exterior, cujo pagamento represente ingresso de divisas; ...” (grifos nossos)
10. No caso da contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins, afora o desafio a superar na tarefa de delinear um conceito de exportação de serviços, há a necessidade de se buscar uma compreensão do texto legal que não reduza o alcance da imunidade outorgada pela CF. Todavia, considerando que o constituinte derivado optou por uma norma aberta, por um conceito jurídico indeterminado, vislumbra-se aqui a existência de uma certa margem para sua interpretação. É razoável então assumir, prima facie, que aquelas hipóteses contempladas pela legislação das contribuições, tanto na parte aplicável ao regime cumulativo (MP nº 2.158-35/01, art. 14, II) quanto na normativa referente ao regime não-cumulativo (Lei nº 10.637/02, art. 5º, II; e Lei nº 10.833/03, art. 6º, II), alcançariam satisfatoriamente os eventos pretendidos pelo constituinte derivado.
11. Contudo, mesmo que seguir essa linha interpretativa nos autorize a supor solucionada a questão da imunidade de PIS/Pasep e de Cofins, se atentarmos para a fragilidade dos argumentos oferecidos pelo judiciário para fundamentar importantes decisões recentes sobre outros temas tributários e para o fato de haver uma jurisprudência ainda incipiente sobre a matéria aqui evocada,5 levando em conta, além disso, os riscos inerentes a toda situação de indefinição ou incerteza jurídica,6 torna-se forçoso reconhecer que permanece na ordem do dia a necessidade de se preencher, o quanto antes, o vácuo conceitual de que ressente a expressão em apreço.
I - C
IRRF e o conceito de exportação de serviços
12. À legislação do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) também interessa o conceito de exportação de serviços, ainda que o tributo incida sobre o resultado da atividade econômica e não diretamente sobre as operações de exportação de serviços. Um exemplo da necessidade de se fixar esse conceito a favor da correta aplicação da legislação do IR é encontrado na normativa referente ao imposto retido na fonte (IRRF), que prevê a redução para zero (0%) de sua alíquota quando incidir sobre “juros e comissões relativos a créditos obtidos no exterior e destinados ao financiamento de exportações”.7
13. A redução da alíquota é, destarte, condicionada à confirmação de que as importâncias (juros e comissões) pagas, creditadas, empregadas, entregues ou remetidas por fonte no País a domiciliados no exterior “destinem-se, efetivamente, ao financiamento de exportações ...”.8 Se o valor financiado for aplicado em outra finalidade, ainda que destinado a princípio à viabilização da exportação de serviços, a alíquota do IRRF aplicável sobre os valores de juros e comissões será de 25%.9 Outra vez vemos demonstrada, portanto, a necessidade de se estabelecer um conceito de exportação de serviços, de sorte a viabilizar a correta aplicação da legislação tributária federal.
I - D
As esferas estadual e municipal: o ICMS, o ISSQN e o conceito de exportação de serviços
14. O Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) incide, entre outros, como o próprio nome indica, sobre a prestação de serviços de comunicação.
15. Novamente, se ressente da inexistência de um consenso sobre o que seria exportação de serviços. O constituinte originário utiliza, ao tratar a matéria no art. 155, o termo exportação (§ 2º, XII, alíneas e e f), enquanto que o texto da Emenda Constitucional nº 42, de 2003 (EC 42/ 03), ao alterar o caput, se referiu a “serviços prestados a destinatários no exterior” para também afastar sua incidência (§ 2º, X, a). Resume-se assim, no que é pertinente à discussão em tela, o contido no art. 155 da CF/88:
• o inciso II do caput outorga aos Estados e ao Distrito Federal a competência para instituir o imposto;
• o § 2º, X, afasta sua incidência das operações referentes a “serviços prestados a destinatários no exterior” (alínea a);
• o § 2º, XII, remete à lei complementar a competência para excluir sua incidência das exportações de “serviços e outros produtos além dos mencionados no inciso X, a” (alínea e) e para “prever casos de manutenção de crédito, relativamente à ... (omissis) ... exportação para o exterior, de serviços e de mercadorias” (alínea f).
16. Numa possível interpretação das disposições acima elencadas, pode-se entender que a incidência do ICMS estaria afastada, nos termos do inciso X do § 2º do art. 155, de todo serviço prestado a residente ou domiciliado no exterior10 sendo que, além disso, ao legislador complementar seria facultado afastá-la também de outras prestações em que o tomador do serviço fosse nacional, uma leitura plausível do significado da autorização contida no inciso XII do § 2º.11
17. Diferente de quanto se verifica na legislação das contribuições para a seguridade social, o conflito aparente das normas referentes ao ICMS ocorre no próprio texto da Carta e é condição incontornável resolvê-lo antes que se pretenda alcançar uma compreensão adequada de seus dispositivos.
18. É outra a perspectiva em relação ao Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), de competência dos municípios e do Distrito Federal (art. 156 da CF/88), cabendo à lei complementar “excluir da sua incidência exportação de serviços para o exterior”.12 A norma de exclusão foi materializada no art. 2º da Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003 (LC nº 116/03),13 que dispõe:
“Art. 2º O imposto não incide sobre:
I – as exportações de serviços para o exterior do País;
... (omissis) ...
Parágrafo único. Não se enquadram no disposto no inciso I os serviços desenvolvidos no Brasil, cujo resultado aqui se verifique, ainda que o pagamento seja feito por residente no exterior.”
19. Aqui, o legislador complementar repetiu a expressão exportação de serviços adotada no art. 156 da CF/88,14 afastando deste modo o aparente problema da ambiguidade terminológica observado na legislação das contribuições sociais, conforme apontamos acima nos itens 6 a 10.
20. Note-se que o disposto no parágrafo único do art. 2 da LC nº 116/03 não chega a instituir exceção ao preceituado do caput do art. 3º, o qual atribui, como regra geral, a condição de sujeito ativo do tributo ao município onde se situa o estabelecimento do prestador.
21. Por outro lado, o critério do resultado ali adotado guarda certa coerência com as hipóteses de deslocamento da competência municipal previstas nos incisos I a XXII do art. 3º, que naqueles casos conferem o direito de exigir o imposto ao município15 onde claramente se verificará o resultado da prestação.16 A validação de um conjunto de regras que permitam estabelecer o lugar onde se verifica o resultado pode constituir, ao lado dos elementos subjetivos da prestação17 e do local (ou locais) onde se desenvolvem os atos necessários à sua execução, um arcabouço teórico inicial bastante adequado para a construção do conceito de exportação de serviços que se pretende elaborar.
22. Porém, o conceito permanece em aberto na legislação do ISSQN, exceto quanto à delimitação posta pelo parágrafo único reproduzido acima, o qual determina que não corresponde a uma exportação de serviços aquela prestação realizada no Brasil cujo resultado se verifica dentro das fronteiras do País,
“ainda que o pagamento seja feito por residente no exterior.”
Fundamentos
II
UMA CRÍTICA À ADOÇÃO DOS 4 MODOS DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DO GATS COMO “4 MODOS DE EXPORTAÇÃO/IMPORTAÇÃO DE SERVIÇOS”
23. Para alguns, exportação de serviços seria qualquer operação de comércio de serviços que envolvesse, de um lado, um prestador residente ou domiciliado no Brasil e, de outro, um tomador de serviços residente ou domiciliado no exterior. Aparentemente, essa ideia de equivalência entre exportação e operação realizada entre um agente econômico local e outro estrangeiro decorre da confusão entre a figura do agente e a própria ação de prestar serviços.
24. Exportação é a ação de exportar, é o levar para fora, o operar entre fronteiras.
25. Basta um paralelo com a exportação de bens materiais para clarear imediatamente a distinção: note-se que mesmo quando exportador e destinatário do bem exportado, ambos, forem residentes no mesmo país, a ação de exportar um produto ou mercadoria se dará no momento em que o objeto a ser exportado superar uma fronteira do país de origem. Deste modo, a exportação acontece sempre independentemente do domicílio/residência daquele que exporta ou daquele para quem se exporta. Isso vale tanto para a exportação de um bem material quanto de um serviço.
26. Em parte, essa associação - que, como dissemos, deriva da confusão entre a figura do agente e a própria ação - decorre do fato de que o acordo do GATS18, ao definir, para fins de sua aplicação, o que seria “comércio de serviços” previu quatro diferentes modos de prestação de serviços sempre considerando a existência, em uma ponta, de um prestador residente ou domiciliado num Estado-Membro da OMC e, na outra ponta, de um tomador residente ou domiciliado noutro EstadoMembro.
27. O primeiro modo corresponde ao serviço prestado do “território de um Membro ao território de qualquer outro Membro” (GATS, Artigo I, 2., a), chamado de modo transfronteiriço, o qual não pressupõe sequer o deslocamento do prestador ou do tomador do serviço entre diferentes Estados-Membros da OMC, nem mesmo a presença do prestador no território do tomador por ocasião da prestação.19 Supostamente, neste modo, apenas o serviço transpõe fronteiras.
28. Já o segundo modo é aquele em que o tomador do serviço se desloca para fora do território de sua residência, onde irá “consumir” o serviço ou, como reza a letra do Acordo, o serviço é prestado no “território de um Membro aos consumidores de serviços de qualquer outro Membro” (GATS, Artigo I, 2., b), modo consumo no exterior). Neste modo, apenas o tomador do serviço transpõe fronteiras.
29. A prática do comércio de serviços no terceiro modo implica a realização das prestações “por intermédio da presença comercial, no território de qualquer outro membro” (GATS, Artigo I, 2., c), modo presença comercial).20 Neste modo, a peculiaridade é que o prestador do serviço transpõe fronteiras, por intermédio de um “braço” de sua empresa (a presença) que lhe permite atuar no outro território.
30. Por último, o quarto modo abrange as prestações feitas “por intermédio da presença de pessoas naturais de um Membro no território de qualquer outro membro” (GATS, Artigo I, 2., d), modo movimento de pessoas físicas).21 Neste modo, similar ao anterior, mais uma vez temos como particularidade que o prestador do serviço transpõe fronteiras, desta vez por intermédio de pessoas físicas (pessoas naturais), por este enviadas ao local da prestação, que lhe permitem atuar no outro território.
31. Convém ressaltar que o acordo do GATS em momento algum buscou conceituar exportação (e nem importação). Não o fez porque seu escopo não foi regular especificamente tais operações. Seu objetivo, desde os primórdios, foi a liberalização do comércio de serviços entre prestadores e tomadores de diferentes Estados-Membros da OMC. 22 Esta a razão pela qual os quatro modos de prestação pressupõem em geral um prestador e um tomador de serviços localizados em diferentes Estados-Membros. Também aí reside o motivo pelo qual seu Artigo XXVIII, que trata dos conceitos (“Definições”) relacionados aos termos empregados ao longo do texto do acordo, é silente quanto ao que se deveria considerar exportação para fins de interpretação do acordo.23
32. Por conseguinte, não seria de se supor que todos os modos de prestação tratariam necessariamente de operações de exportação/importação de serviços. Poder-se-ia ainda questionar se tais operações adviriam somente nas hipóteses compreendidas pelos quatro modos de prestação ou se caberia admitir uma exportação/importação de serviços entre residentes no mesmo território. Como lembramos acima, o comércio de serviços que o GATS busca regular é o comércio entre residentes ou domiciliados em diferentes Estados-Membros da OMC.