PERIGO DE VIDA - IMPOSSIBILIDADE DE PRESUNÇÃO


TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO
SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL
PROCESSO Nº 699 260 998
APELAÇÃO

RELATOR: DES. ANTONIO CARLOS N. MANGABEIRA

PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO




EXTRATO DO PARECER

Perigo de vida significa probabilidade concreta da morte. Em qualquer instante, desde a produção das lesões até o exame, é conditio sine qua non que a vítima tenha concretamente experimentado risco de morte. Não basta a simples possibilidade teórica, abstrata, deduzida de conjecturas, até mesmo porque, como simples possibilidade, não só abrange o improvável, como também é o perigo de vida inerente a moléstia de região ou órgão nobre do corpo humano (RT 676/322 e JutacrimSP 37/42). Na acepção exigida pelo tipo qualificador, perigo de vida é situação que não se presume, que demanda investigação, comprovação e diagnóstico por perícia (RTJ 102/645; RT 515/370, 556/346, 579/432, 590/334 e 596/336). Reportando-se ao quadro patológico apresentado pela vítima, o laudo deve esclarecer os sintomas reveladores da probabilidade do êxito letal. Recomenda a Medicina Legal que o perigo seja atestado mediante sintomas objetivamente demonstráveis, concernentes à maneira por que se comportam as funções mais importantes da vida orgânica (RJTJSP 128/470).



DO RECURSO

Com fundamento na generalidade dos permissivos do inc. III, art. 593, do Código de Processo Penal, PRSS tempestivamente apela da sentença do Juiz-Presidente do Tribunal do Júri de...., argumentando que a qualificadora do perigo de vida, pela qual foi condenado, não restou comprovada. Pede, assim, a desclassificação do crime de lesões corporais graves para lesões corporais leves, com a conseqüente alteração da pena.


DO EXAME DA PRETENSÃO

O auto de exame de corpo de delito, juntado à fl. 23, na resposta ao quinto quesito (se resultou perigo de vida), consigna: "sim; ferimento em local de artérias e veias".

Como cediço, perigo de vida significa probabilidade concreta da morte. Em qualquer instante, desde a produção das lesões até o exame, é conditio sine qua non que a vítima tenha concretamente experimentado risco de morte.

Não basta a simples possibilidade teórica, abstrata, deduzida de conjecturas, até mesmo porque, como simples possibilidade, não só abrange o improvável, como também é o perigo de vida inerente a moléstia de região ou órgão nobre do corpo humano. Perigo de vida é situação que não se presume. Demanda investigação, comprovação e diagnóstico por perícia. O simples fato de a lesão localizar-se em área de artérias e veias não é o bastante. Conforme preconiza a Medicina Legal, o perigo deve ser atestado mediante sintomas objetivamente demonstráveis da probabilidade do êxito letal, concernentes à maneira por que se comportam as funções mais importantes da vida orgânica.

Por outro lado, os relatos recolhidos no processo não suprem a deficiência da perícia, na medida em que não revelam a ocorrência de perigo à vida da vítima como efeito da agressão praticada pelo apelante. Sofreu a vítima, pelo disparo, ferimentos no braço esquerdo e perna direita. Submeteu-se a procedimento cirúrgico, com anestesia local, para extração do único projétil, localizado no braço, permanecendo oito dias hospitalizada. Foi ofendida na sua integridade corporal, deve ter sentido dor e levado tempo para recu-perar-se. Não experimentou, porém, perigo de vida, ou, em última análise, não ficou este demonstrado nos autos.


DO PARECER

Diante do exposto, vênia da ilustre Dra. Promotora de Justiça que subscreve as contra-razões, o parecer é pelo provimento do recurso.



Porto Alegre, 19 de maio de 1999.

CARLOS OTAVIANO BRENNER DE MORAES,
Procurador de Justiça.