PECULATO
Embargos infringentes. Peculato. Comete o crime previsto no art. 312 do CP o
policial civil que se apropria indevidamente de automóvel, ainda que
de particular, do qual tinha a posse em razão do cargo, sendo desnecessário
que o empréstimo tenha resultado de mandamento legal ou praxe acentuada.
Embargos rejeitados.
O. A. B. P. M., embargante – Ministério Público, embargado.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos. Acordam, em 2º Grupo Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, rejeitar os embargos infringentes, de conformidade e pelos fundamentos constantes das notas taquigráficas, integrantes do presente acórdão. Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário, os Exmos. Srs. Des. José Eugênio Tedesco (Presidente, com voto), Aristides Pedroso de Albuquerque Neto, Vladimir Giacomuzzi, Marco Antônio Barbosa Leal, Gaspar Marques Batista e o Dr. Reinaldo José Rammé, Juiz Substituto.
Porto Alegre, 08 de junho de 2001.
Constantino Lisbôa de Azevedo, Relator.
RELATÓRIO
Des. Constantino Lisbôa de Azevedo – Senhor Presidente. O. A. B. P. M. foi denunciado na 1ª Vara Criminal da Comarca de Novo Hamburgo como incurso nas sanções do art. 312 do CP. Segundo a denúncia, desde o mês de janeiro de 1996 até o mês de março do corrente ano, na Delegacia de Polícia de Novo Hamburgo (DEFREC), o denunciado, na qualidade de funcionário público estadual, apropriou-se de um veículo GM/Monza, cor dourada, modelo/86, pertencente a A. C. B. S., avaliado em R$ 7.500,00, desviando--lhe em proveito próprio, ao utilizá-lo como automóvel particular.
Na oportunidade, o automóvel foi tomado emprestado para serem efetuadas umas diligências de prisão de falsários de moeda, sendo que o denunciado, ao invés de devolver o automóvel àquele que o emprestou, permaneceu utilizando-se dele, somente devolvendo-o depois de decisão da Justiça Federal.
Após regular instrução, o magistrado proferiu sentença, condenando o réu, nos termos da denúncia, à pena de 04 anos de reclusão e 48 dias-multa, à razão de 1/10 do salário mínimo vigente à época do fato, em regime aberto. Irresignado, interpôs o condenado recurso de apelação, pleiteando a absolvição ou a redução da pena imposta.
A Egrégia Câmara Especial Criminal, por maioria (Dra. Maria da Graça Carvalho Mottin, Revisora, e Des. Marco Antônio Barbosa Leal, Presidente), negou provimento à apelação, vencido o Dr. Carlos Cini Marchionatti, Relator, que dava provimento parcial, a fim de desclassificar a imputação para o art. 168, § 1º, inc. III, 1ª parte, do CP.
Findo o processo, via acórdão, O. A. B. P. M. ingressou com embargos infringentes, objetivando fazer valer o voto vencido, alegando que o crime de peculato não se caracterizou. O Dr. Procurador de Justiça emitiu parecer, opinando pela rejeição dos embargos. É o relatório.
VOTO
Des. Constantino Lisbôa de Azevedo – Senhor Presidente. Com todo o respeito ao entendimento do eminente prolator do voto vencido, tenho que a razão está com a douta maioria. A ocorrência da apropriação indébita é reconhecida por todos, não cabendo qualquer discussão a respeito, até porque não é objeto dos embargos.
O embargante foi condenado porque, na função de policial, apropriou--se indevidamente de um veículo Monza, tomado por empréstimo para diligências, visando à prisão de falsários de moeda. O art. 312 do CP reza: "Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio."
Como se pode ver, ao contrário do que diz o respeitável voto minoritário, a lei não exige que o agente tenha a posse, além de, em razão da função, também, em decorrência de mandamento legal ou praxe acentuada, sendo descabida qualquer interpretação extensiva em matéria penal (ita lex scripta est, ou seja, assim está escrita a lei); enfim, não se lê o que o legislador não escreveu.
"Para a realização do tipo do art. 312, caput, do CP, basta a posse da coisa em razão do cargo, ainda que a sua propriedade seja de particular." (STF, HC, Rel. Décio Miranda, "RT" nº 520/519)
Assim, comete o crime previsto no art. 312 do CP o policial civil que se apropria indevidamente de automóvel, ainda que de particular, do qual tinha a posse em razão do cargo, sendo desnecessário que o empréstimo tenha resultado de mandamento legal ou praxe acentuada. Dessarte, pedindo vênia ao eminente prolator do voto vencido, rejeito os embargos. É o voto.
O Dr. Reinaldo José Rammé e os Des. Marco Antônio Barbosa Leal, José Eugênio Tedesco, Aristides Pedroso de Albuquerque Neto, Vladimir Giacomuzzi e Gaspar Marques Batista – De acordo com o Relator.
Fonte : Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul