INTERRUPÇÃO DE SERVIÇO
DE TELEFONIA
Apelação
Cível n. 2009.030254-7, de Blumenau
Relator:
Des. Luiz Cézar Medeiros
CIVIL -
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - INTERRUPÇÃO DO FORNECIMENTO DE SERVIÇOS DE TELEFONIA -
DANOS MORAIS - INOCORRÊNCIA
1 O
inadimplemento contratual, na ausência de fato específico que cause abalo
moral, em regra, somente obriga à indenização dos danos materiais.
Vistos,
relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2009.030254-7, da
Comarca de Blumenau (2ª Vara Cível), em que são apelantes e apelados Tim
Celular S/A e Clínica de Rins Vale do Itajaí S/C:
ACORDAM,
RELATÓRIO
Clínica de
Rins Vale do Itajaí S/C Ltda. ajuizou ação de reparação de danos contra Tim
Celular S.A aduzindo que, no dia 1º.04.2008, "todos os 75 (setenta e
cinco) telefones celulares disponíveis à Requerente foram bloqueados, sob a
alegação de falta de pagamento da fatura correspondente ao mês de novembro/2007"
(fl. 3).
Narrou que,
com o ocorrido toda a equipe médica "incluindo os médicos e enfermeiros
de plantão, bem como diversos funcionários do setor administrativo da empresa
ficaram absolutamente indisponíveis e incomunicáveis durante as 24 horas do
01/04/2008" (fl. 4).
Afirmou que
"a cobrança do pagamento da fatura referente ao mês de novembro/2007
era completamente INDEVIDA, sendo que a Requerente já havia efetuado o devido
pagamento de tal fatura no prazo de seu vencimento" (fl. 4).
Salientou
ainda que "a correspondência encaminhada pela Requerida, a qual
comunicava a Requerente do suposto débito e ameaçava o bloqueio em caso de não
pagamento até o dia 29/03/2008, que o valor então cobrado - R$ 10.658,96 (dez
mil seiscentos e cinqüenta e oito reais e noventa e seis centavos) -, sequer
correspondia ao valor da fatura de novembro/2007, que era de R$ 12.490,60 (doze
mil quatrocentos e noventa reais e sessenta centavos)" (fl. 4).
Por fim,
pleiteou a condenação da requerida ao pagamento de indenização por dano moral
(fl. 13).
O
Meritíssimo Juiz, Doutor Jorge Luiz Costa Beber, julgou procedente o pedido,
registrando no decisum:
"ANTE
O EXPOSTO, e pelo o que mais dos autos consta, JULGO PROCEDENTE a
presente AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS aforada por CLÍNICA DE RINS VALE
DO ITAJAÍ S/C LTDA em desfavor de TIM CELULAR S/A para, em
conseqüência, condenar a ré ao pagamento da quantia de R$ 4.500,00, a título de
indenização por danos morais, atualizada monetariamente desde a data do ilícito
(01.04.08) e acrescidas de juros de mora, estes contados da data da sentença.
"Outrossim,
condeno a ré ao pagamento das custas processuais e honorários em favor do
patrono da demandante, arbitrados em 15% sobre o valor total devido, ex vi
do art. 20, § 3º, do CPC" (fls. 82-88).
Inconformados
com o teor da decisão, as partes apelaram.
A empresa
ré, sustenta que: a) o quantum deverá ser minorado; b) os juros e
correção monetária deverão ser contados a partir do trânsito em julgado da
sentença e c) os honorários advocatícios deverão ser reduzidos. Ao final,
requereu a reforma total da decisão (fls. 90-107).
Igualmente
inconformada a empresa autora aduziu que o valor fixado a título de danos
morais deverão ser majorados para o percentual de R$ 10.000,00 (dez mil reais)
(fls. 109-118).
Apresentadas
as contrarrazões às fls. 134-143 e 146-150, os autos
ascenderam a esta Corte de Justiça.
VOTO
1 Trata-se
de apelação cível em que as partes visam à reforma da decisão que julgou
procedente o pedido indenizatório por danos morais, fixando-o em R$ 4.500,00 (quatro
mil e quinhentos reais).
A questão
posta no recurso cinge-se à discussão sobre: a) a responsabilidade da requerida
pela suspensão dos serviços de telefonia à empresa autora; b) se há efetiva
eficácia dos fatos para causar abalo de ordem moral; c) o valor da indenização
a ser fixada.
Cumpre
primeiramente esclarecer que o caso em tela rege-se pelas normas do Código de
Defesa do Consumidor, pois à requerida, concessionária de serviço público,
aplicam-se as regras daquele Diploma legal, nos exatos termos do seu art. 3º:
"Art.
3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou
estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de
produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação,
distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços".
Sobre a
matéria, enfatiza Rui Stoco:
"Nessa
condição, é alcançada pela disposição, muito mais garantidora, do art. 37, §
6º, a CF, ao dispor que 'as pessoas jurídicas de direito público e as de
direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que
seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de
regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa'.
"Desse
modo, as empresas ficam enquadradas na teoria do risco administrativo, sendo,
assim, objetiva a sua responsabilidade pelos danos causados a terceiros.
"Evidentemente,
não se descarta a incidência obrigatória do Código de Defesa do Consumidor,
naquilo que favoreça e proteja a vítima, considerando que o fornecimento de
energia elétrica para consumo enquadra-se nos conceitos ali estabelecidos,
devendo a energia elétrica ser considerada como produto, posto que é um bem
consumível ou fungível" (Tratado de responsabilidade civil. 7 ed. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 980) [grifou-se].
O microssistema consumerista
brasileiro apresenta-se como uma das mais avançadas legislações existentes no
mundo, não olvidando a necessidade de prevenção e reparação dos danos causados
ao consumidor, mas, pelo contrário, inserindo-a como um de seus direitos
básicos:
"Art.
6º São direitos básicos do consumidor:
[...]
"VI
- a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais,
coletivos e difusos".
Ao tratar
sobre o direito à indenização regulamentado pelo mencionado dispositivo legal,
João Batista de Almeida leciona em sua obra:
"Todo
o aparato legal visa a prevenir a ocorrência de danos ao consumidor, quer
estipulando obrigações ao fornecedor, quer responsabilizando-o por danos e
defeitos, quer restringindo a autonomia da vontade nos contratos, quer
criminalizando condutas, mas tal não impede que tais danos venham a ocorrer.
Por isso, é assegurado como direito do consumidor o ressarcimento do prejuízo
sofrido, seja patrimonial, moral, individual, coletivo ou difuso, pois, do
contrário, não haverá efetividade na tutela (CDC, art. 6º, VI). Ao direito à
indenização está diretamente ligado o direito de acesso à Justiça e à
Administração, vias nas quais poderá ser pleiteado e obtido o respectivo
ressarcimento (inc. VII)" (Manual de direito do consumidor. São
Paulo: Saraiva, 2006, p. 45-46).
Essa
obrigação alcança as prestadoras de serviço público, conforme disposição legal:
"Art.
22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias,
permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a
fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais,
contínuos.
"Parágrafo
único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações
referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e
a reparar os danos causados, na forma prevista neste código"
(grifou-se).
Portanto,
em caso de danos causados ao consumidor, esse tem o direito a ser indenizado
pelos prejuízos suportados.
2 Para a
verificação da responsabilidade do fornecedor há que se atentar para a teoria
aplicável ao caso da relação consumerista.
Relevante
esclarecer que para as relações de direito privado o Código Civil adota como
regra geral a responsabilidade subjetiva, baseada na perquirição da culpa,
enquanto para as relações consumeristas o legislador
optou pela responsabilidade objetiva, ou seja, retirou a necessidade de
comprovação de culpa, ante a manifesta vulnerabilidade do consumidor.
O doutrinador
antes mencionado, João Batista de Almeida, registra em sua obra que "consagrada
a responsabilidade objetiva do fornecedor, não se perquire a existência de
culpa; sua ocorrência é irrelevante e sua verificação desnecessária, pois não
há interferência da responsabilização" (op. cit., p. 61).
Assim, o
fornecedor responderá pelos danos causados, ainda que não tenha obrado em uma
das formas da culpa - negligência, imprudência ou imperícia -, bastando que o
consumidor comprove o dano e o nexo de causalidade.
Impende
também registrar que a responsabilidade objetiva do prestador do serviço
público nasce da própria disposição da Constituição Federal, que em seu art.
37, § 6º, dispõe: "as pessoas jurídicas de direito público e as
de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que
seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de
regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa".
3 Não
obstante a responsabilidade objetiva da ré, no caso em tela não houve
comprovação de lesão grave à empresa autora. O fato de o fornecimento dos
serviços de telefonia ter sido suspenso por tempo mínimo, causando-lhe mero
incômodo, não dá azo à indenização por dano moral. Porém, se se tratasse de danos materiais devidamente comprovados, o
seu direito subjetivo à reparação seria inquestionável.
Acerca
da imprescindibilidade da configuração do dano moral para que reste evidenciada
a responsabilidade civil e o direito à
correspondente indenização, recorre-se à lição de Daniel Luiz do Nascimento
França:
"De
fácil percepção a possibilidade da coexistência de ambas as teorias, quais
sejam, responsabilidade civil subjetiva e
objetiva. Como dito alhures, a primeira é tida, em nosso ordenamento jurídico,
como regra e exige uma conduta ilícita e culposa (ato ilícito) que cause dano a
outrem. Já a segunda é prevista para casos específicos e determinados
legalmente, exigindo, tão-somente, uma conduta que venha trazer prejuízo a um
terceiro.
"Primordial,
entretanto, a verificação dos requisitos necessários para a configuração da responsabilidade civil. Neste instante, é
importante ressaltar que tal situação é idêntica tanto para o dano material
como para o imaterial. Até porque, o instituto da responsabilidade civil é o mesmo, ocorrendo
alteração no efeito da lesão e no caráter de sua repercussão sobre o lesado.
"[...]
"Não
há que se falar em reparação ou compensação se ausente o dano, 'como regra
geral, devemos ter presente a inexistência de dano é óbice à pretensão de uma
reparação, aliás sem objeto. Ainda mesmo que haja violação de um dever jurídico
e que tenha existido culpa e até dolo por parte do infrator, nenhuma
indenização será devida, uma vez que não se tenha verificado prejuízo'. (STOCO, Rui. Tratado
de responsabilidade civil: responsabilidade civil e sua interpretação
doutrinária e jurisprudêncial. 5. Ed. São Paulo:
RT, 2001. P.89)
"Caso
contrário, poderíamos ingressar numa temerária fase de industrialização do dano
moral. Qualquer aborrecimento inexpressivo ou suposto dano, ainda que não
comprovado, poderia ser objeto de indenizações vultosas.
"Não
provado o dano, ainda que exclusivamente moral, nenhuma indenização é devida.
Nossos tribunais corroboram essa corrente, através de reiterados julgados que
não reconhecem a existência de responsabilidade civil, quando não
comprovada a ocorrência de dano.
"Em
consistente voto, a Excelentíssima Juíza Teresa Cristina da Cunha Peixoto
defendeu, com clareza ímpar, essa corrente doutrinária. 'In casu, não se desincumbiu o apelante de provar a
ocorrência de qualquer dano patrimonial ou mesmo moral que porventura tivesse
sofrido (...). Assim, sem a comprovação dos prejuízos sofridos pelo autor,
torna-se inadmissível a pretensão indenizatória, máxime quando ao demonstrado,
na espécie, qualquer constrangimento sofrido, em face negociação realizada
entre as partes' (ApCiv 340.272-4, 3.ª Câm. Cív. Do TAMG, rel. Juíza
Teresa Cristina da Cunha Peixoto, j. 26.07.2001.
"A
necessidade da prova do eventus damni se mostra imperiosa para configuração da responsabilidade civil. A ocorrência de
dano moral ou imaterial não inibe a possibilidade de prova do mesmo que poderá
ser feita por todos os meios em direito permitidos" (Revista de Direito
Privado. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 19, jul. 2004, p. 69-82).
Percebe-se
que para configurar a responsabilidade objetiva e o respectivo dever de
indenizar, é necessária a comprovação do dano sofrido e o nexo causal com o ato
lesivo praticado pelo agente, ou seja, é necessário que se demonstre que o
evento noticiado tenha o condão de causar dano moral a ser indenizado.
Resta
evidente que os aborrecimentos que geram um certo transtorno no momento dos
fatos, irritações, dissabores e outros contratempos cotidianos, não têm o
condão de conferir direito ao pagamento de indenização, pois não são
suficientes para provocar forte perturbação ao íntimo da vítima, o que
caracterizaria o dano passível de indenização.
Sobre o
tema, sustenta o doutrinador Sérgio Cavalieri Filho:
"Nessa
linha de princípio, só deve ser reputado como dano moral a dor, vexame,
sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no
comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e
desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação
ou sensibilidade exarcebada estão fora da órbita do
dano moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia-a-dia,
no trabalho, no trânsito, entre os amigos e até no ambiente familiar, tais
situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio
psicológico do indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos por banalizar o
dano moral, ensejando ações judiciais em busca de indenizações pelos mais
triviais aborrecimentos" (Programa de Responsabilidade Civil. São Paulo:
Malheiros Editores, 6 ed., 2005, p. 105).
No mesmo
vértice é a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro:
"Versa
a controvérsia recursal sobre pedido de indenização por danos morais
decorrentes da falha nos serviços prestados pela concessionária de energia
elétrica, notadamente quanto à falta do fornecimento de energia elétrica na
residência da autora no município de São Gonçalo, por 12 horas, na noite do dia
24 de dezembro de 2006.
"Embora
tenha restado demonstrada a falha cometida por parte da concessionária de
energia - que não forneceu energia elétrica à residência da autora na noite de
natal, certo é que tal fato, por si só, não é apto a ensejar danos morais
indenizáveis à consumidora, porquanto a hipótese não ultrapassa a esfera do
simples inadimplemento contratual e do mero aborrecimento do dia-a-dia.
"Dessa
forma, mostra-se cogente a reforma da sentença, devendo prevalecer, no caso
concreto, o entendimento já consagrado através do verbete sumular nº. 75 deste
TJ/RJ, segundo o qual 'o simples descumprimento de dever legal ou
contratual, por caracterizar mero aborrecimento, em princípio, não configura
dano moral, salvo se da infração advém circunstância que atenta contra a
dignidade da parte'.
"RECURSO
PROVIDO" (AC 2008.001.38000, Des. Elisabete Filizzola).
"APELAÇÃO
CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. O mero desligamento de
fornecimento de energia elétrica, ainda que discutível a comprovação do corte
não enseja direito à reparação por dano moral, não havendo demonstração de
ocorrência de situação extraordinária ou mais grave, que atente à dignidade da
parte. Principalmente tratando-se de tempo mínimo de falta de energia,
classifica-se o ato como mero aborrecimento. Sentença que se reforma para
julgar improcedente o pedido de indenização por dano moral.
"ART.
557 DO CPC.
"NEGATIVA
DE SEGUIMENTO DO RECURSO" (AC n. 2008.001.23110, Des. Marco Aurélio Froes).
E, na mesma
alheta, a do Tribunal de Justiça do Estado de São
Paulo:
"DECLARATÓRIA
- PRESTAÇÃO DE SERVIÇO - Energia elétrica - Débito - Fraude - TOI - Presunção
relativa de legalidade e veracidade - Perícia - Não realização - Arts. 71, 72, 75 e 90 da Resolução 456/00 da ANEEL - Corte
no fornecimento - Constrangimento ao consumidor - Vedação ao fornecedor. Danos
morais - Ausência de comprovação - Mero aborrecimento - Recursos improvidos" (Apelação com Revisão n. 1.008.789.008,
Des. Melo Bueno).
"PRESTAÇÃO
DE SERVIÇOS - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO - RELAÇÃO DE
CONSUMO - LAVRATURA DE TERMO DE OCORRÊNCIA DE IRREGULARIDADE (TOI) - FRAUDE NO
MEDIDOR DE CONSUMO DE ENERGIA QUE DEVE SER PROVADA PELA CONCESSIONÁRIA
PRESTADORA DO SERVIÇO - INTERRUPÇÃO DO FORNECIMENTO DE ENERGIA - NÃO
CONSERVAÇÃO DO MEDIDOR DE ENERGIA PARA REALIZAÇÃO DE PERÍCIA - COBRANÇA DE
CONSUMO INVALIDADA. DANOS MORAIS. ABORRECIMENTO E DISSABOR CONJURADO
PRONTAMENTE COM A ATUAÇÃO JURISDICIONAL, SEM ESTATURA PARA CARACTERIZAR
DISTÚRBIO ANORMAL À VIDA DO CONSUMIDOR. RECURSOS IMPROVIDOS.
"1. O
termo de ocorrência de irregularidade (TOI) lavrado não demonstra, por si só, a
ocorrência de fraude no relógio medidor de energia, nem comprova consumo de
energia elétrica em prejuízo da concessionária.
"2.
Compete à concessionária prestadora do serviço de fornecimento de energia, que
afirmou a prática da fraude - e pretende cobrar energia que diz ter sido
ilicitamente utilizada - o ônus de provar sua alegação.
"
E também
desta Corte de Justiça:
"AÇÃO
INDENIZATÓRIA - CORTE NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA - INADIMPLÊNCIA DO
CONSUMIDOR - AVISO PRÉVIO DEMONSTRADO - RESOLUÇÃO N. 456/00 DA ANEEL -
POSSIBILIDADE.
"Verificada
a inadimplência do consumidor quanto ao pagamento das faturas, está autorizada
a concessionária prestadora de serviço público, após prévio aviso, a suspender
o fornecimento de eletricidade, conforme previsto no art. 91, I, da Resolução
n. 456/00 da Aneel.
Percebe-se
que para configurar a responsabilidade objetiva e o dever de indenizar, é
necessária a comprovação do dano sofrido e o nexo causal deste com o ato lesivo
praticado pelo agente.
"DANO
MORAL - ATO DE CONCESSIONÁRIA - CORTE DE ENERGIA - OBSERVÂNCIA DAS PRESCRIÇÕES
LEGAIS - EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO - INDENIZAÇÃO DESCABIDA.
"Demonstrada
a inexistência de ato ilícito, em virtude do exercício regular do direito por
parte da concessionária/acionada, descaracterizada se acha a configuração do
dano moral.
"No
mais, trivial aborrecimento está fora da órbita do dano moral, sob pena de sua
mais completa banalização, posto que houve a comunicação do inadimplemento do
consumidor" (AC n. 2007.029695-6, Des. Volnei Carlin).
"INDENIZAÇÃO.
PUBLICAÇÃO
"'[...]
Cabe ressaltar que o Judiciário tem a obrigação de combater a chamada indústria
do dano moral, que vem crescendo dia-a-dia
"'A
litigância de má-fé exsurge somente quando existem
provas ou indícios de dolo ou culpa na utilização de atos que tendam a criar
óbices ao normal desenvolvimento da quizila. No mais, prevalece a boa-fé, que é
presumida' (AI 2003.011069-0, de Xanxerê, rel.
Des. Fernando Carioni)" (AC n. 2004.042932-8,
Des. Vanderlei Romer).
Em
arremate, colaciona-se o entendimento do Superior Tribunal de Justiça exarado
nos seguintes julgados:
"Responsabilidade Civil. Indenização. Danos
Morais. Interrupção Serviços Telefônico. Mero Dissabor.
"O
mero dissabor não pode ser alçado ao patamar do dano moral, mas somente aquela
agressão que exarceba a naturalidade dos fatos da
vida, causando fundadas aflições ou angústias no espírito de quem ela se
dirige. Recurso Especial conhecido e provido" (REsp n. 606382/MS, Min.
Cesar Asfor Rocha).
"RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. NÃO
CONFIGURAÇÃO. A mera contrariedade ou aborrecimento cotidiano não dão ensejo ao
dano moral. Recurso especial não conhecido" (Resp n. 592776/PB, Min. Cesar
Asfor Rocha).
Dessa
forma, não comprovado que o fato narrado teve a faculdade de efetivamente
causar danos morais à autora, não há que se falar em direito à indenização,
pois como já mencionado, não se pode chancelar a pretensão de se indenizar o
que representa tão-somente aborrecimentos e dissabores cotidianos.
In casu, é inegável o desgaste da empresa autora em razão do
evento noticiado, mas embora se trate de equívoco da fornecedora, não se pode
conferir danos morais aleatoriamente, visando tão-somente à punição. O incômodo
sofrido, diga-se mais uma vez, é inquestionável; contudo, isso por si só não dá
margem à indenização por danos morais.
Portanto, o
fato de a autora restar privada por curto espaço de tempo da possibilidade de
efetuar ligações não lhe trouxe nenhum prejuízo maior que, por si só, desse
ensejo ao propalado dano moral, mormente quando o próprio consumidor permanece
inadimplente por mais de 30 dias antes de efetuar o pagamento da fatura que
ensejou a suspensão do fornecimento do serviço.
Em situação
fática análoga ao caso em estudo, este Sodalício manifestou-se em acórdão da
relatoria do Desembargador Jânio Machado, que restou assim ementado:
"APELAÇÃO
CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CORTE NO ABASTECIMENTO DE ÁGUA.
INEXISTÊNCIA DE DÉBITO. HIDRÔMETRO LOCALIZADO ENTRE O ESTABELECIMENTO DA
REQUERENTE E OUTRA LOJA COMERCIAL. DIFICULDADE NA IDENTIFICAÇÃO DA UNIDADE
COMERCIAL QUE DEVERIA TER O FORNECIMENTO DE ÁGUA INTERROMPIDO. EQUÍVOCO DA
AUTARQUIA MUNICIPAL PLENAMENTE JUSTIFICÁVEL E QUE FOI PRONTAMENTE SOLUCIONADO. INTERRUPÇÃO
DE TRÊS HORAS. MERO DISSABOR. NECESSIDADE DE O JUDICIÁRIO BEM AQUILATAR OS
CASOS SUBMETIDOS À SUA APRECIAÇÃO, EVITANDO A PROPAGAÇÃO DE 'DEMANDAS FRÍVOLAS'
(ANDERSON SCHREIBER) OU O SURGIMENTO DE "UM MUNDO DE NÃO-ME-TOQUES"
(FÁBIO COELHO ULHOA). DANO MORAL INEXISTENTE.
O indevido
corte no fornecimento de água por um pequeno período, de pronto corrigido pela
concessionária, por si só, é incapaz de justificar a imposição de condenação
por dano moral puro" (AC n. 2008.049776-4).
E, do
erudito voto prolatado, extrai-se, por relevante, o seguinte excerto:
"Acresça-se
que o fato de a autora necessitar de ajuda de vizinhos no fornecimento de água,
num curto período de tempo (quase três horas), no máximo poderia causar um
dissabor momentâneo, perfeitamente tolerável numa convivência em sociedade.
"A
respeito, Antônio Jeová Santos leciona:
"O
perfeito entendimento sobre a configuração do dano moral está, exatamente, no
verificar a magnitude, a grandeza do ato ilícito.
"(...)
"A
figura do homem médio, para ser joeirado daquele que tem uma suscetibilidade
exacerbada da pessoa normal, que não se agasta facilmente, há de ser buscada
nesse tema. Aquele mal, que infligido em decorrência da própria atividade que a
pessoa exerce, não pode ser considerado dano moral apto a ingressar no mundo
jurídico como a prática de um ilícito de dar azo à indenização.
"Um
funcionário que exerce as funções de caixa em supermercado, por exemplo, está
sujeito a deparar-se com pessoas insatisfeitas com o preço ou com a qualidade
do produto encontrado. É natural, embora reprovável, que essa pessoa procure
desabafar o seu descontentamento com o funcionário mais próximo e que passe
mais tempo ouvindo-a. Também não haverá dano moral.
"(...)
'O que se
quer afirmar é que existe um mínimo de incômodos, inconvenientes ou desgostos
que, pelo dever de convivência social, sobretudo nas grandes cidades, em que os
problemas fazem com que todos estejam mal-humorados, há um dever geral de
suportá-los.
"O
mero incômodo, o desconforto, o enfado decorrentes de alguma circunstância,
como exemplificamos aqui, e que o homem médio tem de suportar em razão mesmo do
viver em sociedade, não servem para que sejam concedidas indenizações.
"O
dano moral somente ingressará no mundo jurídico, com a subseqüente obrigação de
indenizar, em havendo alguma grandeza no ato considerado ofensivo a direito
personalíssimo. Se o ato tido como gerador do dano extrapatrimonial
não possui virtualidade para lesionar sentimentos ou causar dor e padecimento
íntimo, não existiu o dano moral passível de ressarcimento. (Grifado no
original) (SANTOS, Antônio Jeová. Dano moral indenizável. 4. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2003, p. 112-113).
"O
tribunal, aliás, deve estar atento ao que Anderson Schreiber
denomina de "demandas frívolas", a situação aqui bem caracterizada:
"Paralelamente
à adoção do método da ponderação, que confia ao Poder Judiciário, embora sempre
à luz do dado normativo, a seleção de interesses merecedores de tutela em
concreto, outros instrumentos institucionais podem ser empregados no
desestímulo às demandas frívolas que tanto afligem a comunidade jurídica diante
da expansão do dano ressarcível. Neste sentido,
assume especial papel o desenvolvimento de meios não pecuniários de reparação,
capazes de atenuar a imensa contradição da responsabilidade civil contemporânea, que
reconhece o caráter extrapatrimonial do dano, mas lhe
reserva um remédio exclusivamente monetário. É neste remédio, note-se, e não na
reparação em si, que reside o maior incentivo às ações que se costuma
identificar como produtos da chamada 'indústria do dano moral'. Desta forma, o
recurso às retratações públicas e a outros meios de reparação extrapatrimonial, paralelos ou mesmo substitutivos à
indenização em dinheiro, mostra-se absolutamente necessário e, muitas vezes,
mais eficiente na reparação dos danos de natureza moral. A efetiva repressão à
litigância de má-fé e a rejeição do caráter punitivo das reparações são outros
mecanismos institucionais que se oferecem prontamente a esta tarefa de desincentivo,
a demandas de finalidade mercenária. (SCHREIBER, Anderson. Novos paradigmas
da responsabilidade civil: da erosão dos
filtros da reparação à diluição dos danos. São Paulo: Atlas, 2007, p.
242-243).
"É do
Judiciário o dever de bem aquilatar a presença de um dano moral indenizável, de
modo a que não se estimule o nascimento de uma sociedade de "não me
toques", na feliz expressão de Fábio Ulhoa:
"Também
deve ficar atento o magistrado para não cair ingenuamente nas artimanhas da
indústria da vitimização. Há os que, diante da chance
de se envolverem em situações embaraçosas, propositadamente não reagem a tempo
de desfazer o mal-entendido, com o objetivo de enriquecer com os danos morais.
A hipótese de simulação da dor nunca pode ser descartada, principalmente
quando o evento não importou danos à vida ou integridade física do prejudicado.
Em todos os casos, porém, o juiz não pode contentar-se com a simples alegação
do demandante. Se os fatos e circunstâncias constantes dos autos não sugerem o
experimento de profunda dor, não deve impor ao demandado a indenização moral.
(...)
"Dois
desvirtuamentos podem comprometer o instituto dos danos morais: a banalização
da dor e a elevação dos valores da indenização. Se dissabores forem
considerados indenizáveis e o valor dos danos morais for utilizado como medida
de desestímulo quando o acidente é inevitável, estaremos criando um mundo de não-me toques que não interessa à sociedade e à economia. (Curso
de direito civil. São Paulo: Saraiva, 2004, v. 2, p. 431)".
Admitir-se
a indenização de meros incômodos propiciaria a instauração de situação
insustentável para toda sociedade, em que o mais ínfimo dissabor passaria a ser
desejado pela vítima, pois traria satisfação pecuniária acima do transtorno
suportado.
Nesse
sentido, colhe-se precedente desta Corte de Justiça, da lavra do Desembargador
Newton Trisotto:
"RESPONSABILIDADE CIVIL - TÍTULO - PROTESTO
INDEVIDO - DANOS MORAIS NÃO CARACTERIZADOS - MUNICÍPIO - RECURSO DESPROVIDO
"'O
dano moral caracteriza-se sempre que houver "ofensas à honra, ao decoro, à
paz interior de cada um, às crenças íntimas, aos sentimentos afetivos de
qualquer espécie, à liberdade, à vida e à integridade corporal" (Wilson de
Melo Silva). Porém, "propugnar pela mais ampla ressarcibilidade
do dano moral não implica no reconhecimento que todo e qualquer melindre, toda
suscetibilidade exacerbada, toda exaltação do amor-próprio pretensamente
ferido, a mais suave sombra, o mais ligeiro roçar das asas de uma borboleta,
mimos, escrúpulos, delicadezas excessivas, ilusões insignificantes desfeitas,
possibilitem sejam extraídas da caixa de Pandora do direito, centenas de
milhares de cruzeiros' (Antônio Chaves)". (AC n. 2002.020689-5, Des.
Newton Trisotto)".
Em
conclusão, na linha dos precedentes antes colacionados, o inadimplemento
contratual, na ausência de fato específico que cause abalo moral, em regra
somente gera o dever de indenização dos danos materiais.
4 Ante o
exposto, dou provimento ao recurso da ré para o fim de reformar a sentença e
julgar improcedente o pedido de indenização por dano moral. Condeno a autora ao
pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais, com base
no art. 20, § 4º, do Código de Processo Civil, estabeleço em R$ 465,00
(quatrocentos e sessenta e cinco reais). Prejudicado o recurso da demandante.
DECISÃO
Nos termos
do voto do relator, por votação unânime, deram provimento ao recurso da ré para
reformar a sentença e julgar improcedente o pedido inicial. Prejudicado o
recurso da autora.
Participaram
do julgamento, realizado no dia 28 de julho de 2009, os Excelentíssimos
Senhores Desembargador Luiz Cézar Medeiros,
Desembargador Rui Fortes e Desembargadora Sônia Maria Schmitz.
Florianópolis,
30 de julho de 2009.
Luiz Cézar
Medeiros
RELATOR