LEI DE RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS
Aspectos Penais

Sumário

1. INTRODUÇÃO

A Lei nº 11.101/2005 dedica um capítulo especial aos chamados crimes falimentares, estabelecendo um conjunto de efeitos a que estarão submetidos os que forem condenados: inabilitação para o exercício de atividade empresarial; incapacidade para o exercício de cargo ou função em conselho de administração, diretoria ou gerência das empresas sujeitas a essa lei; e impossibilidade de gerir a empresa por mandato ou gestão do negócio.

O texto dedica 10 (dez) artigos à classificação dos diversos tipos de crimes e suas penas, que incluem reclusão e multa.

Quanto à competência e jurisdição, determina o artigo 183 que compete ao juiz criminal da jurisdição onde tenha sido decretada a falência, concedida a recuperação judicial ou homologado o plano de recuperação extrajudicial, conhecer da ação penal pelos crimes previstos nesta Lei.

Nos itens a seguir analisaremos os crimes em espécie previstos pela Lei de Recuperação de Empresas.

2. FRAUDE AOS CREDORES

Considera-se fraude aos credores a prática, antes ou depois da sentença que decretar a falência, conceder a recuperação judicial ou homologar a recuperação extrajudicial, de ato fraudulento que resulte ou possa resultar prejuízo aos credores, com o fim de obter ou assegurar vantagem indevida para si ou para outrem.

A pena imposta pelo artigo 168 da Lei nº 11.101/2005 é de reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa, podendo haver aumento de 1/6 (um sexto) a 1/3 (um terço), nos seguintes casos:

a) elaboração de escrituração contábil ou balanço com dados inexatos;

b) omissão, na escrituração contábil ou no balanço, lançamento que deles deveria constar, ou alteração da escrituração ou balanço verdadeiros;

c) se o agente destrói, apaga ou corrompe dados contábeis ou negociais armazenados em computador ou sistema informatizado;

d) simulação da composição do capital social;

e) se o agente destrói, oculta ou inutiliza, total ou parcialmente, os documentos de escrituração contábil obrigatórios.

Ressaltamos que, em caso de existência de contabilidade paralela, ou seja, se o devedor mantiver ou movimentar recursos ou valores paralelamente à contabilidade exigida pela legislação, a pena será aumentada de 1/3 (um terço) até metade.

Nas mesmas penas acima mencionadas incidem os contadores, técnicos contábeis, auditores e outros profissionais que, de qualquer modo, concorrerem para as condutas criminosas descritas, na medida de sua culpabilidade.

Na hipótese de falência de microempresa ou de empresa de pequeno porte, e não se constatando prática habitual de condutas fraudulentas por parte do falido, poderá o juiz reduzir a pena de reclusão de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços) ou substituí-la pelas penas restritivas de direitos, pelas de perda de bens e valores ou pelas de prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas.

3. OMISSÃO DE DOCUMENTOS CONTÁBEIS OBRIGATÓRIOS

É punido com detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos, e multa, se o fato não constitui crime mais grave, a omissão de documentos contábeis obrigatórios, que estará configurada quando o agente deixar de elaborar, escriturar ou autenticar, antes ou depois da sentença que decretar a falência, conceder a recuperação judicial ou homologar o plano de recuperação extrajudicial, os documentos de escrituração contábil obrigatórios.

Com relação ao assunto, transcrevemos dois julgados, proferidos ainda com base na legislação anterior, mas que se mostram consoantes com a nova regulamentação.

Nota Jurisprudencial: "Comete o crime falimentar de inexistência de livros comerciais obrigatórios, o comerciante que não mantém escriturados os livros obrigatórios, sendo irrelevante a alegação de ser outra pessoa responsável pela contabilidade da firma, uma vez que esse fato não tem o condão de elidir a responsabilidade do acusado. Irrelevante, também, a indagação de a omissão ter ou não concorrido para a quebra, bastando que tenha coexistido com ela, uma vez que se trata de delito de mera conduta. Por derradeiro, não importa que seja a empresa de pequeno porte econômico, se dessa irregularidade advém a impossibilidade de se saber a extensão do dano causado a terceiros" (TJSP, RT, 659/253).

4. VIOLAÇÃO DE SIGILO EMPRESARIAL E DIVULGAÇÃO DE INFORMAÇÕES FALSAS

É considerado crime a conduta do agente que viola, explora ou divulga, sem justa causa, sigilo empresarial ou dados confidenciais sobre operações ou serviços, contribuindo para a condução do devedor a estado de inviabilidade econômica ou financeira. A pena imposta para estes casos é de reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.

A divulgação ou propalação, por qualquer meio, informação falsa sobre devedor em recuperação judicial, com o fim de levá-lo à falência ou à obtenção de vantagem também é considerado crime, punido com reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.

5. INDUÇÃO A ERRO

Considera-se crime a indução a erro que se consubstancia quando o agente sonega ou omite informações ou presta informações falsas no processo de falência, de recuperação judicial ou de recuperação extrajudicial, com o fim de induzir a erro o juiz, o Ministério Público, os credores, a assembléia geral de credores, o Comitê ou o administrador judicial.

A pena imposta pelo artigo 171 da Lei nº 11.101/2005 é de reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.

6. FAVORECIMENTO DE CREDORES

Outra conduta criminosa prevista pelo legislador é do favorecimento de credores caracterizada pela prática, antes ou depois da sentença de decretação da falência, concessão da recuperação judicial ou homologação do plano de recuperação extrajudicial, ato de disposição ou oneração patrimonial ou gerador de obrigação, destinado a favorecer um ou mais credores em prejuízo dos demais. A pena para tal crime é de reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.

O credor que agir, em conluio, para beneficiar-se de ato de favorecimento, incorrerá nas mesmas penas acima mencionadas.

7. VIOLAÇÃO DE IMPEDIMENTO

A redação do artigo 177 da Lei nº 11.101/2005 é praticamente idêntica à do artigo 190 do Decreto-lei nº 7.661/1945, no que se refere à descrição da conduta, porém a pena de detenção anteriormente prevista foi substituída pela de reclusão.

Assim, ao adquirir o juiz, o representante do Ministério Público, o administrador judicial, o gestor judicial, o perito, o avaliador, o escrivão, o oficial de justiça ou o leiloeiro, por si ou por interposta pessoa, bens de massa falida ou de devedor em recuperação judicial, ou, em relação a estes, entrar em alguma especulação de lucro, quando tenham atuado nos respectivos processos, incorrerão em violação de impedimento, punida com reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.

8. HABILITAÇÃO ILEGAL DE CRÉDITO E EXERCÍCIO ILEGAL DE ATIVIDADE

Os artigos 175 e 176 da Lei nº 11.101/2005 assim configuram e punem tais condutas:

"Art. 175 - Apresentar, em falência, recuperação judicial ou recuperação extrajudicial, relação de créditos, habilitação de créditos ou reclamação falsas, ou juntar a elas título falso ou simulado:

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.

Art. 176 - Exercer atividade para a qual foi inabilitado ou incapacitado por decisão judicial, nos termos desta Lei:

Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa."

9. DESVIO, OCULTAÇÃO, RECEBIMENTO E USO ILEGAL DE BENS

É considerado crime apropriar-se, desviar ou ocultar bens pertencentes ao devedor sob recuperação judicial ou à massa falida, inclusive por meio da aquisição por interposta pessoa. A pena é de reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.

Também é tido como conduta criminosa, punida da mesma forma, adquirir, receber, usar, ilicitamente, bem que sabe pertencer à massa falida ou influir para que terceiro, de boa-fé, o adquira, receba ou use.

Com relação à alienação fraudulenta de bens, colacionamos a jurisprudência a seguir:

Nota Jurisprudencial: "Crime Falimentar - Alienação fraudulenta de bens - Elemento do tipo - A lei visa incriminar o ato que altere, em proveito do devedor ou de outrem, a entrada para a massa de bens a ela destinados, subtraindo-os à execução concursal. Não é todo o ato de alienação, entretanto, que configura fraude, pelo que só aqueles praticados com a intenção de prejudicar os credores enquadram-se no tipo penal". (TJSP, RT, 701/302).

10. EFEITOS DA CONDENAÇÃO E PRESCRIÇÃO PENAL

São efeitos da condenação por crimes previstos na Lei nº 11.101/2005:

a) a inabilitação para o exercício de atividade empresarial;

b) o impedimento para o exercício de cargo ou função em conselho de administração, diretoria ou gerência das sociedades sujeitas a esta Lei;

c) a impossibilidade de gerir empresa por mandato ou por gestão de negócio.

Os efeitos da condenação não são automáticos, devendo ser motivadamente declarados na sentença, e perdurarão até 5 (cinco) anos após a extinção da punibilidade, podendo, contudo, cessar antes pela reabilitação penal.

Com o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, será notificado o Registro Público de Empresas para que tome as medidas necessárias para impedir novo registro em nome dos inabilitados.

A prescrição dos crimes mencionados nos itens anteriores reger-se-á pelas disposições do Código Penal, começando a correr do dia da decretação da falência, da concessão da recuperação judicial ou da homologação do plano de recuperação extrajudicial.

Por fim, salientamos que a decretação da falência do devedor interrompe a prescrição cuja contagem tenha iniciado com a concessão da recuperação judicial ou com a homologação do plano de recuperação extrajudicial.

Fundamentos Legais: Lei nº 11.101/2005.