Acórdão na Íntegra
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO N.º 85.877-5, DE PARANAGUÁ - 1ª VARA CRIMINAL


RECORRENTE : JACIMIEL SILVA MACHADO

RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ

RELATOR : DES. GIL TROTTA TELLES



PRONÚNCIA. DUPLO HOMICÍDIO. MOTORISTA QUE, EMBRIAGADO, DIRIGE EM ALTA VELOCIDADE, DENTRO DO PERÍMETRO URBANO. ATROPELAMENTO DE UM CICLISTA, QUE TRAZ À GARUPA SEU FILHO MENOR. POSSIBILIDADE DA OCORRêNCIA DE DOLO EVENTUAL, DADAS AS PARTICULARIDADES DA HIPóTESE. DESPROVIMENTO DO RECURSO.


VISTOS, relatados e discutidos estes autos de RECURSO EM SENTIDO ESTRITO N.º 85.877-5, de Paranaguá - 1ª Vara Criminal, em que é Recorrente JACIMIEL SILVA MACHADO e Recorrido o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ.
I
O Dr. Promotor de Justiça da Vara Criminal (única então existente) da Comarca de Paranaguá denunciou Jacimiel Silva Machado como incurso nas sanções do artigo 121 do Código Penal (por duas vezes) porque, em 20 de maio de 1995, por volta das 18h20 min, na Av. Antonio Pereira, entroncamento com a R. Sesinando Becker, na cidade que tem o mesmo nome da Comarca, o denunciado, ao volante de seu automóvel, que dirigia embriagado e em velocidade excessiva para o local, situado dentro do respectivo perímetro urbano, deu azo ao atropelamento de Celso de Souza e de Thiago da Silva, quando o primeiro conduzia uma bicicleta e, tendo o segundo à garupa desse veículo, transpunha a referida avenida, vindo ambos a sofrer ferimentos letais; sendo que o acusado, ao conduzir seu carro naquelas condições, assumiu o risco de matar, agindo, destarte, com dolo eventual (fls. 2/3).
Recebida a denúncia, o processo teve curso moroso, culminando com a pronúncia do réu a fim de submetido a Júri por homicídio, perpetrado em concurso formal, permitindo-se-lhe, no entanto, aguardar em liberdade ao julgamento em face de sua primariedade e bons antecedentes (fls. 138/141).
Inconformado, pessoalmente recorreu (fl. 151), e seu advogado, nas razões recursais, pleiteou a absolvição ou, alternativamente, a desclassificação, para homicídio culposo, do delito a ele atribuído (fls. 143/149).
Nas contra-razões recursais, a Drª Representante do Ministério Público local pugnou pela mantença da decisão recorrida (fls. 154/156), que efetivamente não foi alterada na fase de retratação (fl. 158).
A douta Procuradoria de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 170/175).
II
1. O conjunto probatório evidencia que o recorrente dirigia embriagado, em alta velocidade, dentro do perímetro urbano de Paranaguá; nesse sentido, o laudo de exame e levantamento de local (fls. 65/70), o aditamento a esse laudo (fls. 96/98), o laudo de exame de dosagem alcoólica (fl. 57) e os depoimentos judiciais de Marcelo Tramujas (fl. 115) e de Marcelo Freitas da Silva (fl. 105), notando-se que o próprio recorrente admitiu que dirigia a uma velocidade de noventa a cem quilômetros horários quando ocorreu o atropelamento (fl. 109 v.).
Nestas condições, não é despropositado cogitar de que o acusado tenha previsto o resultado, chegando até a aceitá-lo e agindo, assim, com dolo eventual; muito embora também não se possa excluir a possibilidade de que, malgrado havendo aquela previsão, insensatamente tenha o agente esperado que o referido resultado, (morte de pedestre ou pedestres que fossem transpor a via pública), não se fosse verificar. Aliás, Magalhães Noronha indica, como exemplo de hipótese de dolo eventual, precisamente aquela na qual ...o chofer que em desabalada corrida, para chegar a determinado ponto, aceita de antemão o resultado de atropelar uma pessoa (in DIREITO PENAL, 1° Vol., Edição Saraiva, São Paulo, 1968, p.133).
Certo que eventual imprudência do desafortunado ciclista não elidiria nem o dolo eventual nem a culpa consciente do réu, a dúvida quanto à questão impõe a submissão da causa ao Júri, nos termos do artigo 5º, inciso XXXVIII, alínea d, da Constituição Federal.
2. Todavia, como a forma de concurso de delitos concerne à individualização da pena, a ser imposta pelo Juiz em caso de condenação, o registro no ponto efetuado pela decisão recorrida não deve subsistir.
III
Ante o exposto, ACORDAM os Desembargadores da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Paraná, por unanimidade de votos, negar provimento ao recurso, cancelando, porém, de ofício, a determinação da pronúncia atinente à forma de concurso de crimes.
Participaram do julgamento os Excelentíssimos Senhores Desembargadores CARLOS HOFFMANN e TELMO CHEREM.
Curitiba, 6 de abril de 2.000.

GIL TROTTA TELLES Presidente e Relator

Não vale como certidão ou intimação.