ANULAÇÃO DE ATO JURÍDICO

 

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0541436-6 DA 2ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE MARINGÁ

APELANTE: SEBASTIÃO GERÔNIMO DE OLIVEIRA
APELADO: FAZENDA PÚBLICA DO MUNICÍPIO DE MARINGÁ E EVERALDO PEREIRA DA SILVA
RELATOR: DES. RUBENS OLIVEIRA FONTOURA
REVISOR: DES. IDEVAN LOPES

AÇÃO DE ANULAÇÃO DE ATO JURÍDICO - BEM ARREMATADO DUAS VEZES
EM PROCESSOS DIFERENTES - AMBOS ARREMATANTES DE BOA FÉ - PREFERÊNCIA DO QUE PRIMEIRO REGISTROU A CARTA DE ARREMATAÇÃO - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS MANTIDOS - BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA - RECURSO IMPROVIDO.
1 - "Havendo duas praças do mesmo bem, em processo distintos de execução, prevalece a carta de arrematação registrada em primeiro lugar." (Lex-JTA 141/57).
2 - O deferimento da justiça gratuita não impede a condenação no pagamento das verbas de sucumbência (Art. 12 da Lei nº 1.060/50).





VISTOS, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL Nº 541436-6, originária da 2ª Vara Cível da Comarca de MARINGÁ, em que é apelante SEBASTIÃO GERÔNIMO DE OLIVEIRA e Apelados FAZENDA PÚBLICA DO MUNICÍPIO DE MARINGÁ e EVERALDO PEREIRA DA SILVA.

01 - EXPOSIÇÃO:

Trata-se de Apelação Cível interposta contra sentença proferida nos autos nº 592/2006 de Ação de Anulação de Ato Jurídico, oriunda da 2ª Vara Cível da Comarca de Maringá opostos por SEBASTIÃO GERÔNIMO DE OLIVEIRA, em face da sentença de fls. 450/455, que julgou improcedente o pedido e condenou o autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais).

Em suas razões o apelante alega que restou provado que a primeira penhora realizada pela Fazenda Pública do Município de Maringá, não foi averbada junto ao CRI, e mesmo, assim, o MM. Juiz "a quo" em sua decisão que via de conseqüência a mesma tem o condão de invalidar a eventual arrematação que o Juiz da penhora posterior (no caso, a ocorrida nos autos da execução fiscal da União) tenha promovido.

Sustentou que Juiz de primeiro grau para indeferir o pedido, baseou-se no direito de preferência, em face da anterioridade da penhora, o que não se aplica ao caso em tela.

Ressaltou no caso, se trata de duplicidade de arrematação, cuja segunda penhora foi realizada nos autos de execução fiscal apresentada pela União, por isso o titulo de preferência da União deve ser conservado, por se estabelecer o concurso de credores.

Afirmou que conforme disposto no artigo 711 do CPC, a Fazenda, independentemente da penhora, prefere aos demais credores com penhora antecedente.

Salientou que tanto na penhora quanto no concurso de credores, a Fazenda Nacional tem prioridade, pelo que o apelante tem o direito de ver decretado a nulidade da segunda arrematação.

Argumentou que foi a Fazenda Municipal que provocou a duplicidade de arrematação, pois não registrou a penhora do bem e também não acostou aos autos a certidão atualizada do bem no CRI, pois a primeira certidão havia sido acostada nos autos no ano de 1993 e o bem somente foi arrematado em leilão no ano de 2004, ou seja mais de dez anos.

Pediu que seja reformada a sentença e intimado o segundo arrematante Everaldo Pereira da Silva, para que desocupe o imóvel.

Pugnou pela exclusão da condenação dos pagamentos das despesas processuais e honorários advocatícios.

Requereu ao final, a reforma da decisão, condenando, os apelados nas custas processuais e honorários advocatícios de 20% do valor da causa e demais cominações de estilo.

Contrariando o recurso a Fazenda Pública do Município de Maringá às fls. 464/468 e Everaldo Pereira da Silva às fls. 470/476, pleitearam pelo improvimento do recurso, mantendo-se integralmente a sentença.

Em parecer o douto Procurador de Justiça, manifestou-se pelo conhecimento e improvimento. (fls. 487/491)

Distribuído os autos à Quarta Câmara Cível desta Corte.

Às fls. 494/496, por determinação da Desa. Lélia Samardã Giacomet, os autos foram remetidos para redistribuição.

O Procurador da Fazenda Nacional pediu as fls. 504/507, em sob alegação de flagrante violação à preferência da União no recebimento de seus créditos tributários, requereu a intimação da Fazenda Publica do Município de Maringá e a Caixa Econômica Federal para que depositem em juízo aos valores por eles recebidos na execução fiscal de nº 108/1993, e, posteriormente, a conversão de renda em favor da União ou seja remetido os autos ao Juízo de Direito da 2ª Vara Cível da Comarca de Maringá.

Destacou ainda, que concordará com o levantamento dos valores depositados em conta judicial vinculada aos autos de execução fiscal nº 2000.70.03.002789-7, em trâmite na Vara Federal de Execuções Ficais de Maringá, pelo apelante Sebastião Gerônimo de Oliveira, desde que ocorra a conversão em renda para união do valor obtido com a arrematação nos autos 108/93.

Determinada a manifestação das partes às fls. 520, somente o apelante Sebastião Gerônimo de Oliveira, postulou o acolhimento da pretensão da União constante da petição de fls. 504/515, pois além de impor a observância do direito de preferência do crédito tributário da Fazenda Nacional, também diminuirá o sofrimento e prejuízo causados ao apelante.

É o relatório.

02. VOTO:

Primeiramente, quanto ao requerimento do Procurador da Fazenda Nacional de fls. 504/507, neste, autos não importam em deferimento, isto porque, o limite da lide, consiste proceder à verificação da possibilidade da anulação da arrematação oriunda da execução fiscal de nº 108/1993. Todavia, não tem o condão de determinar em razão da suposta preferência de crédito da União, que a Fazenda Pública Municipal e a Caixa Econômica Federal depositem o valor da arrematação, para só então permitir o levantamento dos valores pelo ora postulante.

Com efeito, não se pode transferir ao arrematante o ônus de uma dupla arrematação para a qual não contribuiu, por isso, não pode a Fazenda Nacional, em ação movida pelo arrematante querer fazer valer o seu suposto direito de preferência.

Isto porque, a discussão no presente autos gira em torno da argumentação de nulidade de arrematação. Sendo que a questão relativa ao crédito da Fazenda Federal prevaleceria sobre o crédito da Fazenda Federal, não há espaço para ser decida na lide, visto que o apelante não é o titular do crédito tributário, mas mero arrematante, e, por conseguinte, não pode postular em nome próprio suposto direito alheio.

Quanto ao recurso, encontram-se presentes os pressupostos de admissibilidade, pois, o mesmo deve ser conhecido, entretanto no mérito improvido.

De início, permito-me transcrever o trecho do parecer do Procurador de Justiça, que foi certeiro ao esclarecer que:

"(...), que estamos diante de dois arrematantes de boa-fé, que desconheciam a relação processual que envolvia a penhora do bem que pretendiam arrematar. Assim, é de se levar em consideração àquele que terá o menor prejuízo é o apelante, eis que todo o produto de seu lance encontra-se depositado judicialmente. Ademais, a expedição dos alvarás foi suspensa por ordem do juiz federal em exercício, bastando, portanto, o apelante requerer o levantamento do montante depositado. Ao contrário do apelado, que já teve todo o produto do seu lance distribuído, de modo que, restaurar o status quo do seu patrimônio será praticamente impossível, configurando solução desproporcional e desprovida de razoabilidade."

Extrai-se do caderno processual que a primeira penhora oriunda dos autos nº 108/93 da 2ª Vara Cível da Comarca de Maringá foi efetuada no dia 08.09.1993, conforme consta às fls.07, já a segunda penhora decorrente dos autos nº 2000.70.03.002789-7 da Vara Federal de Maringá, realizada em 30.08.2001, fls. 238, verso, registrada no R.I. no dia 06.09.01.

Pondera-se que a arrematação se torna perfeita e acabada com a lavratura do auto, conforme prevê o art. 694, caput, do Código de Processo Civil, o que ocorreu à fls. 47, no dia 13/11/2002 por Sebastião Gerônimo de Oliveira e a que ocorreu às fls. 90, no dia 31/08/2004 por Everaldo Pereira da Silva.

Sendo certo que Everaldo Pereira da Silva, registrou a carta de arrematação perante o Registro de Imóveis do 1º Oficio de Maringá, no dia 18/11/2004.

Partindo-se da boa fé, do apelante e do apelado, irrelevante, que a penhora que deu origem à arrematação do bem em tela tenha sido efetivada somente pela Justiça Federal, ou que está tenha preferência aos créditos da Justiça Estadual.

Ressalta-se que é indiscutível que a primeira arrematação prevalece sobre as que se lhe seguem, conforme aplicação analógica do princípio da anterioridade ou prioridade da penhora.

Para que não fique despercebido, o direito de preferência da Fazenda Federal, deveria ser exercitada no antes da realização do leilão, já que após, a situação é temerária, e por vezes fere o principio da segurança jurídica e as garantias legais das partes envolvidas no procedimento licitatório, que não tem culpa da dupla arrematação do bem.

Permito-me ainda, trazer a colação os seguintes julgados:

"TRIBUTÁRIO - CRÉDITO TRIBUTÁRIO MUNICIPAL E ESTADUAL - PENHORA SOBRE O MESMO BEM - ARREMATAÇÃO - CONCURSUS FISCALIS - 1. É cediço que a instauração do concurso de credores pressupõe pluralidade de penhoras sobre o mesmo bem. Assim, discute-se a preferência quando há execução fiscal e recaia a penhora sobre o mesmo bem, excutido em outra demanda executiva. 2. Isto porque é assente na Corte que 'O direito de preferência não concede à entidade autárquica federal a prerrogativa de intervir em execução movida pela Fazenda do Estado, a que é estranha, para reivindicar a satisfação preferencial de seu crédito, sem obedecer às formalidades processuais atinentes à espécie. Para instauração do concursus fiscalis impõe-se a pluralidade de penhoras sobre o mesmo bem, devendo, portanto, a autarquia federal, provar haver proposto ação de execução, e que nela tenha restado penhorado o bem anteriormente excutido na ação movida pelo Fisco Estadual. Inteligência dos arts. 612 e 711 do CPC.' (REsp nº 36.862-6/SP, Rel. Min. Demócrito Reinaldo, DJ de 19.12.1994). 3. Assentando o Tribunal a quo que a execução fiscal movida pela Fazenda do Estado está garantida com o mesmo bem que restou penhorado na execução movida pelo Fisco municipal, não há como afastar o direito de preferência do Estado sobre o produto da arrematação, ex vi dos arts. 187 do CTN e 29 da LEF, ressalvados eventuais créditos trabalhistas, conforme preceituam os arts. 184 e 186 do CTN.
4. A regra do art. 187 do CTN é especial em relação à regra geral do art. 130 do mesmo diploma. Este último dispositivo assegura apenas a sub-rogação na praça, sem disciplinar a hipótese de pluralidade de sistemas e o concurso de credores preferenciais. 5. Em caso da venda ser efetuada em autos onde se cobra crédito público de outra entidade federativa, no caso, o Estado, ao efetuar-se a alienação, o arrematante fica liberado de quaisquer outros encargos e o valor depositado é distribuído na ordem legal pelo art. 187 do CTN. Nesse caso, liberado o imóvel ao adquirente, receberá o que detém título melhor de preferência. E sobre o valor depositado, aplicando-se a ordem disposta no art. 187 do CTN, bem como no art. 29 da Lei nº 6.830/80 segundo a qual recebe em primeiro lugar a União, e, posteriormente Estados, após, Municípios. 6. Precedentes Jurisprudenciais do STJ (EREsp 167.381/SP, Rel. Min. Francisco Falcão, DJU de 16.09.02; Resp 131.564, Rel. Min. Castro Meira, DJ de 14.09.2004; REsp 74153, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, DJ de 07.10.96; REsp nº 36.862-6/SP, Rel. Min. Demócrito Reinaldo, DJ de 19.12.1994). 7. Recurso Especial provido. (STJ - REsp 654.779/RS - 1ª T. - Rel. Min. Luiz Fux - DJU 28.03.2005 - p. 213)JLEF.29 JCTN.187 JCTN.184 JCTN.186 JCPC.612 JCPC.711 (grifou-se)
Em razão de não possuírem culpa, os arrematantes cabem pleitear o cancelamento da arrematação, e uma vez, desfeito o leilão, as coisas teriam de ser restituídas ao estado em que se encontravam antes.

Por tal premissa é que o apelo não pode ser acolhido, vez a situação do mesmo é que mais se aproxima e a menos onerosa de voltar ao status quo ante, visto que o apelado é quem primeiro registrou no Cartório de Registro Civil - 1º Oficio de Maringá.

Um importante subsidio ao assunto são os ensinamentos de Theotonio Negrão e José Roberto F. Gouveia, ao comentar o artigo 694, do CPC, in CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL e Legilação Processual em Vigor, 40ª Edição - Editora Saraiva, 2008, pág. 884:

"Art. 694: 5. Havendo duas praças do mesmo bem, em processo distintos de execução, prevalece a carta de arrematação registrada em primeiro lugar. (Lex-JTA 141/57).

Não existe, portanto, nulidade no procedimento do registro da carta de arrematação pelo apelado, pois ao Oficial de Registro de Imóveis não cabe indagar sobre a preferência de cada um dos credores para o recebimento de seu crédito, sobre a competência do juízo para a instauração e decisão do concurso de credores, ou sobre o processamento simultâneo de diferentes ações de execução que culminou com a realização de duas praças distintas, uma em cada feito.

Nesse sentido, observe-se o decidido pelo Superior Tribunal de Justiça:

"Penhora - Duplicidade. Com a arrematação extinguem-se as penhoras, devendo a disputa entre os credores cingir-se ao produto daquela" (STJ - 3ª Turma, 14.03.95, DJ 03.04.95, pág.08126- Rel. Min. Eduardo Ribeiro - ROMS 5229/MG; Recurso Ordinário em Mandado de Segurança 1994/0040614-2).

"Penhora. A eventual desatenção à direito de preferência resultante de ter-se penhorado em primeiro lugar, de nenhum modo afeta a regularidade da arrematação, diz apenas com a distribuição do produto da alienação judicial. Necessidade, ademais, de que os credores que se considerem amparados por preferência formulem suas pretensões perante o juiz da causa" (STJ, 3ª Turma, 25.10.94, DJ 28.11.94, pág. 32615, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, RESP 42878/MG; Recurso Especial 1994/0001666-2).

Na obra Código de Processo Civil Comentado, Nelson Nery Júnior e Rosa Andrade Nery, 4ª ed., Ed. Revista dos Tribunais, pág.1167, trazem, em nota referente ao artigo 694, CPC, o seguinte julgado:

"Duas praças do mesmo bem, processos distintos de execução. Prevalência de carta de adjudicação registrada em primeiro lugar. Princípio da prioridade. Recurso provido, para julgar a ação anulatória improcedente (1ª TACivSP, AP 472797-5-Pederneiras, rel. Juiz Ademir Benedito, j.24.3.1993, v.u., DJE-SP, 14.4.1993, p.57, BOLAASP 1798/236).

Por fim, quanto a reforma dos honorários advocatícios também não assiste razão ao apelante, visto que o fato de ser beneficiado com assistência judiciária gratuita, não impede a condenação das custas e despesas processuais, conforme inteligências do artigo 12 da Lei Nº 1.060/50, in verbis:

"Art.
12. A parte beneficiada pela isenção do pagamento das custas ficará obrigada a pagá-las, desde que possa fazê-lo sem prejuízo do sustento próprio ou da família. Se, dentro de 5 (cinco) anos, a contar da sentença final, o assistido não puder satisfazer tal pagamento, a obrigação ficará prescrita.

Diante disto nega-se provimento ao recurso mantendo-se integralmente a sentença.

03. DECISÃO:

ACORDAM os integrantes da Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, negar provimento ao recurso nos termos do voto.

Participaram do julgamento o Sr. Desembargador IDEVAN LOPES (Presidente, com voto) e a Sra. Desembargadora DULCE MARIA CECCONI.

Curitiba, 25 de Agosto de 2009.


RUBENS OLIVEIRA FONTOURA
Desembargador