NOTA FISCAL
RECURSO Nº 067/92 - ACÓRDÃO Nº 220/92
RECORRENTE: (...)
RECORRIDA: FAZENDA ESTADUAL (Proc. nº 23742-14.00/91)
PROCEDÊNCIA: NOVO HAMBURGO - RS
EMENTA: IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS (ICM).
Impugnação a Auto de Lançamento.
Inexiste contraditório relativo ao mérito do lançamento, também pudera, diante das provas incontestáveis acostadas de flagrante ilícito fiscal, utilizando de "Notas Fiscais Calçadas" (redução do imposto devido, que consiste em apor valores diferentes nas diversas vias do documento).
Embora formalmente, o recorrente, não conste mais como sócio da empresa, os fatos demonstram sua vinculação com as atividades do sujeito passivo, representando-o perante terceiros, continua gerindo os negócios e tem poderes suficientes de obrigá-lo perante a Fazenda Estadual.
O sucessor ao adquirir o fundo de comércio recolhe para si o ônus tributário existente até aquela data (CTN, art. 133), irrelevante alegar que à época das irregularidades não pertencia ao quadro societário.
Negado provimento ao recurso voluntário, por unanimidade de votos.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de recurso voluntário, em que é recorrente (...), de Novo Hamburgo (RS) e recorrida a FAZENDA ESTADUAL.
Foi constituído o crédito tributário, através do Auto de Lançamento nº 3988800130, lavrado contra (...), cuja notificação fora feita na pessoa do recorrente, (...). A causa deste lançamento, delineada na peça fiscal, indica o uso dos documentos fiscais do estabelecimento em desacordo às normas vigentes, e fazendo constar valores diversos em suas diversas vias (Notas Calçadas), resultando em redução dolosa do imposto a recolher.
Com observância dos prazos, o requerente ofereceu impugnação ao lançamento, não contestando porém os valores que figuram no mesmo, nem justificando procedimento irregular. Procura, isso sim, eximir-se da responsabilidade alegando defeito formal na notificação, pois, tomara ciência em nome da empresa (...), quando já não era mais formalmente sócio da mesma, tendo em vista sua retirada, conforme detalha a alteração contratual, de 01 de julho de 1987, que fora registrada tão só em 09.02.88. Ainda, alega não possuir vínculo com a empresa à época em que teriam ocorridos os ilícitos fiscais, excluindo sua responsabilidade por atos anteriores. Afirma outrossim, que não se encontra na posse dos documentos, por decorrência do acima exposto.
A réplica fiscal relaciona vários fatos, entre os quais a existência de alteração do quadro social, quando foram admitidos na sociedade o requerente e sua esposa, assumindo na ocasião todo o ativo e passivo da empresa, abarcando assim atos advindos desde a criação da mesma. Quando da apresentação de nova alteração, sinalizando pela saída dos sócios anteriores, o fisco procedeu diligência no sentido de apurar os fatos, no entanto, não mais localizou a empresa, como nenhum dos sócios novos, pois os endereços particulares foram forjados, chegando ao ponto de incluir endereço residencial, cuja numeração inexiste no local. Além de descrever o uso deliberado de documentação de identidade, da esposa do requerente, segundo seu interesse, com nominação diferente. Relacionou vários fatos semelhantes ao presente, onde invariavelmente, o subscritor da inicial e sua esposa atuam no cenário. Ressalta ser inverídica a afirmação do Senhor (...) (fl. 2, item 2), da inicial, pois a documentação não fora entregue aos possíveis novos sócios, tendo em vista, que o mesmo a continuou utilizando para efetuar vendas.
O parecer técnico tem como pacífico o entendimento acerca das infrações cometidas pelo sujeito passivo. As provas do ilícito acompanham os autos e são irrefutáveis, nem foram negados na impugnação.
Aduz, que a defesa se restringe à ineficácia da notificação do presente Auto de Lançamento, na pessoa do Senhor (...), e a impossibilidade de apurar responsabilidades do mesmo de fatos ocorridos anteriormente ao seu ingresso na empresa. Diz que, esta responsabilidade pessoal não merece ser discutida aqui pois o lançamento dirigiu-se contra a pessoa jurídica (...). Informa ser conclusivo, que o Senhor (...), jamais deixou de ser sócio da empresa, quando analisados conjuntamento os documentos juntados, e de maneira mais contundente, as declarações de vendedores (embora autônomos) da empresa, que após receberem a importância equivalente às vendas prestavam contas ao Senhor (...). Assim, o Senhor (...) continuou ligado à empresa, obrigando-a perante terceiros e ao fisco. Se continuou a gerir, também a representa, ainda mais no caso em tela, pelo fato de não terem sido encontrados os demais sócios. Aqui, embora haja contrato de alienação de cotas societárias registrado, a forma cede à realidade. Em face à realidade subjacente, é de se reconhecer os atos praticados pelo Senhor (...), como válidos e tendo o condão de obrigar a empresa, pois em matéria tributária a situação irregular não a elide (art. 126, CTN).
O julgador de 1º Grau, acolhendo as razões e conclusões do parecer, condenou o autuado na sua integralidade, segundo consta no Auto de Lançamento.
Foi cientificado da decisão, o Sr. (...), na pessoa de seu procurador, que não juntou aos autos sua credencial, contudo é questão superada, pela apresentação de recurso a tempo. Nele volta a sustentar razões da inicial, quais sejam, notificação nula, por recair em pessoas sem poderes de representação, e ainda, da impossibilidade de responsabilizar o recorrente, pois quando praticadas as infrações dos autos, este ainda não detinha participação societária. E invocou o cerceamento de defesa para com o sujeito passivo, por que não teria sido cientificado a contento. Se apega ao cumprimento de formalidades, desatendidas em face às alterações contratuais (embora estas não tenham sido alcançadas, nem comunicadas ao fisco). Afirma que o lançamento em nenhum momento fez constar o nome do requerente como agente praticante das irregularidades nele apontadas.
Finaliza solicitando a desconstituição do Auto de Lançamento, em face a invalidade da notificação procedida na pessoa de um "ex-sócio", mas, se admitida a sua validade, que seja o recorrente excluído de qualquer responsabilidade decorrente da autuação, dispondo-se a pagar o imposto decorrente dos atos, de que tratam as declarações de fls. 44 e 58 (se provado o seu vínculo).
O Defensor da Fazenda Pública, infere ser inegável que o recorrente respondia pelo sujeito passivo, conforme provado nos autos, pois, ele foi cientificado da intimação e do Auto de Lançamento, bem como, ele é que pediu prazo (30 dias) para localizar os "responsáveis". Quanto às Notas Fiscais (fls. 17 a 36) que atestam de forma inequívoca a sonegação não foi oferecido contraditório.
É o relatório.
VOTO
Ausente o contraditório relativo ao mérito na constituição do crédito tributário cinge-se a defesa a contornos formais tendentes a invalidar o lançamento em vista da possível incapacidade do recorrente para praticar atos em nome do sujeito passivo.
As irregularidades do ilícito fiscal, apontadas no lançamento, são flagrantes e contundentes, praticadas dolosamente e suficientemente comprovadas, não restando dúvidas quanto a liquidez do crédito constituído. Demonstrado está, o uso de "Notas Fiscais Calçadas", consignando valores diferentes nas diversas vias do documento, sendo que, na 1ª via (aquela que transfere crédito de ICM ao adquirente) está destacado o valor real da operação, ao passo que, na via cativa do talonário (usada para informar o imposto devido) aposto foi um valor simbólico, resultando em recolhimento a menor ao real devido.
A constituição do crédito tributário atendeu a todos os requisitos legais destacados para ocorrências idênticas às descritas na peça fiscal. A divergência, no entanto, centra-se no cumprimento de aspectos formais, em que o recorrente tomara ciência dos atos praticados pelo fisco, desde a intimação do sujeito passivo até a formalização do lançamento, e que na impugnação, trazendo elementos até então desconhecidos da Fazenda Estadual, informa não serem mais sócios da empresa, ele recorrente e sua esposa, por força de ato formal registrado na Junta Comercial do Rio Grande do Sul (cópia fotostática anexa) de alteração contratual. Afirmou, ainda, não ser responsável pelo imposto devido, tendo em vista que estes ilícitos foram praticados antes dele adentrar no quadro social da autuada.
Ardilosamente quer afastar sua responsabilidade dos atos praticados por seu antecessor, contudo, o artigo 133, do Código Tributário Nacional (CTN) estabeleceu responsabilidade ao sucessor, assumindo o mesmo o ônus tributário até aquela data existente, ademais, a cláusula de alteração contratual, quando do ingresso do recorrente na vida societária, explicitou o dever do mesmo em relação a vida pregressa do sujeito passivo.
É de somenos importância este aspecto, se considerarmos que a exigência foi dirigida à (...) e que o gestor dos negócios é o proprietário de fato, tendo questionado apenas a formalidade de representação.
Nos autos consta que o recorrente, embora formalmente tenha introduzido novos sócios no quadro participativo, estes não foram localizados, nem por agentes da Fazenda Pública, nem pelo recorrente (que pedira prazo para isso), pois, além de evadir-se do local onde costumeiramente comerciava, os endereços particulares foram forjados, inexistindo os endereços indicados na alteração. Observe-se que esta alteração não foi procedida junto ao órgão da Fazenda Estadual, razão porque apenas na réplica foi diligenciado acerca do assunto. Afirmou, o recorrente, que os documentos acompanharam os novos sócios, quando da última alteração. A empresa não possuindo mais endereço certo, os possíveis sócios se encontrando em lugar incerto e não sabido, continuava a operar regularmente. Qual não é a surpresa, ao analisar as provas de fls. 44 a 58, demonstrando que o Senhor (...) (ora recorrente), após toda a formalidade intrínseca continuava à testa dos negócios, utilizando os documentos, que supostamente deveriam estar com os sucessores.
Continuava, o recorrente, a gerir os negócios do sujeito passivo, representando-o, e obrigando-o perante terceiros e ao fisco. A realidade configura o recorrente como gestor dos negócios e se sobrepõe à formalidade, tendo como válidos os atos praticados pelo mesmo, quando realizados em nome do sujeito passivo.
A capacidade tributária passiva independe de estar a pessoa jurídica regularmente constituída, bastando que configure uma unidade econômica ou profissional (CTN, art. 126, III), pois não elide a empresa da responsabilidade por atos praticados pelo seu sócio de fato, sócio este, que por formalidades não tem cotas subscritas. O que equivale a dizer, que o recorrente de fato jamais deixou a sociedade.
Questões intrigantes entre o recorrente e o agente fiscal não aumentam, nem diminuem o valor das provas acostadas. Ficou suficientemente provado que o sujeito passivo, na pessoa do recorrente operava no ramo comercial, sendo estes atos válidos perante terceiros, assim também são acolhidos perante o Tesouro do Estado. Na conclusão do recurso, admite pagar o imposto devido relativo às operações assinaladas às fls. 44 a 58 (desde que provada a sua vinculação com os fatos), querendo eximir-se de qualquer outra responsabilidade.
O interesse na defesa do sujeito passivo, demonstrado pelo recorrente está bem vivo nos itens 7 e 9 (fl. 02 e 03 do recurso), vai além do interesse do ex-sócio.
Não se busca estipular um grau de responsabilidade do recorrente para com o crédito tributário constituído, o que se processa de acordo com o estatuído no CTN, mas sim de inferir a validade dos atos praticados pelo mesmo em nome do sujeito passivo, em face aos elementos disponíveis. No que decidiu por unanimidade esta Segunda Câmara, em acolher como válidos os atos praticados no sentido de considerar cientificada do lançamento em questão a autuada, desnecessário qualquer outra medida com vistas a notificar os demais integrantes da empresa.
Assim, nego provimento ao recurso voluntário, e confirmo a decisão do juízo "a quo", pelos seus fundamentos.
Ante ao exposto, ACORDAM os membros da Segunda Câmara deste Tribunal Administrativo de Recursos Fiscais, em negar provimento ao recurso, por unanimidade de votos, confirmando a decisão recorrida.
Porto Alegre, 30 de abril de 1992.
Ruy Rodrigo Azambuja
Presidente
Plínio Orlando Schneider
Juiz Relator
Participaram, também, do julgamento os juízes Nielon Meirelles Escouto, Carlos Hugo C. Sanchotene e Pedro Paulo Pheula. Presente, ainda, o Defensor da Fazenda Pública, Gentil André Olsson.