Acórdão na Íntegra |
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Apelação Cível nº 110.428-3 de Ponta Grossa 3ª Vara Cível
Apelante: Sofia Barabsz Apelados: Carlos Rodrigo Bobek e outro Relator: Des. Sydney Zappa CIVIL AÇÃO DE ANULAÇÃO DE ATO JURÍDICO DUAS DOAÇÕES ENVOLVENDO SETE IMÓVEIS EM ÉPOCAS DIFERENTES ALEGAÇÃO DE EXCESSO DA PARTE DISPONÍVEL ART. 1.176 DO CÓDIGO CIVIL PROCEDÊNCIA EM PRIMEIRO GRAU INSTITUTO DA REDUÇÃO FALTA DE COMPROVAÇÃO DE QUE AO TEMPO DA PRIMEIRA DOAÇÃO NÃO EXISTIAM OUTROS BENS E DE QUE HOUVE O EXCESSO AFERIÇÃO DO EXCESSO NO MOMENTO DA LIBERALIDADE E NÃO NO DA MORTE, AO CONTRÁRIO DO RECONHECIDO NA SENTENÇA CONFIGURAÇÃO DA DOAÇÃO INOFICIOSA SOMENTE EM RELAÇÃO AO SEGUNDO ATO DE LIBERALIDADE DEDUÇÃO DAS DESPESAS EFETUADAS COM O DOADOR ADMISSIBILIDADE SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA CARACTERIZADA APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. 1. Nos termos do art. 1.176, do Código Civil, o excesso da parte disponível do doador deve ser apurado no momento da liberalidade, e não no momento da morte ou da abertura da sucessão. 2. Para que se configure a doação inoficiosa e tenha lugar o instituto da redução, impõe-se que o herdeiro prejudicado comprove que a doação excedeu a parte disponível, ou que abrangeu todo o patrimônio do doador. 3. O usufruto constituído em favor do doador não configura valor econômico dedutível do valor dos bens, para aferir-se o excesso na liberalidade. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 110.428-3 de Ponta Grossa 3ª Vara Cível, em que é apelante Sofia Barabsz e apelados Carlos Rodrigo Bobek e Laryssa Christine Bobek. 1. Trata-se de ação de anulação de ato jurídico, visando a anulação de doações efetuadas pelos avós dos autores, na parte que excedeu o que poderiam dispor, nos termos do art. 1.176, do Código Civil. Relata a inicial que Antônio Bobek era casado com Thereza Barabasz Bobek, com quem teve um filho: João Antônio Bobek. Este, por sua vez, foi casado com Denise de Lourdes Zedebski, resultando do casamento o nascimento dos autores. Com o falecimento de seu pai João Antônio, os autores tornaram-se únicos herdeiros de seus avós. Com o falecimento de Thereza Barabsz e abertura do inventário constatou-se que todos os bens que os avós dos autores possuíam (três imóveis rurais e um urbano) foram doados para a ré Sofia Barabsz, que também foi beneficiária de uma outra doação, consistente de três imóveis urbanos, estes adquiridos por Antônio Bobek após o falecimento de Thereza. Consta, ainda, que Antônio Bobek faleceu durante a tramitação do inventário de sua esposa. Assim, ante a existência de herdeiros necessários (os autores), as doações feitas são nulas na parte em que excedeu o que os doadores poderiam dispor, no caso, metade dos bens que possuíam. Sentenciando o feito, o ilustre juiz singular afastou os argumentos contidos na contestação, especialmente a alegação de que as doações não excederam a legítima, já que os doadores possuíam muitos outros bens no momento da doação, e julgou procedente o pedido inicial, concluindo que é no momento da abertura da sucessão, ou da morte do autor da herança que se verifica o montante da legítima de cada herdeiro, para estabelecer se houve ou não excesso do doador. Assim, considerando-se que os únicos bens deixados pelo autor da herança foram aqueles doados à ré, determinou que o cálculo das legítimas dos autores fosse feito sobre tais bens, constando da parte dispositiva: "Ante o exposto, julgo procedente o pedido deduzido na inicial e declaro nulas as doações efetuadas por Antônio Bobek e sua esposa Thereza Barabasz Bobek, ou exclusivamente pelo primeiro, que excederam a parte disponível na forma da fundamentação supra, ficando, em conseqüência, cada uma das doações reduzidas à metade, em parte ideal, recaindo todo o direito dos autores, porém, nos imóveis que não foram alienados a terceiros ou ao menos que não haviam sido alienados até a data da propositura da presente ação, conforme constam dos autos, se estes suportarem, quando não, convertendo-se em perdas e danos, deduzindo-se, ainda, o montante das despesas com o funeral do extinto Antônio Bobek, nos termos da fundamentação supra. Tudo a ser apurado em regular liquidação por arbitramento." (fls. 323/324). Condenou, ainda, a ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados estes em 20% do valor atribuído à causa. Inconformada, apelou a ré, requerendo, preliminarmente, a apreciação do agravo retido interposto contra o saneador, onde foram suscitadas as preliminares de prescrição, usucapião e carência e inépcia da ação. Ainda como preliminar, sustentou a nulidade da sentença, ante o julgamento ultra petita, ao se reconhecer o direito a perdas e danos, não pedido na inicial. No mérito, pretende a reforma da sentença, aduzindo, em síntese que: a) o direito de compensação por benfeitorias foi afastado sem análise das provas apresentadas; b) as notas promissórias referentes à venda dos primeiros imóveis doados, emitidas ao doador comprovam que o doador tinha os imóveis como seus e assim os considerou todo o tempo, de modo que não teria havido, na realidade, doação; c) excluídos tais imóveis conclui-se que não houve excesso nas legítimas ao tempo da doação; d) a verificação do excesso deve se dar no momento da doação e não no da morte do doador, conforme equivocadamente estabelecido na sentença, e isso deve ser apurado em liquidação por artigos; e) o valor econômico do usufruto instituído em favor do doador em relação aos outros bens doados, que representa 50% por cento do imóvel, deve ser tomado em conta para se apurar a metade disponível no momento da doação; f) as benfeitorias (pagamento de IPTU) e as despesas médicas e hospitalares feitas pela apelante em favor do de cujus devem ser compensadas. Pleiteia, finalmente, a redução dos honorários advocatícios, e que sejam fixados sobre o resultado da execução. Recurso preparado e respondido. A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo provimento parcial da apelação. É O RELATÓRIO. 2. Do agravo retido Contra a decisão de saneamento do processo, de fls. 158/159, que afastou as preliminares de prescrição, usucapião e inépcia da inicial, a apelante interpôs agravo retido, que agora quer ver apreciado. Contudo, o agravo é intempestivo, como bem observado pela ilustre Procuradora de Justiça. Pela certidão de fls. 159, v. vê-se que a decisão foi publicada no Diário da Justiça de 05.05.97, iniciando-se a fluir o prazo de dez dias em 09.05.97, como também consta da certidão. Contudo, o recurso somente foi juntado aos autos no dia 26.05.97 (fls. 165, v.), fora do prazo, portanto. É certo que a agravante procurou justificar o atraso sob a alegação de que na publicação não constou o inteiro teor do despacho, e só tomou conhecimento da rejeição das preliminares quando esteve no Cartório, no dia 19.05.97. Trata-se, porém, de alegação vazia, desprovida de qualquer prova do ocorrido. Não se preocupou a recorrente em juntar cópia da publicação que se diz incompleta, nem requereu a extração de certidão nesse sentido, de modo que não se pode afastar a preclusão ocorrida, ficando inviabilizada a apreciação da matéria, por ausência de um dos requisitos de admissibilidade do recurso. 3. Do julgamento ultra petita Sustenta a apelante que a sentença assegurou aos apelados perdas e danos, sem que houvesse pedido neste sentido. Observa-se, contudo, que o apontado defeito não existe. A sentença não condenou, nem reconheceu o direito às perdas e danos, não há qualquer comando a este respeito. Apenas de forma até certo ponto censurável, pois não cabe ao juiz fazer sugestões às partes mencionou-se a possibilidade de se buscar as perdas e danos referentes aos imóveis já alienados, "em procedimento próprio" e ainda, "se for do interesse das partes" (fls. 323). Logo, resta claro que no julgamento não se incluiu as perdas e danos não pedidas, não se podendo, pois, falar em sentença ultra petita, daí a rejeição da preliminar em exame. 4. Do mérito A primeira questão relevante a ser analisada, para se ingressar no exame da matéria de fundo do presente recurso, diz respeito ao momento de se aferir se a doação ultrapassou a parte disponível dos bens do doador. Na sentença adotou-se o entendimento de que "é no momento da abertura da sucessão, ou da morte do autor da herança (art. 1.572, do Código Civil), que irá verificar pelo montante da legítima de cada herdeiro, adotando-se o procedimento do parágrafo único do art. 1.722, para então se verificar se houve ou não doação dita inoficiosa, considerada nula..." (fls. 321). Diante, disso, ante a constatação de que no momento da morte do doador Antônio Bobek não existiam outros bens, além dos que foram doados, determinou-se que a redução se operasse sobre todos os bens que a apelante recebeu em doação. A solução, no entanto, não pode prevalecer, pois a norma do art. 1.176 do Código Civil é muito clara ao fixar o momento da apuração do excesso: "Nula é também a doação quanto à parte, que exceder a de que o doador, no momento da liberalidade, poderia dispor em testamento". Como se vê, o que não pode o doador é dispor de mais da metade dos bens que possui, por ocasião da liberalidade e não no momento da abertura da sucessão. Não há espaço para interpretação diferente. E também não é o caso de aplicação da norma do parágrafo único do art. 1.014 do Código de Processo Civil, que se destina a assegurar a igualdade das legítimas entre herdeiros, de que aqui não se trata. A propósito, a lição de Washington de Barros Monteiro: "O excesso aprecia-se no momento da liberalidade e não no instante da abertura da sucessão. A adoção desse último critério, como adverte Clóvis, pecaria pela sua injustiça; segundo ele, o doador abastado, que doasse moderadamente e que por qualquer circunstância viesse a se empobrecer posteriormente, poderia ter reduzida a liberalidade, se esta, ao abrir-se-lhe a sucessão, excedesse o valor da legítima. O Código sabiamente, manda se reconheça a inoficiosidade apenas no caso em que o excesso tenha ocorrido no momento da doação, como se o doador houvesse falecido nesse dia" (Curso de Direito Civil, 28. ed., 5º Vol., 2ª parte, Saraiva, 1995, p. 127). Portanto, para se estabelecer se houve excesso na parte disponível, há que se levar em conta os bens que os doadores possuíam no momento de cada conjunto de doações, e essa regra produz conseqüências importantes no caso em exame, conforme se verá a seguir. Extrai-se dos autos que foram feitas doações de sete imóveis para a apelante, em duas oportunidades distintas, em circunstâncias completamente diversas, o que impõe a identificação e análise individualizada de cada um dos momentos em que se operaram as liberalidades, cuja redução se pretende pela presente demanda. Na primeira doação, efetivada em 20.11.79, os doadores foram Antônio Bobek e sua esposa Thereza Barabasz Bobek e abrangeu quatro imóveis, um urbano e três rurais, descritos às fls. 03 e 04, com os seguintes números de matrícula: 494, 679, 877 e 584. Na segunda, datada de 23.02.90, quando Thereza já havia falecido, o doador foi somente Antônio Bobek, e teve como objeto três imóveis urbanos, descritos às fls. 05 e 06, matriculados sob nºs 4.152, 2.570 e 25.820, incidindo sobre todos os imóveis usufruto vitalício em favor do doador. Quanto à primeira doação (quatro imóveis), sustenta inicialmente a apelante que não se tratou propriamente de doação, uma vez que os bens continuaram pertencendo a Antônio Bobek, que inclusive se apoderou do valor obtido pelos imóveis quando foram vendidos. Contudo, embora existam indícios que tornam nebulosas as negociações que envolveram os bens em questão, especialmente porque o doador e a apelada eram sócios e tinham outros negócios juntos, além do fato de ter sido a doação efetivada apenas dois dias antes do falecimento de Thereza, os fatos não foram devidamente apurados e não há qualquer prova segura do alegado, de forma a desconstituir a presunção de propriedade que advém do registro imobiliário, conforme constou da sentença. Já em relação ao segundo fundamento invocado (ainda quanto à primeira doação), de que não houve excesso da parte disponível dos doadores, ante a falta de provas do fato e a comprovação de existência de outros bens, a razão está com a apelante. Primeiro, porque cabia aos apelados fazerem prova do excesso, e não fizeram. Segundo, porque pelos elementos constantes dos autos pode-se extrair que os doadores possuíam outros bens de valor por ocasião da liberalidade. O fundamento da nulidade (ou ineficácia) da doação inoficiosa é a violação da parte legalmente reservada do patrimônio do doador. Diante disso, cabe ao prejudicado provar não só que houve a doação, mas, especialmente, que a liberalidade foi além do permitido. É a aplicação da regra do art. 333, I, do Código de Processo Civil. Na lição de Carvalho Santos, "para ser decretada a nulidade é imprescindível que resulte provado que o valor dos bens doados exceda o que o doador podia dispor por testamento, no momento da liberalidade, bem como qual o excesso" (Código Civil Brasileiro Interpretado, 6. ed., XVI/402). No caso em exame, não se preocuparam os autores em produzir qualquer prova no sentido de demonstrar o excesso. Nem mesmo mencionaram na petição inicial que por ocasião da primeira doação não existiam outros bens de propriedade dos doadores. Contentaram-se simplesmente em alegar que foi atingida a parte indisponível, sem fazer referência a qualquer valor ou percentual. Portanto, não se desincumbiram de sua tarefa. Sobre o assunto este Tribunal já decidiu, em acórdão de lavra deste relator: "Doação inoficiosa. Doadora que teria, mediante cessão simulada de direitos hereditários, doado o único bem imóvel do seu patrimônio, com violação não só do art. 1.175, como também do art. 1.176, do C. Civil. Alegação cuja prova incumbia às autoras e não foi produzida. Validade da alienação. Improcedência do pedido. Apelação desprovida." (TJPR Ap. Cív. 54.788-0, Acórdão nº 6.953, 2ª Câmara Cível, Rel. Des. Sydney Zappa, julg. 14.03.90). No mesmo sentido é a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: "Ação ordinária de nulidade de doação cumulada com sonegação de bens e perdas e danos. Doação inoficiosa. Legítima. 1. A anulação da doação no tocante à parcela do patrimônio que ultrapassa a cota disponível em testamento, a teor do art. 1.176 do Código Civil, exige que o interessado prove a existência do excesso no momento da liberalidade. 2. Recurso especial conhecido e provido, por maioria." (STJ REsp 160.969/PE, 3ª Turma, Rel. p/ Acórdão Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJU 23.11.98, p. 175). Portanto, tão somente a falta de produção de provas por parte dos autores para confirmação do alegado já seria motivo suficiente para a improcedência do pedido no tocante à primeira doação. Mas, não é só isso. Além de não terem produzido qualquer prova no sentido de demonstrar que foi excedida a parte disponível, existem elementos nos autos que comprovam, ao contrário do que consta na sentença, que os doadores possuíam outros bens além daqueles que foram objeto da liberalidade. E bens de valor considerável. Com efeito, por ocasião da primeira doação (20.11.79), Antônio Bobek era sócio majoritário da empresa Expresso Bobek Ltda., já que foi constituída em 1971 (fls. 46) e só encerrou suas atividades em 1987 (fls. 53). Tal empresa atuava no ramo de transportes de passageiros e turismo, e certamente em seu patrimônio existiam bens móveis, incluindo ônibus, sobre os quais há notícia às fls. 78/80. Além disso, está provado nos autos que o patrimônio da empresa incluía imóveis, inclusive, com garagem de ônibus. É o que demonstram os documentos de fls. 20/22. Com efeito, das matrículas dos três imóveis que foram objeto da segunda doação extrai-se que na época da primeira doação eram de propriedade da Expresso Bobek Ltda., pelo menos os dois primeiros (matrículas 4.152 e 2.570), já que em relação ao último (matrícula 25.820) não consta a data de aquisição. Observe-se que o primeiro imóvel pertencia inicialmente a Antônio Bobek e sua esposa, mas em 21.09.77, antes, portanto, da primeira doação, foi transferido para a empresa, para integralização de capital. Depois, em 25.11.88, por meio de dação em pagamento, juntamente com os outros dois, voltaram para o patrimônio de Antônio Bobek, até que, em 23.02.90, foram doados para a apelante Portanto, não se comprovando a existência de excesso da parte disponível na primeira doação, não há que se falar em nulidade e, por conseguinte, não colhe êxito a pretendida redução, merecendo reforma a sentença neste aspecto. Não é o que ocorre, porém, com a segunda doação, referente aos três imóveis urbanos, efetivada em 23.02.90. Aqui sim, não resta dúvida que o doador excedeu a parte de que poderia dispor, atingindo a legítima dos apelados, na condição de herdeiros necessários. Neste passo, observa-se que a doação ocorreu menos de um mês antes da morte do doador, podendo-se concluir com segurança que efetivamente os bens doados eram os únicos que compunham o patrimônio de Antônio Bobek naquela oportunidade. Note-se que o único bem que teria restado para ser inventariado, conforme apontado na inicial, apurou-se no decorrer do processo que já havia sido vendido para a própria apelante antes mesmo da primeira doação, em 22.11.78, como reconhecido na sentença e demonstrado pelo documento de fls. 142. Não se pode nem mesmo dizer que a alegação de ausência de outros bens no momento da segunda doação tenha sido impugnada pela ré, pois embora na contestação se afirme que existiam outros bens (o que é repetido no apelo), a referência só pode dizer respeito ao momento da primeira doação, já que arrola entre os bens a empresa Expresso Bobek Ltda., admitindo que esta teve suas atividades encerradas em 1987 (fls. 38), logo, muito antes da segunda doação se concretizar. Na verdade, a única defesa da apelante é a alegação de que os bens foram doados com reserva de usufruto para o doador, partindo do raciocínio de que o usufruto tem valor econômico, correspondendo, "quando menos, a cinqüenta por cento do valor do imóvel" (fls. 339), diante do que, não teria havido excesso na liberalidade, eis que teria sido reservada a metade do valor do patrimônio do doador. O argumento, porém, não encontra amparo jurídico, pois o usufruto pode servir, no máximo, para afastar a incidência da regra do art. 1.175, que inquina de nula "a doação de todos os bens, sem reserva de parte, ou renda suficiente para a subsistência do doador", não podendo ser valorado economicamente para os fins pretendidos, sem se descurar que o usufruto constitui direito temporário e, no caso, extinguiu-se poucos dias depois de instituído. Diferentemente da norma do art. 1.175 do Código Civil, que serve para proteger o doador, o art. 1.176 tem por objetivo assegurar os direitos dos herdeiros necessários, as suas legítimas, o que, evidentemente, não se obtém com o usufruto, que desaparece com a morte do usufrutuário, daí porque, é absolutamente inviável a pretensão da apelante, em deduzir eventual valor econômico que tenha o usufruto do patrimônio do doador para aferição do excesso da parte disponível. Correta, pois, a sentença em relação aos bens constantes da segunda doação, que deve, realmente, reduzir-se àquilo que podia o doador dispor, ou seja, à metade. Quanto à parte correspondente as despesas efetuadas pela apelante com a doença e morte do doador, somente foram reconhecidas na sentença aquelas com funeral (nota fiscal de fls. 76). Contudo, existem despesas hospitalares comprovadamente pagas pela apelante, o que confirma o que disse a testemunha Omari Villaça Mongruel (fls. 180): "é do conhecimento do depoente que a requerida arcou com todas as despesas hospitalares do Sr. Antonio Bobek". Porém, nem todos os documentos apresentados servem para os fins pretendidos, mas apenas os recibos de pagamentos efetuados. Desta forma, excluem-se os recibos de fls. 63, 64, 66, 67 e 68, que dizem respeito a "pagamento ou depósito", de modo que não se sabe se efetivamente correspondem a pagamentos efetuados ou simples garantia de pagamento oferecida ao hospital. Também os documentos de fls. 71/73 não comprovam que a apelante tenha arcado com tais despesas. Assim, para efeito de abatimento no montante da metade que cabe aos apelados, devem ser incluídos, além das despesas com funeral (fls. 76), já contemplada na sentença, também os valores representados pelos seguintes documentos: a) recibo de fls. 62, que se relaciona com despesas de funeral; b) recibo de fls. 65, referente a exame de ultrasonografia e, c) recibo de fls. 69, por despesas hospitalares. Além disso, deve ser incluído também metade do valor correspondente ao pagamento de IPTU sobre os imóveis, que foram devidamente comprovados (fls. 54/61), já que trata-se de despesa obrigatória. Por fim, há que se reconhecer a sucumbência recíproca, com distribuição das respectivas verbas entre as partes, em igual proporção, observando-se que os honorários advocatícios, mantido o percentual fixado na sentença, deverão incidir sobre o resultado útil obtido pelos autores, ou seja, sobre o valor da metade dos bens da segunda doação, descontadas as despesas efetuadas pela apelante e aqui reconhecidas. 5. Diante do exposto, acordam os Desembargadores integrantes da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em dar provimento parcial ao recurso para: a) estabelecer que o excesso sobre a parte disponível do doador ocorreu somente em relação à segunda doação (imóveis descritos às fls. 05 e 06, matrículas 4.152, 2.570 e 25.820), sobre os quais deverá incidir a redução da metade, ficando a outra metade para a legítima dos apelados; b) determinar que da legítima dos apelados sejam deduzidas as despesas correspondentes aos documentos de fls. 62, 65, 69 e 76, além da metade dos valores pagos a título de IPTU sobre os imóveis (fls. 54/61), mantendo-se a liquidação por arbitramento, e c) reconhecer a sucumbência recíproca e condenar as partes ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes no percentual fixado na sentença, tendo por base o valor da legítima dos apelantes, após as deduções. Participaram do julgamento o Desembar-gador Wanderlei Resende e o Juiz Convocado Paulo Roberto Vasconcellos. Curitiba, 17 de abril de 2.002. Sydney Dittrich Zappa Presidente e Relator |
Não vale como certidão ou intimação.