RESCISÃO DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA
EMENTA: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL- APELAÇÃO- AÇÃO DE REIVINDICAÇÃO-
NULIDADE PROCESSUAL- NÃO VERIFICAÇÃO- COISA JULGADA- INOCORRÊNCIA- PROPRIEDADE,
POSSE INJUSTA E INDIVIDUALIZAÇÃO DO IMÓVEL- PRESENÇA- PEDIDO DE REIVINDICAÇÃO
PROCEDENTE- MANUTENÇÃO DA SENTENÇA- RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.-Se ao
tempo da formação da relação processual a sociedade conjugal existente entre os
componentes do pólo passivo da lide já havia se dissolvido pela morte do réu,
desnecessária afigura-se, diante da ausência de sua citação, a suspensão do
processo para que dele venham participar os herdeiros do de cujus.-A decisão
prolatada em embargos de terceiro opostos contra ação de rescisão de contrato
de compra e venda, que manteve os embargantes na posse
do imóvel porque de boa-fé, não faz coisa julgada capaz de impedir a
reivindicação do imóvel pela proprietária.-Para o ajuizamento do pedido de
reivindicação hão de restarem configuradas a prova do domínio da coisa, a prova
de que o réu a possua ou a detenha injustamente e a identificação
individualizada da coisa pretendida. Presentes todos os requisitos, deve ser
deferida a reivindicação.-Recurso conhecido e não provido.
APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0518.07.112004-3/001 (
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 17ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de
Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na
conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de
votos,
Belo Horizonte, 09 de julho de 2009.
DESª. MÁRCIA DE PAOLI BALBINO - Relatora
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
A SRª. DESª. MÁRCIA DE PAOLI BALBINO:
VOTO
Aracy dos Santos ajuizou ação de reivindicação de imóvel contra
Márcia Camargo dos Santos e seu marido, Robson Ferreira dos Santos, alegando o
seguinte: que é proprietária do imóvel localizado no nº 16 da quadra 'P' do
loteamento Estância São José, na cidade de Poços de Caldas, conforme registro
cartorário; que em 14.03.2002, através de instrumento particular, prometeu a venda do imóvel para Luiz Fernando Firmino,
pelo preço de R$43.250,00; que o comprador não pagou o preço, motivando o
ajuizamento por ela de ação de rescisão de contrato, que foi julgada
procedente; que ao tentar reintegrar-se na posse do imóvel os réus embargaram como
terceiros, em razão de compromisso de compra e venda celebrado entre eles e Luiz Fernando Firmino, em 03.05.2002; que
os embargos de terceiro foram julgados improcedentes no 1º grau, mas em 2º grau
foi dado provimento ao recurso dos embargantes, mantendo-os na posse do imóvel;
que no acórdão constou que não houve o reconhecimento de direito real e que
permanecia aberta a via petitória; que a venda a non domino não concretiza o negócio nem transfere a
propriedade; que já ajuizou ação semelhante, mas dela desistiu. Requereu a
concessão da gratuidade judiciária e a procedência do pedido reivindicatório.
Juntou documentos e pediu prova testemunhal, documental e depoimento pessoal
dos réus.
O MM. Juiz concedeu a gratuidade judiciária em favor da autora (f.
27).
A ré Márcia Camargo contestou (f. 33/45), informando o falecimento
de seu marido, o segundo réu. Argüiu preliminar de coisa julgada, ao argumento
de que a pretensão da autora já foi solucionada em julgamento de embargos de
terceiro, no qual restou reconhecido que os ora requeridos são adquirentes de
boa-fé do imóvel, o que legitima a posse, e que a propriedade da autora não
pode ser oposta contra os ora requeridos. No mérito, pugnou pela improcedência
do pedido inicial, sob os seguintes argumentos: que em 14.03.2002 a autora
celebrou compromisso de compra e venda do imóvel objeto da lide com Luiz Fernando Firmino, no valor de
R$43.250,00, dos quais recebeu R$19.250,00 (R$13.250,00 à vista e 4 de 20
parcelas de R$1.500,00); que na ação de rescisão de contrato movida pela
autora, na qual os ora réus não foram parte, foi determinada a retenção pela
vendedora, a título de perdas e danos, de R$7.700,00 e naqueles autos foi
promovida a execução da ordem de reintegração de posse sem o devido depósito da
quantia remanescente recebida pela vendedora, conforme determinado na sentença;
que a autora pretende, por meio da presente ação, burlar a decisão dos embargos
de terceiro e da ação de rescisão contratual, para se apoderar do imóvel sem
devolver o valor recebido de Luiz Fernando; que em 03.05.2002 adquiriu,
juntamente com seu marido, o imóvel de Luiz Fernando pela quantia de
R$56.400,00, pagando R$50.000,00 na entrega do imóvel; que o vendedor estava em
dia com as parcelas devidas à ora autora naquela oportunidade, inexistindo
óbice à referida negociação; que pelas regras civilistas cabe a autora apenas
ação de perdas e danos contra Luiz Fernando; que não se trata de venda a non domino porque o vendedor estava
resguardado pelo compromisso de compra e venda celebrado com a autora; que sua posse é justa. Requereu a
condenação da autora por litigância de má-fé e a concessão da gratuidade
judiciária. Juntou documentos e pediu prova testemunhal, documental e
depoimento pessoal da autora.
A autora apresentou réplica à contestação às f. 77/82.
Intimadas as partes para especificação de provas (f. 88), ambas as
partes pediram prova documental (f. 90 e 91/92), mas também foi produzida prova
testemunhal (f. 103).
Na sentença (f. 107/114), o MM. Juiz deferiu a gratuidade judiciária
em favor dos réus, rejeitou a preliminar de coisa julgada argüida pela ré e,
após concluir pela presença dos requisitos do art.1.228 do NCC, julgou
procedente o pedido inicial.
Constou do dispositivo (f. 114):
"Isto posto, julgo procedente o pedido inicial, para condenar
os requeridos a entregar à autora o imóvel descrito na inicial, no prazo de 30
dias, sob pena de execução forçada.
Condeno os requeridos no pagamento das custas e despesas
processuais devidamente atualizadas, além de honorários de advogado que arbitro
em 20% sobre o valor da causa."
A ré Márcia Camargo apelou (f. 118/142), arguindo preliminar de
nulidade do processo por falta de citação dos sucessores do réu Robson, já
falecido, os quais atuarão na presente lide como litisconsórcio necessário,
alegando que eles sucederam o réu no direito de posse conferido pela decisão
prolatada nos autos dos embargos de terceiro. No mérito, ratificou as teses de
coisa julgada, de posse justa, de aquisição de boa-fé e de inoponibilidade da
propriedade da autora perante os réus. Pediu a reforma da sentença e a
condenação da autora por litigância de má-fé.
A autora contrarrazoou (f. 156/161), pugnando pelo não provimento
do recurso da ré.
É o relatório.
JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE:
Conheço do recurso da ré porque tempestivo e próprio, ressaltando
que ela está isenta do preparo por ser beneficiária da gratuidade judiciária,
conforme decisão de f. 109.
Anoto que também a autora está sob o pálio da gratuidade
judiciária, conforme decisão de f. 27.
PRELIMINARES:
a) NULIDADE DO PROCESSO:
A ré argüiu preliminar de nulidade do processo ao argumento de que
os sucessores do réu Robson deveriam ter sido citados para comporem o pólo
passivo da lide como litisconsortes necessários.
Tenho que não assiste razão à apelante.
Ao ser citada, a ré/apelante informou ao Oficial de Justiça que
seu marido, o réu Robson, tinha falecido em 23.10.2006, apresentando naquele
ato a respectiva certidão de óbito para conferência (f. 30).
A certidão de óbito do réu Robson não veio aos autos, mesmo diante
do requerimento da autora (f. 91). Contudo, deve-se ter o réu como morto porque
o Oficial de Justiça tem fé pública e certificou tal condição na certidão de
citação de f. 30.
Pois bem. O CPC determina que só haverá citação do litisconsórcio
necessário quando o mesmo sofrer os reflexos da sentença.
'Art. 47: Há litisconsórcio necessário quando, por disposição de
lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de
modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença
dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo.'
Quanto à citação do litisconsorte, leciona Humberto Theodoro
Júnior, in 'Curso de Direito Processual Civil', 41ª ed., Rio de
Janeiro:Forense, vol. I, p. 101 e 104:
"Normalmente, os sujeitos da relação processual são
singulares: um autor e um réu. Há, porém, casos em que ocorre a figura chamada
litisconsórcio, que vem a ser a hipótese em que uma das partes do processo se
compõe de várias pessoas. Os diversos litigantes, que se colocam do mesmo lado
da relação processual, chamam-se litisconsortes.(...)
Dispõe o art. 47 do CPC que nos casos de litisconsórcio necessário
'a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no
processo.'
Se o autor não requereu a citação dos litisconsortes necessários e
o processo tiver curso até a sentença final, esta não produzirá efeito nem 'em
relação aos que não participam do processo nem em relação aos que dele
participam.' Ocorrerá nulidade total do processo.
Ao juiz, todavia, cabe evitar que o processo se desenvolva
inutilmente. Por isso, deparando-se com caso da espécie, 'o juiz ordenará ao
autor que promova a citação de todos os litisconsortes necessários, dentro do
prazo que assinar, sob pena de declarar extinto o processo' (art. 47, parágrafo
único). (...)
O juiz não ordena de plano a expedição do mandado citatório dos
réus omitidos pelo autor. Só a este incumbe a escolha do sujeito passivo da
causa. O juiz apenas assina prazo ao autor para promover a citação daqueles que
considera como litisconsortes necessários à validade da relação processual. Se
o demandante não se dispuser a chamar os novos sujeitos passivos, não caberá ao
juiz outra solução que a de anular o processo, nos termos do art. 47.
É por isso que a lei prevê que o juiz, quando for o caso, apenas
determinará ao autor que 'promova a citação de todos os litisconsortes
necessários'. À parte é que caberá a diligência de requerer a citação e
fornecer ao juízo os dados reclamados para sua efetivação. Nisto consiste a
promoção da citação, de que trata a lei processual. Se o autor entender que não
deva promovê-la, o juiz decretará a extinção do processo, nos termos da parte
final do parágrafo único do art. 47.
Não terá, contudo, poder de inserir, de ofício, no pólo passivo da
relação processual, réu não nomeado pelo autor. A decisão que ordena a promoção
da citação de litisconsorte é de natureza interlocutória, desafiando, por isso,
recurso de agravo. A que extingue o processo por falta de citação de litisconsorte
necessário é sentença terminativa. Pode ser impugnada por apelação."
Em se tratando de ação reivindicatória, ação real, regra geral é a
exigência da citação de ambos os cônjuges, em litisconsórcio ativo ou passivo,
em atenção à disposição processual prevista no art. 10 do CPC.
"Art. 10. O cônjuge somente necessitará do consentimento do
outro para propor ações que versem sobre direitos reais imobiliários.
§ 1o Ambos os cônjuges serão necessariamente citados para as
ações:
I - que versem sobre direitos reais imobiliários;
II - resultantes de fatos que digam respeito a ambos os cônjuges
ou de atos praticados por eles;
III - fundadas em dívidas contraídas pelo marido a bem da família,
mas cuja execução tenha de recair sobre o produto do trabalho da mulher ou os
seus bens reservados;
IV - que tenham por objeto o reconhecimento, a constituição ou a
extinção de ônus sobre imóveis de um ou de ambos os cônjuges.
§ 2o Nas ações possessórias, a participação do cônjuge do autor ou
do réu somente é indispensável nos casos de composse ou de ato por ambos
praticados."
O art. 10 do CPC prevê o litisconsórcio passivo necessário e
legal, entre os cônjuges, em caso de ação reivindicatória.
No caso dos autos, a autora ajuizou a ação contra a apelante e seu
marido, em razão de ambos estarem na posse do imóvel objeto da lide.
Contudo, o réu Robson não foi citado por ter falecido antes da
propositura da ação, como informado na certidão de f. 30, impedindo a formação
da relação processual entre autora e o réu Robson. A esposa do réu Robson, a ré
Márcia, foi devida e regularmente citada.
A imposição legal de citação para este tipo de ação restringe-se
"aos cônjuges" e se há que falar em litisconsórcio, este, igualmente,
tão só aos mesmos se restringiria, em decorrência da lei.
O art. 10, § 1º, do CPC exige a citação de ambos os cônjuges para
as ações que versem sobre direitos reais imobiliários.
Trata-se de direito personalíssimo que pode ser argüido somente
pelo cônjuge preterido.
"Compete ao marido, e não a outrem, a argüição de falta de
consentimento marital" (RTJ 82/419); e à mulher, a de falta de outorga
uxória (RT 599/200)"
"A alegação de nulidade do processo por ausência de citação
de um dos cônjuges, quando obrigatória a participação de ambos, como nas causas
que envolvam direito real, somente pelo preterido poderá ser feita"
(RJTAMG 40/237) (apud Theotonio Negrão, "Código de Processo Civil e
Legislação Processual em Vigor, Saraiva, 31ª ed., pág. 104).
Logo, se já não havia sociedade conjugal pela morte do cônjuge
varão, quando do início da relação processual, não há falar em citação de
herdeiros, pois titular do direito de receber citação é exclusivamente o
cônjuge virago, sobrevivo, no caso a apelante.
Os cônjuges devem figurar como autores ou como réus nas ações que
versem sobre direitos reais imobiliários simplesmente porque a capacidade ativa
ou passiva de o cônjuge ser sujeito de relação processual está condicionada ao
consentimento do outro (art. 10 caput e § 1º, I do CPC).
Tanto que apenas o cônjuge preterido tem legitimidade para argüir
a nulidade.
Se ao tempo de formação da relação processual com a citação do
cônjuge virago já se havia dissolvido a sociedade conjugal pela morte do
cônjuge varão, a providência pretendida pela apelante se mostra desnecessária,
posto que somente a viúva tem legitimidade ad causam, sendo que o direito de
sucessores não se confunde com o de cônjuge.
Como não foi estabelecida a relação processual com o cônjuge da
apelante, o réu Robson, através do ato citatório, não há que se falar em sua
necessária substituição processual no feito pelos sucessores, no qual nunca foi
estabelecido como parte.
Por conseqüência, não há como também se invocar o disposto nos
arts. 43 e 265, I, do CPC, com a alegação de que os sucessores do réu Robson
deveriam ter sido chamados para integrar a lide em lugar daquele, pena de
ineficácia da relação jurídica.
Também a habilitação dos sucessores prevista no art. 1.055 do CPC
não se mostra necessária. A uma, porque o cônjuge varão, por ocasião da formação
da relação processual com a citação, já havia falecido, deixando de existir o
litisconsórcio; a duas, porque não se cuida de sucessão de interessados no
processo.
Ademais, a discussão e objeto da lide, por sua natureza, com
relação à parte passiva, envolveu apenas o exercício da posse do imóvel em
litígio, se justa ou injusta, e se já falecido o marido da apelante, antes
mesmo da citação, ele não mais exercia a posse, não se justificando a ação
contra si e contra tal ato já inexistente, antes do início da ação e do
processo. Apenas contra quem praticava o ato possessório, ou seja, a apelante,
se estabeleceu a lide, no intuito de possibilitar o contraditório sob a tese de
posse injusta argüida pela autora, detentora do domínio do imóvel.
Também, e pelos mesmos motivos, não há como se invocar o disposto
no art. 1.784 do NCC, ainda que não seja parte o Espólio e sequer se tenha
notícia de ter sido aberto inventário e constituído Espólio.
A proteção a que se destina a ação reivindicatória dirige-se, exclusivamente,
àqueles que estejam supostamente apossados do bem de forma injusta e apenas a
apelante se encontrava nessa situação, até porque não se herda o suposto
ilícito. Com efeito, o apontado art. 1.784 do NCC trata da aquisição, pelos
herdeiros, de direitos dominiais e possessórios puros, legais, e, jamais os
alegados como injustos.
Além disso, não se observa nenhum prejuízo processual com a
citação única da cônjuge supérstite, ora apelante, a qual foi dada oportunidade
ampla de defesa, cabendo a ela, em se tratando de ação reivindicatória, apenas
a comprovação de posse justa.
Portanto, inexistindo nulidade no processo, rejeito a preliminar
argüida pela apelante.
b) COISA JULGADA:
A apelante argüiu preliminar de coisa julgada, ao argumento de que
restou definida como justa sua posse no imóvel, no julgamento dos embargos de
terceiros opostos por ela incidentalmente à ação de rescisão de contrato de compra e venda movida pela autora contra Luiz Firmino.
Tenho que também neste ponto não assiste razão à apelante.
Há coisa julgada material quando a sentença, que julgou total ou
parcialmente a lide, torna-se imutável e indiscutível, e não mais está sujeita
a recurso ordinário ou extraordinário, conforme art. 467 do CPC.
"Art. 467. Denomina-se coisa julgada material a eficácia, que
torna imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a recurso ordinário
ou extraordinário."
É o que ensina a doutrina:
1)"O Código, no art. 467, limitou-se a definir a coisa
julgada material, afirmando que: 'denomina-se coisa julgada material a
eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a
recurso ordinário ou extraordinário.' (...)
Imutável a decisão, dentro do processo esgota-se a função
jurisdicional. O Estado, pelo seu órgão judiciário, faz a entrega da prestação
jurisdicional a que estava obrigado.
Mas a imutabilidade, que impede o juiz de proferir novo julgamento
no processo, para as partes tem reflexos, também, fora do processo,
impedindo-as de virem a renovar a discussão da lide em outros processos. Para
os litigantes sujeitos às res iudicatta, o comando emergente da sentença se
reflete, também, fora do processo em que foi proferida, pela imutabilidade dos
seus efeitos.
A partir do trânsito em julgado material, a sentença que julgar
total ou parcialmente a lide tem força de lei nos limites da lei e das questões
decididas. (...)
No sistema do Código, a coisa julgada material só diz respeito ao
julgamento da lide, de maneira que não ocorre quando a sentença é apenas
terminativa (não incide sobre o mérito da causa). Assim, não transitam em
julgado, materialmente, as sentenças que anulam o processo e as que decretam
sua extinção, sem cogitar da procedência ou improcedência da ação. Tais
decisórios geram apenas coisa julgada formal. Seu efeito se faz sentir apenas
nos limites do processo. Não solucionam o conflito de interesses estabelecidos
entre as partes, e, por isso, não impedem que a lide volte a se posta em juízo
em nova relação processual. (Humberto Theodoro Júnior, Curso de Direito
Processual Civil, 41ª ed.,Rio de Janeiro:Forense, v.I, 2004, p.482/483).
2)"Embora exclusivamente o preceito contido na sentença de
mérito fique imunizado pela autoridade do julgado, sendo ele uma resposta do
juiz ao petitum contido na demanda, vale-se a lei dos demais elementos
constitutivos desta com o objetivo de determinar o alcance dessa imunidade.
Proclama o art. 468 do CPC, valendo-se de formosa definição proposta por
Carnelutti: a sentença que julgar total ou imparcialmente a lide tem força de lei
nos limites da lide e das questões decididas. A locução força de lei significa
precisamente coisa julgada, sendo esse o modo como o instituto é designado em
língua alemã. A lide, na linguagem do Código, é a pretensão trazida a
julgamento, ou mérito. Questões são pontos duvidosos de fato ou de direito.
Além disso, os §§ 1º e 2º do art. 301concorrem para dar os contornos subjetivos
e objetivos da coisa julgada material, ao dizerem que uma demanda se considera
reedição de outra quando tiver os mesmos elementos constitutivos, a saber,
mesmas partes, mesmo pedido, mesma causa de pedir." (Cândido Rangel
Dinamarco, in 'Instituições de Direito Processual Civil', vol. III, 4ª ed.
Malheiros:São Paulo, 2004, p. 315).
3)"A coisa julgada consiste no fenômeno de natureza
processual pelo qual se torna firme e imutável a parte decisória da sentença,
que deve guardar relação de simetria com o pedido que se tenha formulado na
petição inicial. Decorre do princípio da segurança jurídica, em razão de que,
num determinado momento (pelo decurso de um prazo ou pelo exaurimento dos meios
de impugnação das decisões judiciais), o comando existente na sentença adquire
solidez (...) Trata-se de pressuposto processual negativo que, pois, também
impede a repropositura de nova ação a respeito da mesma causa de pedir, com o
mesmo pedido, entre as mesmas partes. Presentes os pressupostos processuais
negativos, existe impedimento para a repropositura da ação, apesar de seu
acolhimento gerar uma sentença meramemte processual ou terminativa, conforme
determina o art. 268 do CPC combinado com o art. 267, inciso V" (Luiz
Rodrigues Wambier, Flávio Renato Correia de Almeida e Eduardo Talamini, Curso
Avançado de Processo Civil, Teoria Geral do Processo e Processo de
Conhecimento, vol. 1, 3ª ed., revista e atualizada, Ed. Revista dos Tribunais,
p. 213).
4)"Coisa julgada material ('auctoritas judicatae') é a
qualidade que torna imutável e indiscutível o comando que emerge da parte
dispositiva da sentença de mérito não mais sujeita a recurso ordinário ou
extraordinário. A lei não pode modificar a coisa julgada material. Somente a
lide (pedido) é acobertada pela coisa julgada material, que a torna imutável e
indiscutível, tanto no processo em que foi proferida a sentença, quanto em
processo futuro. Somente as sentenças de mérito, proferidas com fundamento no
CPC 269, são acobertadas pela autoridade da coisa julgada; as de extinção do
processo sem julgamento do mérito (CPC 267) são atingidas apenas pela preclusão
(coisa julgada formal)" (Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery
Código de Processo Civil Comentado e Legislação Processual Civil Extravagante
em Vigor, RT., 3ª ed., p. 676).
Pela simples leitura da doutrina supratranscrita, verifica-se que
há coisa julgada apenas nos casos em que há reedição do pedido já julgado.
Nesse sentido:
1)"AGRAVO REGIMENTAL
I-Uma ação é idêntica à outra quando possui as mesmas partes, a
mesma causa de pedir e o mesmo pedido (art. 301, § 2º, do CPC). Distinto, na
segunda demanda, o pedido, não há falar em coisa julgada (precedente: AgRg no
Ag 905.141/SE, 5ª Turma, Rel Min.
Arnaldo Esteves Lima, DJU de 07/02/2008).
II-(...)" (AgRg no REsp 1072844/SE, 5ª Turma/STJ, rel. Min. Felix Fischer, j. 17.03.2009,
DJ. 13.04.2009).
2)"PROCESSO CIVIL E TRIBUTÁRIO. ICMS. EFICÁCIA DA COISA
JULGADA
1. (...)
3. Deveras, integram a res judicata, uma vez que atuam como
delimitadores do conteúdo e da extensão da parte dispositiva da sentença. Dessa
forma, enquanto perdurar a situação fático-jurídica descrita na causa de pedir,
aquele comando normativo emanado na sentença, desde que esta transite em
julgado, continuará sendo aplicado, protraindo-se no tempo, salvo a
superveniência de outra norma em sentido diverso.
"(...) a solução exata estaria em distinguir, em cada caso
julgado, entre as decisões que tenham pronunciado sobre os elementos
permanentes e imutáveis da relação jurídica, como a constitucionalidade ou
inconstitucionalidade do tributo, a sua incidência ou não-incidência na
hipótese materialmente considerada, a existência ou inexistência de isenção
legal ou contratual e o seu alcance, a vigência da lei tributária substantiva
ou a sua revogação, etc. - e as que se tenham pronunciado sobre elementos
temporários ou mutáveis da relação jurídica, como a avaliação de bens, as
condições personalíssimas do contribuinte em seus reflexos tributários, e
outras da mesma natureza; à coisa julgada das decisões do primeiro tipo há que
se atribuir uma eficácia permanente; e às segundas, uma eficácia circunscrita
ao caso específico em que foram proferidas."
5. Os limites da coisa julgada, sob esse enfoque, devem ser
compreendidos sempre em relação ao objeto do processo - causa de pedir e pedido
- que, fundando-se em elementos permanentes e imutáveis da relação jurídica de
direito tributário material, faz com que a autoridade dos efeitos da coisa
julgada seja estendida aos eventos vindouros, perdurando no tempo enquanto se
mantiverem inalterados o direito e o suporte fático sobre os quais foi
estabelecido o juízo de certeza.
6. (...)" (REsp 875.635/MG, 1ª Turma/STJ, rel. Min. Luiz Fux,
j. 16.10.2008, DJ. 03.11.2008). (grifei)
3)"AÇÃO CIVIL PÚBLICA - EXISTÊNCIA DE ABSOLVIÇÃO PELA JUSTIÇA
ELEITORAL - ALEGAÇÃO DE EXISTÊNCIA DE COISA JULGADA - FALTA DE IDENTIDADE DE
PEDIDO E DE CAUSA DE PEDIR - NÃO-OCORRÊNCIA - PRECEDENTES.
1. Para ocorrência da coisa julgada, é necessária a conjugação de
três elementos: partes idênticas, mesma causa de pedir e mesmo pedido.
(...)
4. Não há entre as ações identidade de pedido nem causa de pedir;
inexistindo, por conseguinte, violação da coisa julgada.
(...)" (AgRg no Ag 495.344/SP, 2ª Turma/STJ, rel. Min.
Humberto Martins, j. 23.09.2008, DJ. 06.11.2008).
No sistema processual brasileiro, como regra geral, somente se
admite a existência de coisa julgada quando todos os elementos (partes, causa
de pedir e pedido) das demandas coincidem. Contudo, existem casos nos quais a
chamada 'teoria das três identidades' mostra-se insatisfatória para se
averiguar a existência de coisa julgada como impedimento para apreciação do
mérito de certa demanda. Em tais situações, deve-se aplicar a 'teoria da
identidade da relação jurídica', segundo a qual o novo processo deve ser
extinto quando a relação de direito material for idêntica à que se deduziu no
processo anterior, mesmo que se verifique diferença em relação a alguns dos
elementos identificadores da demanda.
No caso em questão, não há se falar em coisa julgada.
Constou do julgamento dos embargos de terceiro opostos pela ora
apelante em face da ação de rescisão de contrato ajuizada pela ora
autora/apelada contra Luiz Fernando Firmino, datado de 02.09.2005 (f. 46/49):
"Cuida-se de apelação interposta contra a r. sentença de f.
62-68, que, nos autos dos embargos de terceiro ajuizados por Márcia Camargo dos
Santos e outro em desfavor de Aracy dos Santos, rejeitou os embargos e revogou
a liminar, ao argumento de que "a posse do imóvel decorrente de um direito
obrigacional, e não de direito real, não prevalece em relação ao direito de
quem possui o domínio da coisa, facultado ao interessado buscar as medidas
judiciais cabíveis em relação a quem descumpriu com a obrigação
contratual".
(...)
Irresignados, apelaram os embargantes (...)
Revelam os autos a existência de um "Contrato Particular de Compromisso de Compra e Venda" (f. 6, verso), firmado em 3/5/02, onde consta como vendedor
Luiz Fernando Firmino, e como adquirentes Márcia Camargo dos Santos e Robson
Ferreira dos Santos, de um imóvel descrito (...)
Foi deferido o pedido liminar de manutenção de posse dos ora
embargantes, conforme decisão de f. 24-25, entendendo o Magistrado de plantão
forense, na oportunidade que (f. 24):
"Considerando a comprovação documental do que se alegou, o
que leva à certeza de estarem os embargantes de boa-fé na posse do imóvel,
deveria a embargada, quando ajuizou a ação rescisória (sic!) do contrato de compra e venda do imóvel, ter tido o cuidado de apurar a verdadeira situação em
que ele se encontrava, no que tange à sua ocupação, para, assim, incluir na
lide os atuais detentores da posse, ou seja, os requerentes".
De fato, a posse dos embargantes encontra-se comprovada nos autos,
sobretudo ao se analisar os documentos de f. 16-17, pelo "auto de
manutenção de posse" de f. 39, e ainda, pelos depoimentos de f. 60-61.
Não há que se confundir a questão possessória, que ora se analisa,
com a propriedade do imóvel em referência, haja vista que o art. 1.046 do
Código de Processo Civil trata da proteção da posse, determinando:
"Quem, não sendo parte do processo, sofrer turbação ou
esbulho na posse de seus bens por ato de apreensão judicial, em casos como o de
penhora, depósito, arresto, seqüestro, alienação judicial, arrecadação,
arrolamento, inventário, partilha, poderá requerer-lhe sejam manutenidos ou
restituídos por meio de embargos".
Segundo dicção expressa no artigo 1.046 do Código de Processo
Civil, os embargos de terceiro constituem ação que dispõe aquele que não é
parte no processo, para defender bens dos quais seja proprietário e possuidor
ou apenas possuidor, apreendidos por ato judicial, elucidando Humberto Theodoro
Júnior, ao comentar esse preceito legal, que:
(...)
In hipothesi, não sendo os recorrentes parte na ação de rescisão
contratual cumulada com perdas e danos e imissão de posse que a embargada moveu
contra Luiz Fernando Firmino (autos em apenso), ajuizaram os presentes embargos
de terceiro, alegando ser os legítimos possuidores do imóvel naquela ação
discutido, sendo certo que tal bem foi objeto do mencionado "contrato
particular de compromisso de compra e venda" firmado pelos embargantes com Luiz Fernando Firmino, às f.
6.
Subtrai-se desse contexto que restou demonstrada a qualidade de
terceiro por parte dos embargantes e de serem os legítimos adquirentes e
possuidores do imóvel em comento.
Anota-se que há permissibilidade jurídica em se mover embargos de
terceiros com base em contrato particular de promessa de compra e venda não registrado na circunscrição imobiliária, conforme tem
manifestado, reiteradamente, o Superior Tribunal de Justiça, encontrando,
inclusive, a matéria sumulada por esse Sodalício, sob o verbete nº 84,
exigindo-se, no entanto, a presença de alguns requisitos para a idoneidade da
incidental, como a prova da posse e a quitação do preço estipulado no pacto,
exigências estas que se encontram consubstanciadas na presente hipótese, sendo
relevante transcrever decisão da referida Corte, verbis:
(...)
Na hipótese, consoante explicitado, os apelantes são detentores de
contrato de promessa de compra e venda do imóvel mencionado à f. 6, havendo prova do pagamento do preço
ajustado, com a transferência do bem de fls. 10/11, bem como do exercício da
posse pelos mesmos, do que se conclui que a situação de direito dos embargantes
merece ser resguardada pelo Judiciário.
Nesse sentido fluem as decisões pretorianas:
(...)
A compra e venda de imóvel, como cediço, é contrato que não transfere ao
promissário comprador o domínio da coisa, que se aperfeiçoa com a transcrição
no registro imobiliário competente. Trata-se de contrato donde defluem
obrigações recíprocas para cada uma das partes, para o vendedor a obrigação de
transferir o domínio da coisa; para o comprador a de entregar o preço.
Note-se, pois, que os efeitos do contrato são meramente
obrigacionais, e não reais, porquanto, de acordo com o sistema adotado pelo
direito pátrio, a compra e venda não transfere, por si só, o domínio da coisa vendida, mas gera
apenas, para o vendedor, a obrigação de transferi-lo.
Dentre os elementos do contrato de compra e venda tem-se o consentimento. De fato, o consentimento deve recair
sobre o objeto e sobre o preço, com a deliberação de alcançar o resultado que o
contrato oferece, ou seja; a aquisição da coisa e a transferência do preço.
A coisa é outro elemento básico do negócio. Em princípio, podem
ser objeto de compra e venda todas as coisas que não estejam fora do comércio, sendo que, em
tese, a venda de coisa
alheia é nula, pois ninguém pode alienar o que não é seu.
Tratando da espécie, ou seja, da venda de coisa alheia, preleciona Orlando Gomes, verbis:
"Parece absurda a venda de coisa alheia, pois, intuitivamente, a coisa vendida deve
pertencer ao vendedor. Uma vez, porém, que pelo contrato, o vendedor se obriga,
tão-só, a transferir a propriedade da coisa, nada obsta que efetue a venda de bem que ainda não lhe pertence;
consegue adquiri-lo para fazer a entrega prometida, cumprirá especificamente a
obrigação; caso contrário a venda resolve-se em perdas e danos. A venda de coisa alheia não é nula, nem anulável, mas simplesmente
ineficaz" (Contratos, 17. ed., Rio de Janeiro, Forense, 1997, p. 228)
(grifo nosso).
A par da controvérsia acerca da nulidade ou ineficácia, é
possível, no entanto, que a venda de coisa alheia se efetue e o vendedor venha, depois e antes que
o comprador sofra a evicção, a se tornar proprietário da mesma. Não há razão
para que a venda primitiva não adquira o ônus de validade.
Dessa forma, o que se discute nos presentes embargos de terceiro
não é o direito de propriedade, mas a perda da posse do imóvel em razão de
decisão em processo do qual os embargantes não fizeram parte, razão pela qual,
não se pode manter a decisão monocrática que às fls. 67 determinou que:
"a posse de um imóvel decorrente de um direito obrigacional,
não de direito real, não prevalece ao direito de quem possui o domínio da
coisa, facultado ao interessado de buscar as medidas judiciais cabíveis com a
relação a quem descumpriu com a obrigação contratual" (grifos).
Ora, não há dúvidas de que os adquirentes firmaram o contrato de compra e venda na certeza de que estariam pagando determinado valor pela
aquisição do imóvel residencial ali descrito, sendo que a posse é mera situação
de fato, e ela é que está sendo defendida nessa demanda de embargos de
terceiro, não se confundindo com o domínio, além do que a má-fé no direito
brasileiro tem que ser cabalmente comprovada, o que não ocorreu na espécie.
Em excelente doutrina acerca do tema, Sílvio de Salvo Venosa
leciona:
"As constantes referências à posse na lei processual não
deixam dúvidas de que a medida pode ter cunho exclusivamente possessório"
(Direito Civil - Direitos Reais, 4. ed., Atlas, 04ª edição, 2004, p.161) -
grifos
E prossegue o tratadista:
"Decidindo a lide em esfera de posse, a sentença dos embargos
não reconhece direito real. Destarte, nessa hipótese, permanece aberta a via petitória.
Miguel Maria de Serpa Lopes (1964, v. 6:212) comenta:
'Os embargos de terceiro senhor ou possuidor apresentam aspecto
bizarro: pode pertencer à categoria dos remédios petitórios, se cogita
exclusivamente de domínio; misto, se do domínio e da posse conjuntamente; ou
puramente possessório, se nele apenas se cuidou da posse que se acusa turbada
pela medida judicial'. " (ob. Cit., p. 163)
Novamente, a posição do Colendo STJ:
(...)
Razões pelas quais, dou provimento ao recurso, reformando a
decisão de primeiro grau, para acolher os embargos de terceiro, mantendo a
liminar inicialmente deferida. Condeno a embargada ao pagamento das custas
processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em 15% do valor atribuído à
causa, suspensa a exigibilidade nos termos do art. 12º da Lei n. 1.060/50.
Custas recursais, pela recorrida." (grifei)
Naquela lide o que se discutia era a propriedade do imóvel em
razão de descumprimento de contrato de promessa de compra e venda celebrado entre Aracy e Luiz Fernando, e o pedido feito pela
autora era o de devolução do domínio. A embargante, ora apelante, foi mantida
na posse do imóvel porque de boa-fé, posto que adquiriu imóvel de Luiz Fernando
acreditando que o bem a ele pertencia.
Já na presente reivindicatória Aracy, ora autora/apelada, pretende
a devolução da posse do imóvel, cuja propriedade não está mais em discussão.
Logo, mesmo se observada a 'teoria da identidade da relação
jurídica' não há se falar em coisa julgada em relação à posse da apelante,
conquanto a posse tenha sido reconhecida como de boa-fé no julgamento dos
embargos de terceiro, porque tal conclusão somente vincula o objeto daquela.
Rejeito, pois, a preliminar.
MÉRITO:
A ré apelou da sentença pela qual foi julgado procedente o pedido
da autora, de reivindicação do imóvel, ao argumento de que sua posse é justa e
de boa-fé e de que a propriedade da autora não lhe é oponível em razão da
decisão dos embargos de terceiro. Pediu a reforma da sentença e a condenação da
autora por litigância de má-fé.
Examinando tudo o que dos autos consta, tenho que não assiste
razão à apelante. Vejamos.
A ação reivindicatória é a ação do proprietário não possuidor,
contra o possuidor não proprietário. Ela está prevista no caput do art. 1.228
do NCC, que dispõe:
"Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e
dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente
a possua ou detenha.
(...)"
A ação reivindicatória é tratada da seguinte maneira pela
doutrina:
1)'Trata-se de uma ação de reivindicação, ação tutelar do domínio
(Sá Pereira, Da Propriedade, p. 23). Lafayette define a reivindicação: a ação
real que compete ao senhor da coisa para retomá-la do poder de terceiro que
injustamente a detém (Direito das Coisas, § 82). Fraga define-a como sendo a
ação real que compete ao proprietário pleno ou semipleno de uma coisa contra o
possuidor da mesma coisa para que lha restitua, com seus frutos, acessões e
indenização dos danos sofridos (Instituições do processo civil do Brasil, v. 1,
§ 22). E o clássico Corrêa Telles, no famoso livro Doutrina das Ações, ensina
que vindicar é tirar o que é nosso da mão de quem injustamente o possui.'
(Francisco Raitani, Prática de Processo Civil, 17ª ed., São Paulo:Saraiva, v.
I, 1990, p. 647).
2)"A faculdade de reivindicar é a prerrogativa do
proprietário de excluir a ingerência alheia injusta sobre coisa sua. É o poder
do proprietário de buscar a coisa em mãos alheias, para que possa usar, fruir e
dispor, desde que o possuidor ou detentor a conserve sem causa jurídica. É o
efeito dos princípios do absolutismo e da seqüela, que marcam os direitos
reais. A ação reivindicatória, espécie de ação petitória, com fundamento no jus
possidendi, é ajuizada pelo proprietário sem posse, contra o possuidor sem
propriedade. Irrelevante a posse anterior do proprietário, pois a ação se funda
no ius possidendi e não no ius possessionis; ou, em termos diversos, não no
direito de posse, mas no direito à posse, como efeito relação jurídica
preexistente.
(...)
Vale destacar que a expressão 'injustamente a possua' para efeito
reivindicatório, tem sentido mais abrangente do que para simples efeito
possessório. Nos termos do art. 1.200 do NCC, posse injusta, para efeito
possessório, é a marcada pelos vícios de origem da violência, clandestinidade e
precariedade. Já para efeito reivindicatório, posse injusta é aquela sem causa
jurídica a justificá-la, sem um título, uma razão que permita o possuidor
manter consigo a posse de coisa alheia. Em outras palavras, pode a posse não
padecer de vícios da violência, clandestinidade e precariedade e, ainda assim,
ser injusta para efeito reivindicatório. Basta que o possuidor não tenha um
título para sua posse. É por isso que não cabe a ação reivindicatória, entre
outros, contra o locatário, o comodatário, o credor pignoratício, o
devedor-fiduciante, o usufrutuário, pois na vigência dos aludidos negócios ou
direitos reais as posses diretas têm causas jurídicas que as justificam, ou
seja, não são injustas nem para efeito possessório, nem para efeito
petitório." (Francisco Eduardo Loureiro, Código Civil Comentado -
Coordenação Ministro Cezar Peluso, Barueri/SP:Manole, 2007, p. 1.044)
Nesse compasso, ensina Aluísio Santiago Júnior que:
"O jus reivindicandi tem explicação lógica no direito de ação
que a todo titular de direito material se concede (artigo 75 do Código Civil).
Se a lei assegura ao proprietário os direitos de usar e de fruir e havendo
lesões a estes direitos, há violação do direito de propriedade. Daí, nascer a
reivindicatória. Em outros termos, o direito de pedir judicialmente que a coisa
sob sua dominação jurídica que esteja com terceiros, imotivadamente, sob a
dominação fática deste, lhe seja entregue. Costuma-se dizer que é a ação do
proprietário não-possuidor contra o possuidor não-proprietário, desde que este
último tenha a posse sem causa jurídica eficiente". (Direito de
Propriedade - Aspectos Didáticos - Doutrina e Jurisprudência, p. 26-27).
Segundo a célebre definição de Lafayette, a reivindicatória
"é a ação real que compete ao senhor da coisa para retomá-la do poder de
terceiro que injustamente a detém". (Direito das Coisas, Edição Histórica,
Editora Rio, 1977, p. 190).
Dessa definição resultam as seguintes características que lhe são
próprias: a) é uma ação de natureza real, porque fundada no domínio; b)
objetiva a retomada da coisa que se acha em poder de terceiro, a qualquer
título.
Para a propositura da ação reivindicatória, há de restar
configurada a prova dos requisitos específicos, quais sejam, prova do domínio
da coisa, perfeita identificação individualizada da coisa pretendida e a prova
de que o réu a possua ou a detenha injustamente.
A autora comprovou ser proprietária do imóvel localizado no lote
16, quadra 'P' do loteamento conhecido como Estância São José, na cidade de
Poços de Caldas (f. 07/09).
O imóvel foi objeto de compromisso de compra e venda celebrado entre a autora e terceiro estranho à lide, Luiz
Fernando Firmino em 14.03.2002, cujo contrato foi rescindido em razão do
inadimplemento do comprador, por decisão judicial de 11.03.2003, transitada em
julgado (f. 18/21).
Como a apelada nada contratou com a apelante, a questão da
devolução de prestações pagas por Luiz Fernando deve ser resolvida entre
autora/apelada e o promissário comprador.
Já a restituição a que a autora foi condenada em ação anterior de
rescisão de contrato de promessa de compra e venda, a execução se faz naqueles próprios autos, pelo credor
interessado, não tendo a apelante direito de discutir tais questões na presente
lide, diante da vedação imposta pelo art. 6º do CPC.
"Art. 6o Ninguém poderá pleitear, em nome próprio, direito
alheio, salvo quando autorizado por lei."
O fato de a autora ter devolução a fazer ao promissário comprador
não retira dela o título de proprietária do imóvel objeto da lide.
Os dois primeiros requisitos - prova do domínio da coisa e
perfeita identificação individualizada da coisa pretendida -, portanto,
restaram comprovados nos autos.
Quanto ao último requisito, posse injusta da apelante sobre o
imóvel de propriedade da apelada, tenho que também restou demonstrado no
presente caso.
Pelo que consta dos autos, enquanto tramitava o compromisso de compra e venda celebrado entre a autora e Luiz Fernando, e antes de o comprador
adimplir totalmente o negócio, a apelante adquiriu de Luiz Fernando, por compromisso de compra e venda do imóvel, em 03.05.2002, conforme documento de f. 10.
Ora, a venda a non domino é aquela realizada por quem não tem poder de
disposição sobre a coisa. Com efeito, o que emerge como vício na venda a non domino é a completa falta de
legitimação do alienante, que consiste na inaptidão específica para o negócio
jurídico. Tal venda feita por aquele que não era dono do imóvel é inexistente.
Nesse sentido:
1)"Esta Corte tem deixado claro que a venda a non domino é ato inexistente, por
faltar-lhe o próprio objeto, e, também, que não é aplicável, no caso, a teoria
da aparência, que significaria subtrair o direito do verdadeiro proprietário,
que obrou de boa-fé." (Ap. 389102-5/Montes Claros, 5ª CCível/TAMG, Rel.
Juiz Marine da Cunha, 27/05/2003).
2)"CIVIL. VENDA A NON DOMINO.
Irrelevância da boa-fé dos adquirentes, posto que a venda foi feita em detrimento dos
proprietários do imóvel, vítimas de sórdida fraude. Recurso especial não
conhecido." (RESP 122.853/SP, 3ª Turma/STJ, Rel. Ministro Ari Pargendler,
d.j. 07/08/2000).
A venda feita por Luiz Fernando à apelante não tem qualquer validade
porque antes de ter a coisa como sua, na forma da lei, o transmitente não
transfere direitos que não possui, como prevê o art. 1.268 do NCC:
"Art. 1.268. Feita por quem não seja proprietário, a tradição
não aliena a propriedade, exceto se a coisa, oferecida ao público, em leilão ou
estabelecimento comercial, for transferida em circunstâncias tais que, ao
adquirente de boa-fé, como a qualquer pessoa, o alienante se afigurar dono.
§ 1o Se o adquirente estiver de boa-fé e o alienante adquirir
depois a propriedade, considera-se realizada a transferência desde o momento em
que ocorreu a tradição.
§ 2o Não transfere a propriedade a tradição, quando tiver por
título um negócio jurídico nulo."
É o que ensina Caio Mário da Silva Pereira:
"Tradição é um ato de entrega da coisa ao adquirente,
transformando a declaração translatícia de vontade em direito real.
Na integração jurídica da tradição, há que partir de um primeiro
pressuposto: uma vez que opera a transferência de domínio da coisa, necessita
da capacidade do tradens e a sua titularidade em relação a ela. (...) Se o
tradens não for o proprietário da coisa, a tradição não produz a conseqüência
jurídica da transferência do domínio. (...) Em segundo lugar, a tradição, como
modo de aquisição de domínio, exige um acordo de vontades neste sentido: não
basta que o tradens entregue a coisa ao accipiens, mas é mister que o faça a
título de transferência, pois que não a transmite a tradição a título de
locação, de depósito, de penhor, etc." (in "Instituições de Direito
Civil - Direitos Reais", vol IV, 18ª ed., Forense:Rio de Janeiro, 2003, p.
170).
Assim, a apelante não pode ser considerada como proprietária do
imóvel, embora seja possuidora.
Luiz Fernando estava na posse do imóvel objeto da lide e a
transferiu à apelante. Contudo a posse não é justa, embora tenha sido
considerada de boa-fé, tal como reconhecido no julgamento dos embargos de
terceiro.
Sobre o tema leciona Tito Fulgêncio:
"O ponto de vista do legislador, na caracterização da boa ou
má-fé do possuidor, é a intenção, a consciência, a convicção deste: o critério
é a subjetividade, ao revés do que se dá com a delineação da justiça ou
injustiça da posse, em que se tem em consideração o elemento objetividade"
(Da posse e das ações possessórias, 4ª ed., Rio de Janeiro:Forense, v. I, p.
40).
Esse é o ponto relevante. Alguém pode não ter posse justa, sendo,
em conseqüência, vencido na reivindicatória e, não obstante, encontrar-se de
boa-fé, como é o caso da apelante. Os conceitos são distintos.
Logo, se a aquisição da apelante contém o vício da nulidade a non
domino, e como a apelada tem melhor direito e o registro, inegável que o
julgamento deve prestigiar o direito do dono.
Nesse sentido:
1)"CIVIL E PROCESSUAL - DISTINÇÃO ENTRE POSSE INJUSTA E POSSE
DE MA-FE - REIVINDICATORIA - MATERIA DE FATO.
I - SE DEMONSTRADA QUE A POSSE NÃO E DE MA-FE, EVENTUAL
IMPROCEDENCIA DE REIVINDICATORIA, NÃO AFASTA A INDENIZAÇÃO POR BENFEITORIAS OU
CONSTRUÇÕES. DISTINTOS SÃO OS CONCEITOS ENTRE POSSE INJUSTA E POSSE DE BOA-FE.
UM, DE CUNHO OBJETIVO. OUTRO, DE NATUREZA SUBJETIVA, AMBOS NÃO SERVEM AO ESCOPO
DAR AO ART. 524 CONSEQUENCIA QUE ESTE NÃO TEM.
II - RECURSO NÃO CONHECIDO." (REsp 47622/MG, 3ª Turma/STJ,
rel. Min. Waldemar Zveiter, j. 28.11.1994, DJ. 20.02.1995).
2)"POSSE - INJUSTA E DE MA-FE - DISTINÇÕES.
A JUSTIÇA OU INJUSTIÇA DA POSSE DETERMINA-SE COM BASE
É que o conceito de posse injusta, na ação reivindicatória, de
natureza dominial por excelência, não é o mesmo prevalente nos interditos
possessórios (artigo 1.200 do NCC). Se entendido de modo diverso, dificilmente
as ações reivindicatórias seriam julgadas procedentes, assim como trabalhoso
seria o reconhecimento do direito a indenização por eventuais construções
feitas pelo possuidor.
Como se sabe, a posse injusta, para os fins previstos na parte
final do art. 1.228 do Código Civil/2002, é aquela exercida por quem não seja
dono, independentemente de boa ou má-fé, diversamente daquela posse exigida nas
ações possessórias, configurada pela aquisição por vício de violência,
clandestinidade e precariedade.
É a lição do Professor Humberto Theodoro Júnior:
"...o conceito de posse injusta, para efeito de ação
reivindicatória, não é o mesmo que prevalece para os interditos possessórios.
No campo da tutela interdital qualquer posse merece proteção, desde que não
violenta, clandestina nem precária. No âmbito, porém, da ação dominial por
excelência, que é a reivindicatória, fundada no art. 524 do Código Civil,
injusta é qualquer posse que contrarie o domínio do autor..." (Propriedade
e Direitos Reais Limitados - Direitos Reais, v. II, Aide, p. 91).
Em outra obra sua, Humberto Theodoro Júnior leciona:
"Se o réu não tem título de domínio, nem qualquer outro que
justifique juridicamente sua detenção, sua posse é injusta e autoriza a
procedência da reivindicatória intentada por quem se apresenta como dono,
amparado pelo Registro Imobiliário.
(...)
A significação de posse injusta, na reivindicatória, é tomada em
sentido amplo, não tendo, necessariamente, que ser viciosa, bastando que seja
sem direito de possuir.
Mesmo de boa-fé a posse cede ao domínio. Injusto pois, é qualquer
detenção sem título de propriedade, ou sem o caráter de posse direta através
das vias adequadas.
(...)
Do confronto dos títulos do autor e do réu, na reivindicatória, é
que se poderá dizer qual o melhor, qual o válido, qual o eficaz. Com maior
razão há de caber ação reivindicatória contra quem dispõe de título anulado
pela justiça.
Vale enfatizar que quem tem título de domínio válido e eficaz tem
direito à posse (art. 524 do CC). Quem, a outro turno, está na posse de um bem,
sem título de domínio, tem posse injusta, pelo menos em face do titular do
domínio.
Com efeito, essa é a doutrina de pontes de Miranda (Tratado de
Direito Privado, ed. 1971, t. 14 § 1.572, nº 1), com respaldo da
jurisprudência.
"A significação de posse injusta, na reivindicatória, é
tomada em sentido amplo, não tendo, necessariamente, que ser viciosa, bastando
que seja sem direito de possuir." (TJPR, in RT 522/235).
(...) que para os efeitos da reivindicatória, o conceito de posse
injusta não se decalca, exatamente, no art. 489 do Código Civil, isto é, não se
infere apenas da violência, precariedade ou clandestinidade. O sentido de posse
injusta se torna aqui mais amplo, o que é facilmente perceptível
considerando-se que a posse de boa-fé pudesse excluir a reivindicatória, o
domínio estaria praticamente extinto diante do fato da posse. Mesmo de boa-fé a
posse cede ao domínio nessa ação específica de defesa dele. A detenção injusta
se há de entender, então, como detenção sem título de propriedade, ou sem o
caráter de posse direta através das vias adequadas." (Posse e Propriedade,
São Paulo:LEUD, 1985, p. 50 e 73/74)
Tal entendimento já está consolidado na jurisprudência deste
Tribunal:
1)"O importante na reivindicatória é a prova do domínio
indiscutível do reivindicante sobre o imóvel objeto da reivindicação. Entre o
confronto do domínio com a posse, vence aquele, desaparece esta,
independentemente de se cogitar da qualificação dela, se de boa ou de má-fé, se
justa ou injusta, em sentido estrito" (TJMG, Apelação Cível nº 81.187-2,
Jurisprudência Mineira, vol.108/265).
2)"APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO REIVINDICATÓRIA - REQUISITOS-
DOMÍNIO COMPROVADO - ACESSÕES - NATUREZA DA POSSE- INDENIZAÇÃO INDEVIDA.
A ação reivindicatória é de cunho petitório, assim deve o autor
provar a sua propriedade e a posse injusta do réu, uma vez que a demanda tem
como objetivo assegurar ao titular do domínio, o uso e gozo da coisa, nos
termos do art. 1228 do Código Civil. Tratando-se de ação reivindicatória,
considera-se injusta qualquer posse que contrarie o domínio do autor, posto que
o conceito de posse injusta, para efeito de ação reivindicatória, não é o mesmo
que prevalece para os interditos possessórios". (Apelação Cível n.
1.0433.03.093246-4/001, Rel. Des. Hilda Teixeira da Costa, j. 23.11.06).
3)"DIREITO CIVIL - AÇÃO REIVINDICATÓRIA - AQUISIÇÃO DA
PROPRIEDADE - NECESSIDADE DE TRANSCRIÇÃO DA ESCRITURA PÚBLICA NO REGISTRO DE
IMÓVEIS - COMPRA E VENDA DE IMÓVEL FEITA POR INSTRUMENTO PARTICULAR - EFEITOS MERAMENTE
OBRIGACIONAIS - POSSE INJUSTA - CONCEITO DO ART. 489 DO CC/1916 - CONEXÃO COM O
CONCEITO DO ART. 524 DO MESMO DIPLOMA - INEXISTÊNCIA - VENDA A NON DOMINO - NEGÓCIO INEXISTENTE
I - O sistema jurídico brasileiro adota a transcrição do
instrumento público no Registro como o modo válido para a aquisição da
propriedade imóvel.
II - A compra e venda de imóvel, feita por instrumento particular, não gera efeitos,
senão, obrigacionais.
III - O conceito de posse injusta, disposto no art. 489 do CC/1916
não guarda relação com advérbio "injustamente", contido no caput do
art. 524 do mesmo Código.
IV - Com exceção da posse ad usucapionem, somente aquela que se
exerce em razão de título apto a transferir a propriedade pode obstar a
reivindicação.
V - Aqueles que têm a posse de bem imóvel em razão de promessa de compra e venda realizada por meio de instrumento particular na qual figura como
promitente quem não era dono, não podem opô-la ao verus domino, posto que, em
relação a este, o referido negócio é inexistente.
VI - A defesa do réu na ação reivindicatória há de consistir na
comprovação de que o bem reivindicado lhe pertence, demonstrando, assim, que a
pretensão do reivindicante é infundada." (Apelação Cível n.º
2.0000.00.466096-6/000, Rel. Juiz Walter Pinto da Rocha, j. 25.02.05).
Também nesse sentido é a jurisprudência do STJ:
1)"CIVIL. REIVINDICATÓRIA. ANTERIOR CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. RESOLUÇÃO POR DECISÃO TRANSITADA
I - O proprietário tem o direito de usar, gozar e fruir a coisa e
ainda reavê-la de quem injustamente a possua, sendo que o conceito de
"posse justa" não guarda conexão com o definido no art. 489 do Código
Civil. Assim, afora a posse "ad usucapionem", em princípio, somente
aquele que exerce a posse por força de um título apto a transferir a
propriedade, como um contrato de promessa de compra e venda, é que poderia obstar o reconhecimento do direito do
proprietário.
II - O direito real de reivindicação, advindo da propriedade, não
pode sofrer abalos por descumprimento de obrigação, tendo em vista que tratam
eles de campos distintos, os quais não sofrem interferência na maioria das
vezes. Negar-se a utilização da reivindicatória seria jogar por terra todos os
efeitos decorrentes do direito real de propriedade" (REsp 115091/RS; 4ª
Turma, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 28.09.1998).
2)"A reivindicatória é ação real, que compete ao senhor da
coisa para havê-la do poder de terceiro que injustamente a detenha. Tem por
causa o domínio e se dirige ao possuidor atual, de boa ou má-fé, bastando à
legitimidade ativa que o autor se diga proprietário do bem." (RO 10/DF, 3ª
Turma/STJ, rel. Min. Castro Filho, j. 03.06.2003, DJ. 25.08.2003).
No caso, embora de boa-fé, a posse da apelante em relação à autora
é injusta porque a recorrente não é dona do imóvel objeto da lide, bastando tal
condição para a procedência do pedido inicial da presente ação, de natureza
petitória.
Assim sendo, presentes todos os requisitos exigidos pelo art.
1.228 do NCC, era mesmo o caso de se julgar procedente o pedido inicial, não
assistindo razão à ré em seu inconformismo.
Por fim, também não merece acatamento o pedido da apelante, de
condenação da apelada por litigância de má-fé, porque não configurada nenhuma
das hipóteses do art. 17 do CPC.
DISPOSITIVO:
Isso posto, rejeito as preliminares de nulidade do processo e de
coisa julgada e nego provimento à apelação.
Custas recursais, pela apelante, observada a Lei 1060/50.
Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): LUCAS
PEREIRA e IRMAR FERREIRA CAMPOS.
SÚMULA : REJEITARAM AS PRELIMINARES
E NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO.
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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS
APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0518.07.112004-3/001