AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. EMISSÃO DE TÍTULOS SEM CAUSA. ENDOSSO. PROTESTO DOS MESMOS POR ORDEM DO ENDOSSATÁRIO E CADASTRO DO NOME NO SERASA.
Alegando a parte autora inexistência de relação jurídica a autorizar a emissão das duplicatas visadas e não tendo estas, nem o comprovante da entrega da mercadoria autorizadora de sua emissão, sido juntadas aos autos para a verificação se foram ou não aceitas, cabem contra o endossatário as mesmas exceções oponíveis ao emitente, como inexistência de negócio jurídico subjacente. Indemonstrado conluio ou má-fé do endossatário, não responde ele por danos morais eventualmente advindos ao sacado do protesto ou cadastro do nome em órgãos restritivos de crédito, especialmente considerando ter a sacada tomado conhecimento dos aludidos protestos, convivendo com a situação por mais de dois anos.
Apelo provido, em parte. Ação parcialmente procedente.
Apelação Cível |
Quinta Câmara Cível |
N° 70003231032 |
Porto Alegre |
Tecnoval Comercial Ltda |
apelante |
Maywood Com. e Imp. de Veiculos Ltda |
apelado |
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar provimento em parte ao apelo.
Custas, na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário, os Excelentíssimos Senhores Des. Leo Lima, Presidente, e Desª. Ana Maria Nedel Scalzilli.
Porto Alegre, 08 de agosto de 2002.
Des. Marco Aurélio dos Santos Caminha,
Relator.
RELATÓRIO
Des. Marco Aurélio dos Santos Caminha (Relator)
– 1. Trata-se de apelação interposta por Tecnoval Comercial Ltda. contra sentença que julgou improcedente a ação declaratória de inexistência de relação jurídica c/c indenização por danos morais movida contra Maywood Comércio e Importação de Veículos Ltda.Sustenta que a ré lhe forneceu a carta de anuência de fls. 19 para baixar os protestos dos títulos, documento que consta dos autos desde o ajuizamento da ação, que não foi considerado pelo magistrado. Refere ter a demandada agido com dolo ao dar publicidade à situação que não confere com a realidade. Aduz que a situação indica que a ré tinha ciência de que as duplicatas eram títulos frios, já que sem causa subjacente. Ademais, a apelada não acostou as notas fiscais e as faturas das duplicatas. Aliás, existe outra duplicata com a mesma numeração daquela protestada contra a ora apelante. Portanto, é devido o dano moral pela atitude negligente e imprudente da requerida. Arrola extensa jurisprudência e pede o provimento do apelo.
Contra-razões da requerida no sentido da manutenção da sentença.
Vieram-me conclusos.
É o relatório.
VOTO
Des. Marco Aurélio dos Santos Caminha (Relator)
– 2. Na inicial da ação declaratória que propôs, a apelante aduziu que as duplicatas em relação das quais pretende ver reconhecida a inexistência de relação jurídica, foram emitidas pela empresa Abbot Indústria Química Ltda., sem causa subjacente e apresentadas para protesto pela apelada, tendo ela remetido correspondência ao 1º Tabelionato de Protestos de Porto Alegre, em janeiro de 2000, pedindo a baixa dos respectivos protestos, documento este não considerado pelo magistrado.Nas razões recursais, visando ver reformada a sentença com base no reconhecimento de inexistência de relação jurídica entre ela, apelante, e a empresa Abbot Indústria Química Ltda., emitente e endossante dos títulos, refere que a prova de se tratarem de duplicatas sem causa subjacente, está a fls. 21, documento emitido pelo 1º Tabelionato de Novo Hamburgo, onde constam duas duplicatas com a mesma numeração, qual seja "DP 05425A", uma apresentada a protesto pelo Banco Meridional do Brasil S/A, tendo como cedente a empresa Spread Factoring Fomento Comercial Ltda/Abbot Ind. Química Ltda, e a outra pelo Banco Bradesco S/A, tendo como cedente a ora apelada.
A prova dos autos, sem dúvida, favorece a versão da apelante.
Com efeito.
Admite a apelada ter recebido as duplicatas em pagamento de serviços prestados em veículos da empresa Abbot Indústria Química Ltda, em acordo firmado em setembro de 1997, destacando que, em não tendo sido resgatados no vencimento, as levou a protesto, não logrando, mesmo assim, receber o valor nelas inserto e, ao tentar cobrar seu crédito de sua devedora "Abbot Indústria Química Ltda", não mais a localizou.
Ora, esta prova confere credibilidade à versão da apelante no sentido da ausência de causa subjacente para a emissão das duplicatas, sendo no caso em tela perfeitamente possível opor contra a endossatária as exceções oponíveis ao emitente, porque inexistem nos autos provas de terem sido aceitas as duplicatas ou de comprovante de entrega das mercadorias.
Nesse sentido já se manifestou esta Corte, em decisão assim ementada:
APELAÇÃO – AÇÃO DE NULIDADE DE DUPLICATA E SUSTAÇÃO DE PROTESTO – Não tendo sido aceita a duplicata e não estando ela acompanhada de comprovante da entrega da mercadoria, cabem contra o endossatário as mesmas exceções oponíveis ao emitente, como inexistência de negócio jurídico subjacente. Apelo desprovido. (TJRS – APC 599374501 – 6ª C.Cív. – Rel. Des. João Pedro Freire – J. 14.06.2000). (publicada in Júris Síntese, nº 34, versão março/abril/2002).
Por isso, afirmada a inexistência da causa subjacente, versão não desfeita pela parte ré, como lhe competia, na forma do art. 333, II, do Código de Processo Civil, procede o pedido declaratório de inexistência de relação jurídica.
Quanto à indenização por danos morais em face dos protestos e de alegada inscrição no SERASA, tenho que em relação ao endossatário dos títulos, no caso concreto, onde não restou demonstrado conluio ou má-fé, é indevida, especialmente considerando ter a autora tomado conhecimento dos aludidos protestos em junho de 1998 (fls. 18), convivendo com a situação por mais de dois anos.
Por outro lado, não trouxe provas de que seu nome tenha sido encaminhado também ao SERASA. Mas ainda que assim tenha ocorrido, pelas mesmas razões antes alinhadas, não há como se acolher o pedido de indenização por danos morais contra a apelada, porque incomprovado proceder temerário da mesma.
São as razões pelas quais dou provimento parcial ao apelo para julgar procedente, em parte, a ação e declarar a inexistência de relação jurídica entre a autora e Abbot Indústria Química Ltda ou entre a postulante e a demandada a legitimar a emissão das duplicatas visadas e desacolher o pedido de indenização por danos morais movido contra a ré – endossatária, por incomprovado conluio ou má-fé. Em conseqüência, determino o cancelamento dos protestos relativos aos mesmos títulos e exclusão de eventuais registros a eles relativos em órgãos restritivos de crédito.
Ante o decaimento recíproco, distribuo os ônus sucumbenciais à razão de 50% a cargo de cada uma das partes, com honorários advocatícios no valor fixado na sentença, em favor dos patronos, sem compensação.
Desª. Ana Maria Nedel Scalzilli – De acordo.
Des. Leo Lima, presidente
– De acordo.Apelação cível nº 70003231032 de Porto Alegre. A decisão é a seguinte: "Deram provimento, em parte. Unânime".
Decisor(a) de 1º Grau: Walter Jose Girotto.