EMPRÉSTIMO COMPULSÓRIO
RECURSO ESPECIAL Nº 210.311 - PR (1999/0032642-3)
RELATOR : MINISTRO FRANCIULLI NETTO
RECORRENTE : FAZENDA NACIONAL
PROCURADOR: RICARDO PY GOMES DA SILVEIRA E OUTROS
RECORRIDO : NICOLAU SEMTCHUK
ADVOGADO : OMAR SIMÃO CHUEIRI E OUTROS
EMENTA
RECURSO ESPECIAL – ALÍNEA "C" –
EMPRÉSTIMO COMPULSÓRIO SOBRE A AQUISIÇÃO DE
COMBUSTÍVEL – REPETIÇÃO DE INDÉBITO – TAXA
SELIC – ILEGALIDADE – JUROS DE MORA DE 1% AO
MÊS A PARTIR DE JANEIRO DE 1996.
Determinando a lei, sem mais esta ou aquela, a
aplicação da Taxa SELIC em tributos, sem precisa
determinação de sua exteriorização quântica, escusado
obtemperar que mortalmente feridos se quedam os
princípios tributários da legalidade, da anterioridade e da
segurança jurídica.
Fixada a Taxa SELIC por ato unilateral da
Administração, além desses princípios, fica também
vergastado o princípio da indelegabilidade de competência
tributária. Se todo tributo deve ser definido por lei, não há
esquecer que sua quantificação monetária ou a mera
readaptação de seu valor, bem como os juros, devem ser,
também, previstos por lei.
"A utilização da taxa SELIC como índice de apuração
dos juros legais não é juridicamente segura, porque impede
o prévio conhecimento dos juros; não é operacional, porque
seu uso será inviável sempre que se calcularem somente
juros ou somente correção monetária; é incompatível com a
regra do art. 591 do novo Código Civil, que permite apenas
a capitalização anual dos juros, e pode ser incompatível
com o art. 192, § 3º, da Constituição Federal, se resultarem
juros reais superiores a 12% (doze por cento) ao ano"
(Enunciado 20, aprovado na Jornada de Direito Civil
promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho
da Justiça Federal).
Consoante já ficou assentado no julgamento, por
esta Segunda Turma, do AGA n. 404.938/GO, rel. o
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subscritor deste, julgado em 3.9.2002, a declaração de
inconstitucionalidade da lei instituidora de um tributo altera
a natureza jurídica dessa prestação pecuniária, que,
retirada do âmbito tributário, passa a ser de indébito para
com o Poder Público, e não de indébito tributário.
É inaplicável aos pedidos de
compensação/restituição de tributos declarados
inconstitucionais também o § 1º do artigo 167 do Código
Tributário Nacional e, da mesma forma, a Súmula n. 188
desta egrégia Corte, uma vez que o indébito em questão já
não mais possui índole tributária.
Se na repetição de indébito referente a
recolhimentos relativos a tributos válidos, os juros
moratórios são de 1% ao mês, seria completamente
desarrazoado aplicar àqueles fulminados pela
inconstitucionalidade, que é o pior vício capaz de macular
qualquer ato normativo no Estado de Direito, a taxa do
artigo 1.062 do Código Civil, sob pena de se premiar o
descumprimento da Constituição em matéria tributária com
uma taxa de juros menor.
Divergência jurisprudencial conhecida.
Recurso especial provido em parte.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as
acima indicadas, acordam os Ministros da SEGUNDA TURMA do
Superior Tribunal de Justiça, por maioria, conhecer do recurso e lhe dar
parcial provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Vencidas
as Sras. Ministras Laurita Vaz e Eliana Calmon. Os Srs. Ministros Paulo
Medina e Francisco Peçanha Martins votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 17 de outubro de 2002(Data do Julgamento).
MINISTRO FRANCIULLI NETTO, Relator
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RECURSO ESPECIAL Nº 210.311 - PR (1999/0032642-3)
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO FRANCIULLI NETTO(Relator):
Cuida-se de recurso especial interposto pela Fazenda
Nacional, com fundamento na alínea "c" do inciso III do artigo 105 da
Constituição da República, contra v. acórdão proferido pelo egrégio
Tribunal Federal da 4ª Região que entendeu ser devida a atualização
monetária pela Taxa SELIC a partir de 1º de janeiro de 1996, na
repetição dos créditos indevidamente recolhidos a título de empréstimo
compulsório sobre combustíveis.
Alega a recorrente, em síntese, que este Superior Tribunal
de Justiça entende não ser cabível a aplicação da Taxa SELIC em
repetição de indébito. Nesse sentido, aponta divergência jurisprudencial
com julgado desta colenda Corte (Recurso Especial n. 151.478/SP, Rel.
Min. José Delgado, in DJU de 27.04.1998).
É o relatório.
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RECURSO ESPECIAL Nº 210.311 - PR (1999/0032642-3)
EMENTA
RECURSO ESPECIAL – ALÍNEA "C" –
EMPRÉSTIMO COMPULSÓRIO SOBRE A AQUISIÇÃO DE
COMBUSTÍVEL – REPETIÇÃO DE INDÉBITO – TAXA
SELIC – ILEGALIDADE – JUROS DE MORA DE 1% AO
MÊS A PARTIR DE JANEIRO DE 1996.
Determinando a lei, sem mais esta ou aquela, a
aplicação da Taxa SELIC em tributos, sem precisa
determinação de sua exteriorização quântica, escusado
obtemperar que mortalmente feridos se quedam os
princípios tributários da legalidade, da anterioridade e da
segurança jurídica.
Fixada a Taxa SELIC por ato unilateral da
Administração, além desses princípios, fica também
vergastado o princípio da indelegabilidade de competência
tributária. Se todo tributo deve ser definido por lei, não há
esquecer que sua quantificação monetária ou a mera
readaptação de seu valor, bem como os juros, devem ser,
também, previstos por lei.
"A utilização da taxa SELIC como índice de apuração
dos juros legais não é juridicamente segura, porque impede
o prévio conhecimento dos juros; não é operacional, porque
seu uso será inviável sempre que se calcularem somente
juros ou somente correção monetária; é incompatível com a
regra do art. 591 do novo Código Civil, que permite apenas
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a capitalização anual dos juros, e pode ser incompatível
com o art. 192, § 3º, da Constituição Federal, se resultarem
juros reais superiores a 12% (doze por cento) ao ano"
(Enunciado 20, aprovado na Jornada de Direito Civil
promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho
da Justiça Federal).
Consoante já ficou assentado no julgamento, por
esta Segunda Turma, do AGA n. 404.938/GO, rel. o
subscritor deste, julgado em 3.9.2002, a declaração de
inconstitucionalidade da lei instituidora de um tributo altera
a natureza jurídica dessa prestação pecuniária, que,
retirada do âmbito tributário, passa a ser de indébito para
com o Poder Público, e não de indébito tributário.
É inaplicável aos pedidos de
compensação/restituição de tributos declarados
inconstitucionais também o § 1º do artigo 167 do Código
Tributário Nacional e, da mesma forma, a Súmula n. 188
desta egrégia Corte, uma vez que o indébito em questão já
não mais possui índole tributária.
Se na repetição de indébito referente a
recolhimentos relativos a tributos válidos, os juros
moratórios são de 1% ao mês, seria completamente
desarrazoado aplicar àqueles fulminados pela
inconstitucionalidade, que é o pior vício capaz de macular
qualquer ato normativo no Estado de Direito, a taxa do
artigo 1.062 do Código Civil, sob pena de se premiar o
descumprimento da Constituição em matéria tributária com
uma taxa de juros menor.
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Divergência jurisprudencial conhecida.
Recurso especial provido em parte.
VOTO
EXMO. SR. MINISTRO FRANCIULLI NETTO (Relator):
Insurge-se a Fazenda Nacional contra a aplicação da Taxa
SELIC na repetição de indébito tributário relativo ao empréstimo
compulsório sobre a aquisição de combustível, cuja inconstitucionalidade
fora reconhecida pela excelsa Corte.
Merece acolhida a divergência jurisprudencial suscitada.
Entende este signatário que a Taxa SELIC para fins
tributários é, a um tempo, inconstitucional e ilegal. Como não há
pronunciamento de mérito da Corte Especial deste egrégio Tribunal que,
em decisão relativamente recente, não conheceu da argüição de
inconstitucionalidade correspectiva (cf. Incidente de Inconstitucionalidade
no Resp n. 215.881/PR), permanecendo a mácula também na esfera
infraconstitucional, nada está a empecer seja essa indigitada Taxa
proscrita do sistema e substituída pelos juros previstos no Código
Tributário (artigo 161, § 1º, do CTN).
A utilização da Taxa SELIC como remuneração de títulos é
perfeitamente legal, pois toca ao BACEN e ao Tesouro Nacional ditar as
regras sobre os títulos públicos e sua remuneração. Nesse ponto, nada
há de ilegal ou inconstitucional. A balda exsurge quando se transplantou
a Taxa SELIC, sem lei, para o terreno tributário.
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Para que a Taxa SELIC pudesse ser albergada para fins
tributários, havia imperiosa necessidade de lei estabelecendo os critérios
para sua exteriorização, por ser notório e agora até vetusto o princípio de
que o contribuinte deve, de antemão, saber como será apurado o
quantum debeatur da obrigação tributária. É mera falácia a assertiva de
que a incidência da Taxa SELIC não é defesa em lei, por não implicar
majoração da base de cálculo do tributo ou da alíquota.
A Taxa SELIC ora tem a conotação de juros moratórios, ora
de remuneratórios, a par de neutralizar os efeitos da inflação,
constituindo-se em correção monetária por vias oblíquas. Tanto a
correção monetária como os juros, em matéria tributária, devem ser
estipulados em lei, sem olvidar que os juros remuneratórios visam a
remunerar o próprio capital ou o valor principal. A Taxa SELIC cria a
anômala figura de tributo rentável. Os títulos podem gerar renda; os
tributos, per se, não.
A doutrina e a jurisprudência já definiram e conceituaram
juros e correção monetária. A Taxa SELIC não é juro, pura e
simplesmente. Não é também genuinamente correção monetária.
Cuida-se de um instituto jurídico ainda não definido. Do ponto de vista
jurídico-tributário, essa taxa vem sendo aplicada como uma mescla de
juro moratório, remuneratório e compensatório, a par de procurar
neutralizar os efeitos da inflação monetária.
Ora, a inflexão de correção monetária, para obrigações
tributárias, sempre se deu ex-vi legis, como é de fácil demonstração, cujo
escopo é o de, única e exclusivamente, manter igual poder liberatório da
moeda; mera cláusula de readaptação para debelar os efeitos corrosivos
da inflação.
De outra parte, o artigo 161, § 1º do CTN, com força de lei
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complementar, diz que os juros serão de 1%, se a lei não dispuser em
contrário. A lei ordinária não criou a Taxa SELIC, mas tão-somente
estabeleceu seu uso, contrariando a lei complementar, pois, esta só
autorizou juros diversos de 1%, se lei estatuir em contrário.
Determinando a lei, sem mais esta ou aquela, a aplicação
da Taxa SELIC em tributos, sem precisa determinação de sua
exteriorização quântica, escusado obtemperar que mortalmente feridos
se quedam os princípios tributários da legalidade, da anterioridade e da
segurança jurídica.
Fixada a Taxa SELIC por ato unilateral da Administração,
além desses princípios, fica também vergastado o princípio da
indelegabilidade de competência tributária. Se todo tributo deve ser
definido por lei, não há esquecer que sua quantificação monetária ou a
mera readaptação de seu valor, bem como os juros, devem ser, também,
previstos por lei.
Nessa vereda, uma vez aplicada a Taxa SELIC, sem lei
específica a respeito, ficará vulnerado o princípio insculpido no artigo 9º,
inciso I, do Código Tributário Nacional, já que, repita-se mais uma vez,
não é possível exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça.
A correção monetária e os juros, fora das hipóteses de
negócio jurídico, sentença judicial e ato ilícito, além das indenizatórias,
uma e outros, só permitem aplicação, desde que haja lei nesse sentido.
Se assim é de modo geral, com muito maior razão deve ser no campo do
Direito Tributário, preso ao princípio da legalidade e da tipicidade.
O Código Tributário Nacional não veda a mera atualização
do tributo, desde que o critério atualizador esteja previsto em lei, o
mesmo ocorrendo com os juros de mora, que devem ater-se à taxa de 1%
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(um por cento) ao mês. A lei ordinária pode estabelecer juros iguais ou
inferiores a esse limite; nunca superiores a 1% ao mês.
É certo que o legislador tem plena liberdade de usar dos
critérios de conveniência e oportunidade na concepção dos valores
axiológicos, ontológicos e teleológicos da lei. Mas, a despeito da
discricionariedade existente nesse campo, não há como não acadrimar o
conteúdo substancial da lei ao sistema jurídico do País, maxime no
Estado Democrático de Direito.
Além dos fundamentos invocados neste voto, podem ser
colacionados inúmeros outros, os quais não convém, no presente
momento, repetir (veja-se, a esse respeito, o artigo "Da
Inconstitucionalidade da Taxa Selic para fins Tributários". In: "Revista
Tributária e de Finanças Públicas", São Paulo, Ed. RT, ano 8, n. 33,
julho-agosto 2000, p. 59/89; "Revista Dialética de Direito Tributário", São
Paulo, Dialética, n. 58, 2000, p. 7/30 e "Jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça", Brasília, Ed. Brasília Jurídica, ano 2, n. 14, 2000, p.
15/48).
É oportuno registrar, por último, o enunciado 20, aprovado
na Jornada de Direito Civil promovida pelo Centro de Estudos Judiciários
do Conselho da Justiça Federal, no período de 11 a 13 de setembro de
2002, sob a coordenação científica do Ministro Ruy Rosado, que, a
respeito do artigo 406 do novo Código Civil, assim dispõe:
"A utilização da taxa SELIC como índice de
apuração dos juros legais não é juridicamente segura,
porque impede o prévio conhecimento dos juros; não é
operacional, porque seu uso será inviável sempre que se
calcularem somente juros ou somente correção monetária;
é incompatível com a regra do art. 591 do novo Código Civil,
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que permite apenas a capitalização anual dos juros, e pode
ser incompatível com o art. 192, § 3º, da Constituição
Federal, se resultarem juros reais superiores a 12% (doze
por cento) ao ano".
Afastada a aplicação da Taxa SELIC, convém observar que
o mesmo se não dá em relação aos juros de mora na repetição de
indébito ou na compensação.
Ressalte-se, ainda, que, in casu, diante da presunção de
validade da determinação de recolhimento da exação, pagou a
contribuinte tributo instituído por normas inconstitucionais.
Nada mais razoável que se reconheça a mora do Estado,
pois que, na espécie, repita-se, o indébito sequer decorreu de mero erro
do contribuinte, mas sim, de pagamento determinado por norma
reconhecidamente inconstitucional e afastada do ordenamento jurídico
desde sua edição.
Ainda quanto ao tema dos juros de mora, este signatário,
em diversos julgados, já adotou o posicionamento de que somente têm
incidência a partir do trânsito em julgado da sentença, nos termos do
artigo 167, § 1º, do Código Tributário Nacional e da Súmula n. 168 do
Superior Tribunal de Justiça.
A ínclita Ministra Eliana Calmon, em voto proferido no Resp.
n. 383.437/DF, cujo julgamento ainda está em curso, contudo, adotou
posicionamento diverso, para determinar a incidência dos juros de mora
desde o recolhimento indevido, aos seguintes fundamentos:
"(...) No gênero repetição de indébito, pode-se
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necessitar de uma sentença condenatória que reconheça e
declare o pagamento 'a maior', ao tempo em que condene a
Fazenda a restituir o que sobejou do seu verdadeiro crédito.
Na espécie, tem-se, então, sentença condenatória de efeito
ex nunc, o que torna doutrinária e cientificamente perfeita a
regra do art. 167, § 1º do CTN.
Entretanto, há espécie de repetição na qual se
certificou adredemente a existência do plus, como por
exemplo nas hipóteses em que é um determinado tributo
reconhecido como inconstitucional.
Quando tal ocorre, não é necessária uma
condenação mas, sim, mero acertamento do quantum
devido.
Nestas hipóteses, o Fisco cuida para que se faça
a compensação e, como tal, a lei que defere e disciplina a
compensação, independentemente de sentença
condenatória, pode fugir do rigor formal do art. 167 do CTN,
eis que se trata de uma restituição específica"
Conquanto Sua Excelência a Ministra Eliana Calmon tenha,
com base nesse raciocínio, concluído pela aplicação da Taxa SELIC a
partir de janeiro de 1996, uma vez constatada sua ilegalidade, não se
pode deixar de reconhecer a incidência de juros de mora, em casos como
o dos autos, a partir do recolhimento indevido.
Ora, consoante já ficou assentado no julgamento, por esta
Segunda Turma, do AGA n. 404.938/GO, rel. o subscritor deste, julgado
em 3.9.2002, a declaração de inconstitucionalidade da lei instituidora de
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um tributo altera a natureza jurídica dessa prestação pecuniária, que,
retirada do âmbito tributário, passa a ser de indébito para com o Poder
Público, e não de indébito tributário. Com efeito, aquela lei declarada
inconstitucional desaparece do mundo jurídico, como se nunca tivesse
existido.
Tampouco se aplica o artigo 165 do CTN às hipóteses de
pagamentos efetuados com base em lei declarada inconstitucional. Com
efeito, o pedido de restituição se fundamenta na declaração de
inconstitucionalidade; e não na cobrança ou pagamento espontâneo de
tributo indevido ou maior que o devido em face da legislação tributária
aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador
efetivamente ocorrido (artigo 165, I, do CTN); nem no erro na edificação
do sujeito passivo, na determinação da alíquota aplicável, no cálculo do
montante do débito ou na elaboração ou conferência de qualquer
documento relativo ao pagamento (artigo 165, II, do CTN); nem por
reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão contraditória (artigo
165, III, do CTN).
Na linha desse raciocínio, pois, forçoso concluir que é
inaplicável aos pedidos de compensação/restituição de tributos
declarados inconstitucionais também o § 1º do artigo 167 do Código
Tributário Nacional e, da mesma forma, a Súmula n. 188 desta egrégia
Corte, uma vez que o indébito em questão já não mais possui índole
tributária.
É oportuno registrar que tais considerações não são óbice à
aplicação do percentual de 1% ao mês a título de juros compensatórios,
previsto no artigo 161, § 1º, do Código Tributário Nacional, em lugar
daquele fixado no Código Civil, que se poderia, à primeira vista, entender
como adequado.
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Conquanto seja certo que tributo julgado inconstitucional
não seja realmente tributo, a declaração de inconstitucionalidade pelo
Supremo Tribunal Federal não elide a presunção de constitucionalidade
da norma. Cabia ao contribuinte, assim, enquanto não existia
pronunciamento definitivo do Pretório Excelso, o dever de cumprir a
determinação nela contida.
Assim, "a lei, enquanto não declarada pelos tribunais
incompatível com a constituição, é lei – não se presume lei – é para todos
os efeitos. Submete ao seu império todas as relações jurídicas a que visa
a disciplinar. Sendo a lei obrigatória, por natureza e por definição, não
seria possível facilitar a quem quer que fôsse furtar-se a obedecer-lhes os
preceitos sob o pretexto de que a considera contrária à Carta Política. A
lei, enquanto não declarada inoperante, não se presume válida: ela é
válida, eficaz e obrigatória" (Lúcio Bittencourt in "O contrôle jurisdicional
da constitucionalidade das leis", Rio de Janeiro: Forense, 1968, p.
95/96).
Ora, se na repetição de indébito referente a recolhimentos
relativos a tributos válidos, os juros moratórios são de 1% ao mês, seria
completamente desarrazoado aplicar àqueles fulminados pela
inconstitucionalidade, que é o pior vício capaz de macular qualquer ato
normativo no Estado de Direito, a taxa do artigo 1.062 do Código Civil,
sob pena de se premiar o descumprimento da Constituição em matéria
tributária com uma taxa de juros menor.
Nunca é demais lembrar que a invocação do princípio da
razoabilidade não implica atribuir uma solução contrária à lei, mas
apenas permite, diante de determinadas situações fáticas, procurar a
solução mais lógica, a partir de uma argumentação jurídica aceitável,
exigível pela racionalidade, que seja, ao mesmo tempo, técnica e
moderada. Esse deve ser o empenho constante dos integrantes desta
Documento: 378843 - Inteiro Teor do Acórdão - Site Certificado- DJ: 31/03/2003 Página 13 de 17
Corte, aos quais compete a interpretação e uniformização do direito
federal infraconstitucional, atendendo às peculiaridades de cada caso,
sem privilegiar a voracidade arrecadatória do Fisco.
Deve ficar consignado, por fim, que, nada obstante os juros
moratórios devam incidir desde os recolhimentos indevidos, in casu, eles
somente foram fixados a partir de janeiro de 1996, por meio da aplicação
da indigitada Taxa SELIC. Na ausência de recurso da contribuinte, então,
este deverá ser o dies a quo para a sua incidência.
Diante do exposto, dou parcial provimento ao presente
recurso especial para afastar a aplicação da Taxa SELIC, substituindo-a
pela incidência de juros moratórios legais de 1% ao mês, contados a
partir de janeiro de 1996, e correção monetária.
É como voto.
Ministro FRANCIULLI NETTO, relator
Documento: 378843 - Inteiro Teor do Acórdão - Site Certificado- DJ: 31/03/2003 Página 14 de 17
RECURSO ESPECIAL Nº 210.311 - PR (1999/0032642-3)
VOTO-VENCIDO
EXMA. SRA. MINISTRA LAURITA VAZ: Sra. Ministra-Presidente, fico
vencida no que diz respeito à taxa SELIC, que deve ser aplicada a partir de 1º de janeiro de
1996, consoante o art. 39, § 4º da Lei 9.250/95 e recentes precedentes da Primeira Seção
desta Corte, in verbis:
"TAXA SELIC. PRECATÓRIO COMPLEMENTAR. ATUALIZAÇÃO.
COISA JULGADA.
A Seção, por maioria, entendeu que, no caso, se aplica a taxa Selic
ao precatório complementar sem ofensa à coisa julgada. Destarte, aplicável, à
hipótese, a lei de correção monetária vigente à época da atualização do
débito, inexistindo o bis in idem. Outrossim, vedada a cumulação com outro
índice de correção monetária ou de juros, descabendo a aplicação de juros na
forma do art. 167 do CTN. Precedentes citados: REsp 434.618-RS, DJ
9/8/2002, e REsp 308.506-RS, DJ 25/6/2001." (REsp 443.237/RS, rel. Min.
Eliana Calmon, 1ª Seção, julgado em 25/09/2002, conforme Informativo de
Jurisprudência do STJ n.º 148)
"Processo Civil. Tributário. Compensação. Embargos de Divergência
(arts. 496, VIII, e 546, I, CPC). Juros. Taxa SELIC. CTN, art. 161, § 1º.
1. "Juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês (art. 161, § 1º, do
CTN), com a incidência a partir do trânsito em julgado (art. 167, parágrafo
único, do CTN) até 31/12/94, com aplicação dos juros pela taxa SELIC só a
partir da instituição da Lei nº 9.250/95, ou seja, 01/01/1995" - EREsp
193.453- SC, Primeira Seção, Rel. Min. José Delgado.
2. Precedentes.
3. Embargos acolhidos. (EREsp 199059/SP, rel. Min. MILTON LUIZ
PEREIRA, 1ª Seção, DJ de 30/09/2002).
"TRIBUTÁRIO - CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA -
ADMINISTRADORES, AUTÔNOMOS E AVULSOS - COMPENSAÇÃO -
REPETIÇÃO DE INDÉBITO - JUROS DE MORA - APLICAÇÃO DA TAXA
SELIC - TERMO INICIAL - LEI Nº 9.250/95.
- Estabelece o parágrafo 4º do artigo 39 da Lei nº 9.250/95 que:"A
partir de 1º de janeiro de 1996, a compensação ou restituição será acrescida
de juros equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e
de Custódia – SELIC para títulos federais, acumulada mensalmente,
calculados a partir do pagamento indevido ou a maior até o mês anterior ao
da compensação ou restituição e de 1% relativamente ao mês em que estiver
sendo efetuada.
- A taxa SELIC representa a taxa de juros reais e a taxa de inflação
no período considerado e não pode ser aplicada, cumulativamente, com outros
índices de reajustamento.
Documento: 378843 - Inteiro Teor do Acórdão - Site Certificado- DJ: 31/03/2003 Página 15 de 17
- Na repetição do indébito, os juros SELIC são contados a partir da
data da entrada em vigor da lei que determinou a sua incidência do campo
tributário (art. 39, parágrafo 4º, da lei 9.250/95).Precedentes
jurisprudenciais.
- Recurso improvido." (REsp 392.283/RS, rel. Min. LUIZ FUX, 1ª
Turma, DJ de 29/04/2002).
É o voto.
MINISTRA LAURITA VAZ
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CERTIDÃO DE JULGAMENTO
SEGUNDA TURMA
Número Registro: 1999/0032642-3 RESP 210311 / PR
Números Origem: 401028325398 9804010283253
PAUTA: 17/10/2002 JULGADO: 17/10/2002
Relator
Exmo. Sr. Ministro FRANCIULLI NETTO
Presidenta da Sessão
Exma. Sra. Ministra ELIANA CALMON
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. JOSÉ EDUARDO DE SANTANA
Secretária
Bela. BÁRDIA TUPY VIEIRA FONSECA
AUTUAÇÃO
RECORRENTE : FAZENDA NACIONAL
PROCURADOR : RICARDO PY GOMES DA SILVEIRA E OUTROS
RECORRIDO : NICOLAU SEMTCHUK
ADVOGADO : OMAR SIMÃO CHUEIRI E OUTROS
ASSUNTO: Tributário - Empréstimo Compulsório - Combustível
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia SEGUNDA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe
na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
"A Turma, por maioria, conheceu do recurso e lhe deu parcial provimento, nos
termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Vencidas as Sras. Ministras Laurita Vaz e Eliana
Calmon."
Os Srs. Ministros Paulo Medina e Francisco Peçanha Martins votaram com o Sr.
Ministro Relator.
O referido é verdade. Dou fé.
Brasília, 17 de outubro de 2002
BÁRDIA TUPY VIEIRA FONSECA
Secretária
Documento: 378843 - Inteiro Teor do Acórdão - Site Certificado- DJ: 31/03/2003 Página 17 de 17
FONTE: SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA