AÇÃO REGRESSIVA – DANOS CAUSADOS EM ACIDENTE DE TRÂNSITO

 

Apelação Cível n. 2006.033716-3, de Balneário Camboriú

Relator: Des. Mazoni Ferreira

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REGRESSIVA. DANOS CAUSADOS EM ACIDENTE DE TRÂNSITO. AÇÃO MOVIDA PELA SEGURADORA ATRIBUINDO CULPA A TERCEIRO. INVASÃO DE PISTA. PROVA INSUFICIENTE. BOLETIM DE OCORRÊNCIA FIRMADO EM VERSÃO EXCLUSIVA DE UMA DAS PARTES. PRESUNÇÃO JURIS TANTUM ABALADA. AUSÊNCIA DE PROVA ACERCA DO FATO CONSTITUTIVO DO DIREITO INVOCADO PELA AUTORA. APLICAÇÃO DO ART. 333, I, DO CPC. IMPROCEDÊNCIA DO PLEITO EXORDIAL. IMPOSSIBILIDADE DE SE AQUILATAR A RESPONSABILIDADE PELO EVENTO DANOSO. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO INAFASTÁVEL. SENTENÇA MANTIDA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MINORAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PATAMAR CONDIZENTE COM O TRABALHO EMPREENDIDO PELO CAUSÍDICO E O TEMPO DESPENDIDO NA CAUSA. OBSERVÂNCIA DOS PARÂMETROS DO ART. 20, §§ 3º e 4º, DO CPC. VALOR MANTIDO. RECURSO DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2006.033716-3, da comarca de Balneário Camboriú (2ª Vara Cível), em que é apelante Vera Cruz Seguradora S.A., e apelados Fausto Angelo Batistão e José Adair Antunes:

ACORDAM, em Segunda Câmara de Direito Civil, por unanimidade de votos, negar provimento ao recurso. Custas na forma da lei.

RELATÓRIO

Vera Cruz Seguradora S.A. ajuizou ação regressiva de ressarcimento de danos causados por acidente de veículo contra Fausto Angelo Batistão e José Adair Antunes, na qual objetiva o recebimento da quantia de R$ 2.770,35, desembolsada por ela em virtude do pagamento do seguro do veículo VW/Gol 16V 1.0 MI, placa LZT 8563, de propriedade de Ivan Carlos Wilbert e por ele conduzido, o qual, em 2-11-2000, por volta das 21h30min, envolveu-se num acidente de trânsito com a moto de propriedade do primeiro requerido e conduzida pelo segundo.

Relatou que o veículo segurado transitava normalmente pela BR 101, no sentido Florianópolis-Itajaí, quando, inesperadamente, a moto conduzida pelo segundo réu invadiu a preferencial, sem a devida cautela, provocando a colisão e causando danos materiais pela autora suportados.

Ao final, pugnou pela citação dos requeridos e pela procedência do pedido, com a condenação daqueles ao pagamento do principal, acrescido de juros, correção monetária, custas processuais e honorários advocatícios.

Citados, Fausto Angelo Batistão e José Adair Antunes apresentaram contestação e pediram a improcedência do pedido porque o evento danoso, segundo eles, ocorreu por culpa exclusiva do condutor do veículo segurado.

Réplica às fls. 72-74.

Finda a instrução processual, sobreveio sentença, na qual o Magistrado singular julgou improcedente o pedido inicial e condenou a autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em R$ 1.500,00, de acordo com o artigo 20, § 4º, do CPC.

Inconformada, Vera Cruz Seguradora S.A. interpôs recurso de apelação, no qual busca a reforma da sentença para que seja julgado improcedente o pedido inicial. Mais uma vez, repisou os termos expostos na inicial. Sucessivamente, requereu a redução da verba honorária. Por fim, prequestionou o art. 20, § 4º, do CPC e o art. 93, IX, da CF.

Contrarrazões às fls. 194-207.

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto por Vera Cruz Seguradora S.A., o qual visa à reforma da sentença do doutor Juiz de Direito da 2ª Vara Cível da comarca de Balneário Camboriú que, nos autos da ação regressiva de ressarcimento de danos causados por acidente de veículo movida contra Fausto Angelo Batistão e José Adair Antunes, julgou improcedente o pedido e condenou-a ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em R$ 1.500,00.

O recurso, que se restringe à análise da culpa, é conhecido porque é próprio e tempestivo, mas não merece guarida.

O Juiz Singular Dr. Adilor Danieli, em percuciente análise da questão, sopesou detidamente todos os elementos de prova carreados aos autos, pelo que adoto seus bem-lançados fundamentos como razão de decidir (fls. 156-160):

"Os requeridos aduziram que o fato ocorreu por culpa do veículo segurado, pois este teria colidido na traseira da moto, quando esta já transitava por cerca de um quilômetro na BR 101, contrariando a versão apresentada pela parte autora, de que a moto teria adentrado inopinadamente na pista tirando a direção defensiva do veículo segurado, que acabou por colidir na traseira da moto.

Inicialmente observo que a versão apresentada pela parte autora de que a moto adentrou na pista sem adotar as cautelas necessárias, resta frágil, sem provas suficientes para ser acolhida.

Para tanto, anoto que o levantamento do acidente realizado pela polícia, embora conste "declaração dos condutores", está subscrito apenas pelo condutor do veículo segurado (fls. 13), pelo que pode ser acolhida a versão de que o condutor da moto tenha ficado inconsciente e não tenha ratificado tal versão; se tivesse, teria subscrito.

Às folhas 16, segunda parte, temos declaração do condutor do veículo que transitava logo atrás do veículo segurado, o qual declarou: "...Estava trafegando pela BR 101, sentido Itapema - Itajai, quando o gol colidiu em uma moto honda, que segundo o condutor do gol, entrou em sua frente, cortando a frente...". Por referida declaração, temos que esta foi feita com base unicamente nas declarações do condutor do veículo segurado, ou seja, o declarante não presenciou se a moto adentrou ou já estava na pista.

As testemunhas ouvidas às folhas 90, 91 e 111, não ratificam a versão da parte autora, mas sim da parte requerida, de que a moto estava transitando pela rodovia, foi ultrapassada por um caminhão e em seguida, o veículo segurado teria colidido na traseira da moto.

Feita esta análise, conclui-se que a moto estava transitando pela BR 101, quando foi colidida em sua traseira pelo veículo segurado. Este fato, não imputa ao condutor da moto a culpa pelo evento danoso, mas ao condutor do veículo segurado. Vejamos:

APELAÇÃO CÍVEL - RESPONSABILIDADE CIVIL - AÇÃO DE RESSARCIMENTO DE DANOS EM ACIDENTE DE TRÂNSITO - BOLETIM DE OCORRÊNCIA - PRESUNÇÃO IURIS TANTUM - COLISÃO NA TRASEIRA DE VEÍCULO AUTOMOTOR - CONJUNTO PROBATÓRIO QUE ESCLARECE A REALIDADE FÁTICA OCORRIDA NO EVENTO DANOSO E AFASTA A PRESUNÇÃO RELATIVA DE CULPA DO APELADO - DEVER DE INDENIZAR INEXISTENTE - APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO DO JUIZ - RECURSO DESPROVIDO

"Destarte, a declaração de condutor de veículo envolvido no acidente, ainda que aposta no boletim de ocorrência, não se reveste da presunção juris tantum de veracidade do seu conteúdo, constituindo, no máximo, elemento de convicção que pode ser considerado pelo julgador" (Des. Carlos Prudêncio)

juris tantum a presunção de culpa do condutor que abalroa a parte traseira de veículo estacionado, podendo ser elidida se o corpo probante dos autos indicar o contrário" (Desª. Salete Silva Sommariva). (Apelação Cível n. 2005.008967-8, de Blumenau. Relator: Juiz Sérgio Izidoro Heil).

Mais:

"Se a prova técnica não fornece sinais e dados técnicos que possam levar o juiz a formar um convencimento seguro, a solução da causa é de ser encontrada na prova testemunhal. Sendo conflitante a prova testemunhal produzida pelas partes, a improcedência do pedido se impõe. (JC 66/354, Rel. Des. Nestor Silveira)" (AC n. 1997.007426-3, da Palhoça, rel. Des. Pedro Manoel Abreu, j. 20/4/99).

Ou:

"Regra geral no caso de acidentes automobilísticos é a presunção relativa de culpa daquele que bate na parte traseira do veículo que seguia a sua frente. Diante disso, compete a parte contrária provar a ocorrência de fato extraordinário, como a repentina freada do carro que segue à frente sem motivo justificável e sem a utilização dos sinais acautelatórios" (AC. n. 1999.003425-9, de Blumenau, rel. Des. Carlos Prudêncio, j. 30/10/2001).

Não é por demais citar:

"AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS - SEGURADORA - ACIDENTE DE TRÂNSITO - COLISÃO NA TRASEIRA - PRESUNÇÃO DE CULPA

"Sendo a frenagem um fenômeno previsível, age com imprudência o condutor do veículo que trafega em velocidade incompatível com as condições de tempo e lugar, ainda que não excedente ao limite legal, colidindo contra veículo que segue à frente" (AC n.º 97.010821-4, Des. Pedro Manoel Abreu)." (ACV n. 99.020636-0 - Rel. Des. Newton Trisotto)

Ensina ARNALDO RIZZARDO, "a presunção da culpa é sempre daquele que bate na parte traseira de outro veículo. Constitui princípio elementar de condução de veículo a observância de distância suficiente para possibilitar qualquer manobra rápida e brusca, imposta por súbita freada do carro que segue à frente. (..) Isto de modo especial quando a pista se encontra molhada, ou as condições do tempo não oferecem uma clara visibilidade, ou nas proximidades de pontos sinalizados das vias e de semáforos" (A reparação nos acidentes de trânsito: Lei 9.503. de 23.09.97. 9. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 299).

Ainda:

"É presunção juris tantum, a culpa do condutor do veículo que colide contra a traseira do que segue imediatamente à sua frente. Isso decorre da circunstância de que aquele vai atrás deve manter regular distância do outro, conduzindo-se ainda, com toda a atenção, de modo que, em havendo qualquer imprevisto, tenha condições de frear e evitar a colisão" (RT 714/157).

"O motorista que dirige, tendo outro veículo em marcha à sua frente, deve segui-lo mantendo uma velocidade de segurança, que lhe permita, em qualquer emergência, evitar uma colisão com o veículo que o precede. Não observada essa regra, é imperioso reconhecer sua culpa pela colisão que causou com o carro que o precedia" (AC n. 30.134, Rel. Des. Wilson Guarany, julgada em 22/11/1988).

Em análise da prova produzida nos autos, não restam dúvidas de que a parte autora não logrou êxito em demonstrar a culpabilidade do condutor da moto, pelo que deve a inicial ser julgada improcedente."

Quanto ao pedido de minoração dos honorários advocatícios, também não assiste razão à apelante, visto que esses foram fixados de acordo com o art. 20, §§ 3º e 4º, do Código de Processo Civil, e são capazes de remunerar de forma condigna o trabalho prestado pelo causídico no transcorrer da lide, em atenção aos quesitos do grau de zelo do profissional, do lugar de prestação do serviço, da natureza e da importância da causa, do trabalho realizado pelo advogado e do tempo exigido para o seu serviço.

Logo, deve ser mantida incólume a verba honorária lançada pelo Juiz singular - R$ 1.500,00 -, porquanto fixada nos termos do art. 20, §§ 3º e 4º, do CPC, e condizente com os princípios da equidade, razoabilidade e proporcionalidade.

Por fim, no que se refere ao pedido de prequestionamento do artigo 20, § 4º, do Código de Processo Civil e do artigo 93, IX, da Constituição Federal, entende-se-o como impróprio, porquanto as questões relacionadas ao objeto do recurso foram decididas consoante as razões e os fundamentos acima expostos.

Imperioso ressaltar que o julgador não está obrigado a comentar todos os dispositivos legais nos quais se embasou para formar o seu convencimento; basta, para tanto, que as decisões sejam fundamentadas de forma satisfatória, cumprindo, assim, a ordem prevista no art. 93, IX, da Constituição Federal.

Por oportuno, traz-se a lume este julgado:

O juiz não está obrigado a responder todas as alegações das partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para fundar a decisão, nem se obriga a ater-se aos fundamentos indicados por elas e tampouco a responder um a um todos os seus argumentos (RJTJESP 115/207).

Ante o exposto, nego provimento ao recurso.

DECISÃO

Nos termos do voto do relator, a Segunda Câmara de Direito Civil decide, por unanimidade de votos, negar provimento ao recurso.

O julgamento, realizado no dia 15 de outubro de 2009, foi presidido pelo Des. Mazoni Ferreira, com voto, e dele participaram os Exmos. Srs. Des. Luiz Carlos Freyesleben e Sérgio Izidoro Heil.

Florianópolis, 23 de outubro de 2009.