PEDIDO DE DEPOIMENTO ANTECIPADO

 

Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito da ____Vara Criminal da Comarca de  ________________

 

Ref. : Inquérito Policial  Nº :___________

 
.........................., por seu(sua) representante com atribuição legal perante esta vara judiciária, com arrimo no art. 3º do Código de Processo Penal(1), e ainda, nas disposições dos arts. 846(2) usque 851 do Código de Processo Civil, vem à presença de Vossa Excelência propor a competente ação de

 

PRODUÇÃO ANTECIPADA DE PROVAS

consistindo, especialmente, na oitiva do(a) (Réu / Vítima / Testemunha) FULANO DE TAL, podendo ser encontrado na atualidade à (descrever o endereço) pelas razões de fato e de direito que adiante passa a expor.

 

DO FATO:

 

(Síntese do fato criminoso)

 

 ...No dia ___/___/___, às ___horas, na localidade de _____________, o acusado FULANO DE TAL, com a pretensão de cobrar uma dívida decorrente de uma transação comercial realizada no passado, no valor de R$_________, dirigiu-se até a residência de BELTRANO DE TAL, e lá estando, após breve conversa, surpreendeu a vítima sacando a arma de fogo que portava em sua cintura, um revólver marca Taurus, calibre 38, 05 tiros, e passou a desferir vários tiros em face da vítima, vindo a atingi-la nas regiões do tórax e da cabeça, ceifando-lhe a vida, conforme faz prova o Laudo de Exame Cadavérico juntado às fls.

 

(Preponderância do depoimento do(s) beneficiário(s) – fumus boni iuris)

 

O ato de execução do fato criminoso fora presenciado pelo(a) (Co-Réu / Vítima /Testemunha) CICRANO DE TAL, atualmente inserida no Programa de Proteção às Vitimas e Testemunhas de Violência do Estado do Espírito Santo – PROVITA/ES, por haver sofrido irresistível coação física e psicológica dos (familiares do acusado / acusado / de terceira pessoa desconhecida), conforme documento comprobatório em anexo.

 

( demonstração do periculum in mora)

 

Apesar do(s) beneficiário(s) do programa continuar(em) sofrendo privações e constrangimentos de ordem pessoal e familiar, haja vista a necessidade de obedecer(em) normas rígidas de segurança impostas pelo PROVITA/ES, até a presente data encontra(m)-se disposto(s) a colaborar(em) com a busca da verdade real dos fatos, objetivo maior do processo penal.  Contudo, em face da demora na conclusão da investigação policial que já perdura ____ dias, o Ministério Público Estadual teme pela impossibilidade do depoimento quando do procedimento ordinário na fase processual, uma vez que o prazo previsto em lei(3) para a permanência do(a)(s) beneficiário(a)(s) no programa de proteção expirará em ________ , o que por certo, findo, impossibilitará a localização do(a)(s) (Co-Réu/Vítima/Testemunha) CICRANO DE TAL, o(s) qual(is) se evadirá(ão) para local incerto e desconhecido visando a preservação da(s) incolumidade(s) física(s), bem como, de seus familiares.

Por certo, conforme depoimento prestado na esfera policial, referido(a) (Co-Réu/Vítima/Testemunha) é(são) pessoa(s) imprescindível(is) na elucidação e compreensão do fato criminoso e dos atos de sua execução, motivo pelo qual se justifica a antecipação da produção de prova.

 
DO DIREITO:

 

Conforme se nota pelo art. 8º da Lei 9.807/1999, “Quando entender necessário, poderá o conselho deliberativo solicitar ao Ministério Público que requeira ao juiz a concessão de medidas cautelares direta ou indiretamente relacionadas com a eficácia da proteção”.

 

Pois bem. Apesar da referida lei dispor que as citadas medidas serão provocadas pelo conselho deliberativo, é evidente que elas também poderão ser tomadas espontaneamente pelo Ministério Público.

 

Assim, torna-se possível a adoção de algumas medidas cautelares no curso da investigação ou processo criminal objetivando maior eficácia das providências tomadas em relação à proteção às testemunhas. Dentre as medidas possíveis destacamos a produção antecipada de provas, que visa antecipar cautelarmente o depoimento da testemunha em juízo, medida que não é estranha ao CPP, pois encontra previsão em seu art. 225(4), que trata do denominado depoimento ad perpetuam rei memoriam, inclusive quando ainda se encontre na fase de investigações, quando então se tratará também de uma forma de jurisdicionalizar a atividade probatória.(5)

 

Malgrado o art. 225 do CPP não cuide especificamente de antecipação de depoimento de testemunha que se encontra ameaçada, não vislumbramos qualquer problema de se aplicar ao dispositivo uma interpretação extensiva, eis que inegavelmente disse menos do que queria, sendo impossível restringir a medida cautelar tão-somente às hipóteses mencionadas, mormente quando o citado artigo possibilita a antecipação do depoimento quando “inspirar receio de que ao tempo da instrução criminal já não exista” a testemunha.

 

Com efeito, em casos extremos em que a testemunha corre risco de morte, em virtude de ameaças contra sua integridade física, além de envidar esforços para a proteção da testemunha, é interessante se valer da medida cautelar de depoimento antecipado de provas. Antecipa-se, assim, a sua inquirição, intimando-se as partes e realizando a audiência a qualquer tempo, ainda que tal medida importe em inversão da ordem da instrução estabelecida, eis que se trata de exceção utilizada no interesse público. Aliás, é importante observar que a referida medida também poderá ser tomada, por analogia, para antecipar o depoimento de vítimas e até mesmo de réus colaboradores que estejam em situação de risco.

Ademais, nunca é demais lembrar que o Código de Processo Penal, em seu art. 3º, permite a utilização de analogia. Assim, caso se entenda não ser possível a antecipação de depoimento de testemunhas ameaçadas com base no art. 225 do CPP, é forçoso entender que a providência será possível através de analogia das disposições do Código de Processo Civil, e nesta esteira lógica, abre-se caminho para o cabimento da presente medida cautelar de produção antecipada de provas, por meio da aplicação das regras previstas nos arts. 846 usque 851 do CPC, que trata da justificação(6), ante a falta de uma melhor regulamentação do procedimento no Código de Processo Penal.(7)

 

Assim, valendo-se – por analogia - das regras do Código de Processo Civil, proposta e aceita como produção antecipada de prova perante o juiz da causa principal, a qual caberá a análise de sua pertinência e validação como prova, deverão ser perquiridas as existências dos pressupostos especiais previstos no art. 847 do Código de Processo Civil(8), bem como os inerentes a todas as demais medidas cautelares, ou sejam, o fumus boni iuris e o periculum in mora, que poderão ser comprovados pela causa de pedir exposta na narrativa dos fatos, como se fez no presente caso.

 

Logo, em primeiro lugar o fumus boni iuris importará na demonstração da existência de indícios da autoria e prova da materialidade do crime, o que equivale a uma “fumaça do cometimento do crime”. Trata-se de requisito imprescindível a indicar que a medida pressupõe a prática de uma infração penal, sendo, portanto, pós-delitual e não pré-delitual.

 

Interessante lembrar que basta a existência de indícios da autoria e da materialidade, não se requerendo prova plena, já que a cognição não é plena e exauriente na análise das medidas cautelares. Assim, qualquer elemento indicador da autoria e da materialdiade do crime é suficiente para a satisfação do presente requisito, o que está plenamente demonstrado no caso em questão.

 

Em segundo lugar, o periculum in mora será comprovado por meio de demonstração no caso concreto de existência de risco de perda ou grave dificuldade na futura produção da prova, se ela não for desde logo colhida, o que se materializa por meio de ameaças sofridas, compráveis por qualquer meio idôneo (v.g., testemunho, documento, interceptação telefônica etc.), o que tamnbém está comprovado nos autos, conforme demonstrado anteriormente.

 

Finalmente, é de se salientar, que a melhor doutrina também admite a instrução cautelar, de caráter preventivo, em face de demandado desconhecido – in incertam personam - , desde que ao desconhecido seja dado curador especial, como aliás, dada a semelhança das hipóteses, aplicar-se-ia o art. 862, parágrafo único do Código de Processo Civil, uma vez que já como afirmado anteriormente, tal procedimento cautelar contém o objetivo de documentar algum fato quando presumível o seu desaparecimento ou presente a impossibilidade de prová-lo no futuro diante do decurso do tempo.(9)

 

DO PEDIDO:

 Ante ao exposto, requer a Vossa Excelência:

Na forma do art. 802 do CPC se digne citar o Sr. FULANO DE TAL (descrever o nome e local onde pode ser encontrado), para no prazo de 05 dias, contestar, querendo, o presente pedido; OU Na forma do art. 802 do CPC, se digne citar por edital o acusado FULANO DE TAL (caso seja desconhecido o paradeiro do demandado), nomeando-lhe curador especial na forma do art. 9º, II do CPC, caso não se manifeste após o prazo de lei OU Se digne nomear curador especial ao réu desconhecido, para querendo, contestar no prazo de 05 dias o presente pedido;

Se digne intimar o Sr. FULANO DE TAL para a audiência de antecipação da prova testemunhal, objetivando a oitiva do Sr. CICRANO DE TAL, que comparecerá ao referido ato processual independentemente de intimação, através do Programa de Proteção de Testemunhas – PROVITA/ES;

Por fim, requer a homologação por sentença da prova produzida sob o crivo do contraditório, para que produza seus jurídicos efeitos legais.

Nestes termos,

Pede deferimento.

Local e data.

 

Promotor(a) de Justiça

Notas:

1 - Art. 3º - A lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais de direito.

2- Art. 846 - A produção antecipada da prova pode consistir em interrogatório da parte, inquirição de testemunhas e exame pericial.

3 - Art. 11 - A proteção oferecida pelo programa terá a duração máxima de dois anos. (Lei Nº 9.807/99)

4 - “Art. 225. Se qualquer testemunha houver de ausentar-se, ou, por enfermidade ou por velhice, inspirar receio de que ao tempo da instrução criminal já não exista, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento de qualquer das partes, tomar-lhe antecipadamente o depoimento”.

5 - Anota Aury Lopes Jr. Que “O incidente de produção antecipada da prova é forma de jurisdicionalizar a atividade probatória no curso de inquérito, através da prática do ato ante uma autoridade jurisdicional e com plena observância do contraditório e do direito de defesa (...) Excepcionalmente, frente ao risco de perecimento e o grave prejuízo que significa a perda irreparável de algum dos elementos recolhidos no inquérito policial, o processo penal instrumentaliza uma forma de colher antecipadamente esta prova, através de um incidente: produção antecipada de prova” (Sistema de Investigação Preliminar no Processo Penal, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, p. 191-192).

6 - Nesse sentido, conforme observa Ovídio Batista da Silva, na asseguração cautelar de provas, o que se pretende é tão-somente documentar algum fato cujo desaparecimento seja provável, a fim de poder-se depois utilizá-lo como prova” (Do Processo Cautelar, Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1996, p.362).

7 - No mesmo sentido: LIMA, Marcellus Polastri. A Tutela Cautelar no Processo Penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 148.

8 - “Art. 847 - Far-se-á o interrogatório da parte ou a inquirição das testemunhas antes da propositura da ação, ou na pendência desta, mas antes da audiência de instrução: I - se tiver de ausentar-se; II - se, por motivo de idade ou de moléstia grave, houver justo receio de que ao tempo da prova já não exista, ou esteja impossibilitada de depor”.

9 - “...Cremos perfeitamente admissível, no Direito Brasileiro, não só a inquirição de testemunhas ad perpetuam memoriam, como a realização de exames periciais contra incertam personam, caso em que o juiz dará curador especial ao réu ignorado. Aliás, seria de aplicar o art. 862, parágrafo único, dada a semelhança de hipóteses.” (SILVA, Ovídio A Batista da Silva, ob. cit., p. 376).