MÚLTIPLOS VÍNCULOS – CONSIDERAÇÕES TRABALHISTAS

Sumário

1. Introdução;
2. Caracterização do Vínculo Empregatício;
2.1. Cláusula de Exclusividade;
2.2 Compatibilidade da Jornada de Trabalho;
2.2.1 Empregado Menor;
2.3 Intervalo;
3. Prestação de Serviço a Grupo Econômico;
4. Férias;
5. Salário-Família;
6. Informação em Sefip;
7. Esocial;
9. Jurisprudência.

1. INTRODUÇÃO

A legislação trabalhista não impede que o empregado firme mais de um contrato de trabalho, com empregadores diferentes, já que a própria Constituição Federal, em seu artigo 5°, inciso XIII, concede a todo cidadão o direito ao livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão.

Ademais, considerando que o trabalho  é  necessário para manutenção e a subsistência do empregado e de  sua família, não há qualquer impedimento para que exerça múltiplos vínculos.

2. CARACTERIZAÇÃO DO VÍNCULO EMPREGATÍCIO

Para que seja reconhecido o vínculo empregatício, algumas características devem estar presentes, nos moldes dos artigos 2° e 3° da CLT, os quais trazem o conceito de empregador e empregado. Vejamos:

Artigo 2°:

“Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.

§ 1º - Equiparam-se ao empregador, para os efeitos exclusivos da relação de emprego, os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos, que admitirem trabalhadores como empregados.

§ 2o  Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, ou ainda quando, mesmo guardando cada uma sua autonomia, integrem grupo econômico, serão responsáveis solidariamente pelas obrigações decorrentes da relação de emprego.               (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017)  
     
§ 3o Não caracteriza grupo econômico a mera identidade de sócios, sendo necessárias, para a configuração do grupo, a demonstração do interesse integrado, a efetiva comunhão de interesses e a atuação conjunta das empresas dele integrantes”. 

Artigo 3°:

Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.

Parágrafo único - Não haverá distinções relativas à espécie de emprego e à condição de trabalhador, nem entre o trabalho intelectual, técnico e manual.

Deste modo, para que seja caracterizado o vínculo de emprego, serão observados os seguintes requisitos: pessoalidade, pessoa física, habitualidade, onerosidade, subordinação e alteridade.

2.1. Cláusula de Exclusividade

Há possibilidade do empregador incluir no contrato de trabalho uma cláusula de exclusividade, também conhecida como “cláusula de não concorrência”, através da qual  será determinado um prazo, em que o empregado não poderá prestar serviços a empresas concorrentes.

2.2 Compatibilidade da Jornada de Trabalho

Embora seja possível o empregado manter mais de um vínculo empregatício, deve atentar-se que as jornadas de trabalho precisam ser compatíveis, ou seja, não podem coincidir, sob pena de ser considerada fraude.

Deste modo, em cada um dos vínculos deve ser observada  a  jornada até o limite de de 8 horas diárias e 44 horas semanais, nos termos do artigo 58 da CLT e artigo 7º, inciso XIII da Constituição Federal.

Vale destacar ainda que, caso seja necessária a realização de horas extras, nos moldes do artigo 59 da CLT, estas não podem exceder  a02 horas extras.

2.2.1 Empregado Menor

Não há impedimento para que o menor tenha mais de um vínculo empregatício, no entanto, no que se refere a jornada de trabalho, estas serão somadas, nos termos do  artigo 414 da CLT.

Assim, a jornada de trabalho final, considerando todos os vínculos empregatícios não poderá ultrapassar a 08 horas diárias, nos moldes do artigo 411 da CLT.

2.3 Intervalo

Sabe-se que, nos termos do artigo 66 da CLT, o  intervalo entre uma jornada e outra será de no mínimo 11 horas consecutivas.

Contudo, cumpre destacar que, esse intervalo deve ser observado em cada vínculo isoladamente, ou seja, não há obrigatoriedade deste intervalo de uma empresa para outra.

Outro ponto a ser observado se dá em relação a concorrência, o que significa que o empregado não pode prestar serviço a mais de um empregador que atue no mesmo ramo de atividade da empresa para o qual já trabalha, sob pena de ser considerada justa causa, nos termos do artigo 482, alínea c da CLT.

Assim, sendo empresas do mesmo ramo, não será possível que o empregado tenha mais de um vínculo, pois caracterizará ato de concorrência, podendo levar a  rescisão por justa causa do contrato de trabalho do empregado.

3. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO A GRUPO ECONÔMICO

Considera-se grupo econômico, quando uma ou mais empresas, que embora possuam personalidade jurídica própria, estejam sob a mesma a direção, controle ou administração, uma em relação a outra, nos termos do artigo 2º, §§ 2º e 3º, da CLT.

No caso do empregado prestar serviço a mais de uma empresa do mesmo grupo, não será considerado múltiplos vínculos, pois o real empregador é o próprio grupo econômico, de modo que será considerado um único contrato de trabalho, de acordo com a Súmula nº 129 do TST.

4. FÉRIAS

Quando o empregado tiver mais de um vínculo, cada empregador, deve observar o prazo para a concessão das férias, que de acordo com artigo  134 da CLT,  as férias devem ser concedidas ao empregado, nos 12 meses seguintes a aquisição do direito.

Deste modo, observando o período concessivo, cada  empresa poderá conceder as férias ao empregado, não sendo necessário que  as férias de ambos os vínculos coincidam, de acordo com artigo 136 da CLT.

Outro ponto a ser destacado é que, embora o empregado não possa  prestar serviços a outro empregador, durante as férias, no caso de múltiplos vínculos,  isso pode ocorrer, já que decorre de uma obrigação assumida no contrato de trabalho, nos moldes do artigo 138 da CLT.

5. SALÁRIO-FAMÍLIA

No tocante ao salário família, será observado o salário percebido em cada vínculo de emprego exercido pelo empregado.

Assim, fará jus ao benefício, aquele empregado cuja remuneração não  exceder a R$ 1.425,56, conforme dispõe o artigo 4º da Portaria SPREV/ME nº 3.659/2020.

Vale dizer que, considera-se remuneração mensal do segurado o valor total do respectivo salário de contribuição, ainda que seja decorrente da soma dos salários de contribuição correspondentes a atividades simultâneas.

Portanto, para ter direito ao recebimento do salário família de R$ 48,62 em 2020, em todos os vínculos empregatícios exercidos pelo empregado, não poderá ter remuneração superior a R$ 1.425,56.

6. INFORMAÇÃO EM SEFIP

Havendo múltiplos vínculos, tal informação deve ser enviada à  SEFIP no campo “Ocorrência”, no qual se fazem duas informações distintas:

A exposição ou não do trabalhador, de modo permanente a agentes nocivos prejudiciais à sua saúde ou à sua integridade física, e que enseje a concessão de aposentadoria especial;

Se o trabalhador tem um ou mais vínculos empregatícios (ou fontes pagadoras), ou ainda, se o trabalhador consta de mais de uma GFIP/SEFIP do mesmo empregador/contribuinte, geradas em movimentos diferentes, com a remuneração desmembrada em cada uma delas (GFIP/SEFIP de chaves diferentes).

Para os empregados com um único vínculo (ou uma única fonte pagadora), serão lançados os seguintes códigos:

(em branco) - Sem exposição a agente nocivo. Trabalhador nunca esteve exposto.

01 - Não exposição a agente nocivo. Trabalhador já esteve exposto.

02 - Exposição a agente nocivo (aposentadoria especial aos 15 anos de trabalho);

03 - Exposição a agente nocivo (aposentadoria especial aos 20 anos de trabalho);

04 - Exposição a agente nocivo (aposentadoria especial aos 25 anos de trabalho).Para os trabalhadores com mais de um vínculo empregatício (ou mais de uma fonte pagadora), informar os códigos a seguir:

Para os trabalhadores com mais de um vínculo empregatício (ou mais de uma fonte pagadora), informar os códigos a seguir:

05 - Não exposto a agente nocivo;

06 - Exposição a agente nocivo (aposentadoria especial aos 15 anos de trabalho);

07 - Exposição a agente nocivo (aposentadoria especial aos 20 anos de trabalho);

08 - Exposição a agente nocivo (aposentadoria especial aos 25 anos de trabalho).

Assim, se para o mesmo empregado houver mais de uma fonte pagadora, mas este não estiver exposto a agentes nocivos, será informado o código  05. Ressalte-se que  essa ocorrência só deve ser informada no caso de múltiplos vínculos ou fontes pagadoras vinculadas ao Regime Geral da Previdência Social (RGPS).

No caso de mais de uma declaração pelo mesmo empregador para o mesmo empregado com a remuneração fracionada em cada guia gerada, serão informados os códigos de ocorrência com indicativo de múltiplos vínculos empregatícios ou fontes pagadoras, como por exemplo duas SEFIP's com códigos 150 e 155, ou SEFIP's de estabelecimentos diferentes (chaves distintas).

Deste modo, não haverá o cálculo da contribuição do segurado de forma automática, de modo que a informação será preenchida pela no campo “Valor Descontado do Segurado”.

7. ESOCIAL

Ocorrendo a multiplicidade de vínculos, faz-se necessária tal informação ao eSocial,a fim de que seja apurado corretamente a contribuição previdenciária descontada do trabalhador.

Neste sentido, conforme orientação do  Manual de Orientações versão 2.5.01 (página 104), havendo mais de um vínculo cuja contribuição se dê  pelo Regime Geral da Previdência Social, na mesma competência, deve ser informado o CNPJ/CPF dos outros contratantes e as correspondentes remunerações.

Haverá informação do indicador de desconto {indMV} da contribuição previdenciária do trabalhador, conforme tabela abaixo:

indMV

Definição

1

O declarante aplica a alíquota de desconto do segurado sobre a remuneração por ele informada (o percentual da alíquota será obtido considerando a remuneração total do trabalhador)

2

O declarante aplica a alíquota de desconto do segurado sobre a diferença entre o limite máximo do salário de contribuição e a remuneração de outra(s) empresa(s) para as quais o trabalhador informou que houve o desconto

3

O declarante não realiza desconto do segurado, uma vez que houve desconto sobre o limite máximo de salário de contribuição em outra(s) empresa(s).

Vejamos esclarecimento trazido pelo no  portal do eSocial:

07.21 - (21/02/2020) Como informar e calcular a remuneração e o desconto do segurado no caso do trabalhador que presta serviços simultaneamente em mais de um empregador (múltiplos vínculos)? 
A Emenda Constitucional nº 103/2019 alterou a sistemática de cálculo do desconto do segurado, passando a aplicar, a partir de março/2020, a tabela progressiva. Para a correta apuração do desconto do segurado, nos casos de múltiplos vínculos, é necessário conhecer a remuneração do trabalhador em todos os seus empregadores e a ordem em que cada um deles apurou o respectivo desconto utilizando a tabela progressiva. 

9. JURISPRUDÊNCIA


1. RECURSO ORDINÁRIO. RITO SUMARÍSSIMO. AÇÃO AJUIZADA POSTERIORMENTE À VIGÊNCIA DA LEI 13.467/2017. RADIALISTA. DUPLO VÍNCULO. NÃO CONFIGURAÇÃO DE SITUAÇÃO ENSEJADORA. LEI 6.615/78. NEGOCIAÇÃO COLETIVA. COMPROVAÇÃO DE PAGAMENTO DE PLUS SALARIAL. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA PELOS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. Sentença que se mantém, no particular, pelos próprios fundamentos, com arrimo no artigo 895, § 1º, inciso IV, da CLT.

(TRT-20 00003301120195200014, Relator: JOSENILDO DOS SANTOS CARVALHO, Data de Publicação: 19/03/2020)

2. RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMANTE. MÉDICA. CONTRATAÇÃO POR INTERMÉDIO DE PESSOA JURÍDICA. TRABALHO AUTÔNOMO E SEM PESSOALIDADE. AUSÊNCIA DE VÍNCULO EMPREGATÍCIO.

Para que se configure o vínculo de emprego é necessária a presença concomitante de todos os requisitos legais preconizados nos arts. 2º e 3º, da CLT, quais sejam: a prestação de serviços de forma não eventual, por pessoa natural (pessoalidade), sob a dependência de um empregador (subordinação), mediante pagamento de salário (onerosidade). Não demonstrados os pressupostos caracterizadores da relação empregatícia, notadamente por verificar-se a prestação de serviços de forma autônoma e sem pessoalidade, por intermédio de regular sociedade empresária constituída para tal fim, não há falar em formação de contrato de trabalho entre a sócia da empresa e às entidades tomadoras.

(TRT-17 - RO: 00012021120175170004, Relator: CLAUDIA CARDOSO DE SOUZA, Data de Julgamento: 13/06/2019, Data de Publicação: 26/06/2019)