FRAUDE À EXECUÇÃO
Aspectos gerais e pontos polêmicos

Autor: Equipe Informare Jurídico


Sumário:

1.Introdução
2. Conceito
3. Pressupostos
4. Diferenças entre Fraude à Execução e Fraude Contra Credores
5. O Momento da Configuração da Fraude à Execução
6. Conclusão


1. INTRODUÇÃO

O presente artigo versa sobre os aspectos gerais da fraude à execução e de suas hipóteses de cabimento, além de tratar das situações polêmicas que envolvem este instituto jurídico.

2. CONCEITO

A fraude à execução é caracterizada pela alienação, sem a reserva de bens em seu patrimônio, do ativo do devedor que se encontra na pendência de um processo judicial capaz de reduzi-lo à insolvência.
Está prevista no Código Civil, art. 158 e ss, pelo art. 593 do Código de Processo Civil e pelo art. 179 do Código Penal.

No que tange ao crime de fraude à execução Jadiel João Baptista de OLIVEIRA esclarece que:

[..] o crime de fraude à execução tipificado neste artigo materializa-se no ato de praticar, com a intenção de prejudicar a execução, qualquer das condutas nele previstas, tais sejam: alienar, desviar, destruir ou danificar bens, ou simular dívidas. É, portanto, prejudicar, obstaculizar, o regular processamento da execução, impedindo-lhe a efetividade.

Já em termos processuais, para a configuração da fraude à execução exige-se a alienação válida da coisa ou do direito litigioso, ou seja, o patrimônio do devedor responde pelas obrigações contraídas por ele.
Se depois disso ele aliena seus bens, o patrimônio que possuía ao tempo da obrigação, irá responder por ela. Assim, a alienação dos bens do devedor pode incidir em dois institutos jurídicos: a fraude contra credores e a fraude à execução.

3. PRESSUPOSTOS

O art. 593 do CPC se encarregou de enumerar as hipóteses nas quais a alienação ou oneração de bens serão consideradas em fraude de execução, são elas:

a) quando sobre eles pender ação fundada em direito real;
b) quando, ao tempo da alienação ou oneração, corria contra o devedor demanda capaz de reduzi-lo à insolvência;
c) nos demais casos expressos em lei.

Enquanto o primeiro caso trata da alienação de bem objeto de ação real, de bem litigioso, a segunda situação diz respeito à alienação de bens objetivando a insolvência e, conseqüentemente, o não- cumprimento da obrigação. Em outro enfoque, o terceiro caso aborda as demais situações previstas em lei, como, por exemplo, o do art. 672, § 3º, do CPC, que diz respeito à penhora de crédito, e o do art. 185 do Código Tributário Nacional, que dispõe sobre os atos de alienação ou oneração após a inscrição do crédito como dívida ativa em fase de execução.
A partir disso, verifica-se que, a alienação com a tentativa de frustrar direito alheio é o primeiro indício de fraude à execução. A partir disso, surge um novo pressuposto para a fraude à execução, a insolvência.

O próprio Código de Processo Civil tratou de defini-la em seu art. 748 da seguinte maneira: "Dá-se a insolvência toda vez que as dívidas excederem à importância dos bens do devedor". Deste modo, denunciará a fraude contra o processo executivo a ação do devedor no sentido de alienar todo o seu patrimônio, não reservando bens suficientes para garantia da execução.

4. DIFERENÇAS ENTRE FRAUDE À EXECUÇÃO E FRAUDE CONTRA CREDORES

Embora a fraude contra credores e fraude à execução versem sobre fraude e por isso tenham alguns aspectos em comum, estes não se confundem, apresentando nítidas distinções.
Primeiramente, a fraude contra credores é um instituto próprio do Direito Civil, previsto no art. 158 e ss do Código Civil, sendo um dos defeitos dos atos jurídicos, que depende de ação própria, ação pauliana, para ser declarado. Desta forma, pode-se definir fraude contra credores como "[...] o ato de disposição de bens orientado pela vontade e consciência de prejudicar credores, na medida em que provoca a insolvência do disponente, diminuindo seu patrimônio de forma a impedir a satisfação do crédito".
Assim, este instituto possui dois requisitos indispensáveis para sua configuração: a intenção de prejudicar e a má-fé das partes, também se devendo avaliar se o terceiro sabia da existência da fraude; ademais, deve-se verificar o a insolvência do devedor e prejuízo efetivo ao credor.
Nesse sentido, duas hipóteses caracterizam a fraude contra credores:
a) se o devedor, estando em estado de insolvência, aliena bens ou remite dívidas; ou
b) se ele reduz-se a insolvente com o ato.
A repulsão a estes atos faz-se por meio da ação pauliana, também denominada ação revocatória, cujo efeito é a declaração de anulabilidade do ato fraudulento.
Os requisitos desta ação são os seguintes:
a) deve ser proposta pelo credor prejudicado;
b) pode ser intentada contra o devedor insolvente ou contra terceiros adquirentes que hajam procedido de má-fé;
c) deve ser provado o prejuízo que o ato tenha causado, não o prejuízo que o ato poderia ter causado;
d) deve, ainda, ser provado o estado de insolvência do devedor; e) quando oneroso o negócio jurídico, deve ser provado o acerto entre os participantes dele. A prova deste acerto é desnecessária se o ato fraudulento é gratuito, por presunção de má-fé.

Note-se ainda que a fraude contra credores é causa de anulabilidade do ato, e não de nulidade. A anulação, que se dá com o uso da ação pauliana, tem por efeito a reposição do bem no patrimônio do devedor ou o cancelamento da garantia especial concedida, a fim de que seja restituído seu caráter de garantia genérica.
Em geral, somente os credores quirografários podem propor ação pauliana, já que os credores privilegiados já têm bens destacados a garantir a dívida, sobre os quais incide a execução. Contudo, não estão impedidos de fazê-lo, tendo em vista a possibilidade de que as garantias sejam insuficientes.
No que tange a fraude à execução, trata-se de instituto de direito processual, o qual não atinge só o direito do credor como ocorre na fraude contra credores, mas sim a própria execução e a dignidade da justiça.
Esta modalidade de alienação fraudulenta, ao contrário da fraude contra credores, materializa-se no processo de condenação ou de execução. É mais grave do que a fraude contra credores, por isso é repelida com maior rigor pelo ordenamento jurídico, tendo em vista que frustra a função jurisdicional em curso, subtraindo o objeto sobre o qual recai a execução.
Assim, não há necessidade de que se proponha ação alguma para anular o ato que frauda a execução, já que o ato considera-se ineficaz pela legislação, pois não é oponível contra o exeqüente.
De acordo com o art. 593 do CPC, a fraude à execução ocorre nas seguintes situações:

a) Quando recai sobre bens sobre os quais pende ação fundada em direito real;
b) Ocorre quando corria contra o devedor demanda capaz de reduzi-lo à insolvência; e
c) incide em outras hipóteses previstas em lei.

No que tange a comprovação da fraude, há duas hipóteses a serem consideradas:

1ª) se a citação, na ação, tiver sido levada à inscrição no Registro Geral, a fraude não depende de prova, porque se presume do registro que o fato registrado é de conhecimento de todos e, portanto, do adquirente dos bens ou daquele em favor de quem foi feita a oneração do mesmo;

2ª) se não tiver sido levada a citação a registro, cumpre ao exeqüente provar a fraude.

5. O MOMENTO DA CONFIGURAÇÃO DA FRAUDE À EXECUÇÃO

A alienação do bem garantidor do processo de execução, buscando a insolvência, é o primeiro passo para evidenciar a fraude. Resta apenas identificar o momento de sua configuração.
Três são as teorias que apontam o momento a ser considerado para caracterizar a fraude à execução:

a) A primeira teoria entende que a fraude à execução se configura com a alienação do imóvel depois do simples protocolo da petição inicial na distribuição do fórum.

b) A segunda teoria é a que considera fraudulenta a alienação do imóvel somente após a citação do executado, já que é com a citação que o devedor tem ciência da ação e, alienando o bem, estará, incontestavelmente, agindo de má-fé.

c) O terceiro e último entendimento, defendido enfaticamente por aqueles que estão diretamente ligados à área registral, é o que considera em fraude à execução a alienação do bem após o registro da citação e da penhora no cartório de registro de imóveis, em razão dos princípios da publicidade e da fé pública, pois, a contrário sensu, não estaria o registro trazendo a segurança aos negócios jurídicos conforme determina a lei, perdendo seu objeto.

Considerando a polêmica sobre esta matéria, muitas divergências têm surgindo em nossos tribunais. No entanto, adequando a lei a cada caso concreto, a maioria das decisões demonstram que, somente após a citação, momento no qual o devedor toma conhecimento da ação, é que se pode configurar fraude à execução.
Veja uma das recentes decisões do Egrégio Superior Tribunal de Justiça.

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. EXECUÇÃO. FRAUDE À EXECUÇÃO.
INOCORRÊNCIA. ALIENAÇÃO DE BENS ANTES DO EXECUTIVO E DA CITAÇÃO DODEVEDOR. INTERPRETAÇÃO DOS ARTS. 185 DO CTN E 593, II, DO CPC.
PRECEDENTES.

1. Agravo regimental contra decisão que desproveu o agravo de instrumento do agravante.

2. Acórdão a quo segundo o qual a fraude à execução somente restará caracterizada se a alienação de bem imóvel do executado ocorrer em momento posterior à sua citação, não podendo o terceiro adquirente ser prejudicado pela eventual demora na máquina judiciária na citação do executado.

3. "O CTN nem o CPC, em face da execução, não estabelecem a indisponibilidade de bem alforriado de constrição judicial. A
pré-existência de dívida inscrita ou de execução, por si, não constitui ônus 'erga omnes', efeito decorrente da publicidade do
registro público. Para a demonstração do 'consilium' 'fraudis' não basta o ajuizamento da ação. A demonstração de má-fé, pressupõe ato de efetiva citação ou de constrição judicial ou de atos repersecutórios vinculados a imóvel, para que as modificações na
ordem patrimonial configurem a fraude. Validade da alienação a terceiro que adquiriu o bem sem conhecimento de constrição já que
nenhum ônus foi dado à publicidade. Os precedentes desta Corte não consideram fraude de execução a alienação ocorrida antes da citação do executado alienante. (EREsp nº 31321/SP, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, DJ de 16/11/1999)

4. É indiscutível não se poder aceitar a caracterização de alienação em fraude contra execução fiscal quando o devedor não foi
regularmente citado para responder pela dívida em juízo.

5. Precedentes da 1ª Seção e de todas as Turmas desta Corte Superior.

6. Agravo regimental não provido.

Assim sendo, antes da citação é impossível a configuração da fraude à execução, o que há é a fraude contra credores. Neste sentido, segue ementa de Acórdão que resume a posição jurisprudencial do STJ no tocante a esta questão:

PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. FRAUDE DE EXECUÇÃO. IMOVEL ALIENADO PELO EXECUTADO ANTES DE SUA CITAÇÃO. ART. 593, II, CPC. NOVA ALIENAÇÃO. POSTERIOR A PENHORA, AOS EMBARGANTES. CONSTRIÇÃO NÃO LEVADA A REGISTRO. PRECEDENTES. RECURSO ACOLHIDO.

I - Na linha dos precedentes da corte, não se considera realizada em fraude de execução a alienação ocorrida antes da citação do executado-alienante.

II - Para que não se desconstitua penhora sobre imóvel alienado posteriormente a efetivação da medida constritiva, ao exeqüente que a não tenha levado a registro cumpre demonstrar que dela os adquirentes-embargantes tinham ciência, máxime quando a alienação a a estes tenha sido realizada por terceiros, que não o executado." (REsp nº 37.011-6/SP, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo, DJ 11.10.93, 4ª T.)

6. CONCLUSÃO

Assim sendo, o instituto da fraude à execução é mais grave que a fraude contra credores, possuindo caráter processual, além de ser um crime tipificado no Código Penal art. 179. O ato fraudulento é atentatório à dignidade da justiça, e por isso é suficiente que haja litispendência em ação judicial, qualquer que seja ela, em qualquer juízo, desde que tenha aptidão para levar o devedor à insolvência, para se configurar a fraude.

Portanto, estando citado validamente o réu, ainda que seja para o pagamento de simples despesas processuais e honorários de advogado, qualquer ato de liberalidade, oneração ou alienação capaz de levá-lo à insolvência pode ser declarado como havendo sido celebrado em fraude de execução, sendo ineficaz com relação àquela demanda. Haverá a fraude à execução sempre que a lei mencionar que determinada conduta a caracteriza. Exemplo disso é o art. 185 do Código Tributário Nacional.