DOAÇÃO DE AÇÃO DE DIVÓRCIO

EMENTA: AÇÃO DE DIVÓRCIO DIRETO LITIGIOSO - PARTILHA DE BENS - COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS - IMÓVEL DOADO AO CÔNJUGE VIRAGO NA CONSTÂNCIA DO CASAMENTO - CLÁUSULA DE INCOMUNICABILIDADE INCLUÍDA EM ESCRITURA POSTERIOR, NÃO ASSINADA PELO VARÃO - INVALIDADE EM RELAÇÃO A ESTE. DOAÇÃO - AUSÊNCIA DE REGISTRO NO CÁRTÓRIO DE IMÓVEIS - IRRELEVÂNCIA - SENTENÇA MANTIDA. 1- Se os litigantes foram casados pelo regime de comunhão universal de bens, e os imóveis foram doados a um deles, na constância da vida conjugal, sem cláusula de incomunicabilidade, tais bens pertencem de forma igualitária a ambos os cônjuges, sendo inválida, em relação a eles, cláusula de inalienabilidade incluída em escritura de re-ratificação lavrada sem a participação de um deles. 2- O imóvel recebido em doação por um dos cônjuges, na constância da união conjugal, uma vez aceita a liberalidade passa a integrar o patrimônio do casal e está sujeito à partilha em caso de separação judicial ou divórcio, sendo irrelevante que a escritura tenha sido registrada somente depois da separação de fato.

V.V.

AÇÃO DE DIVÓRCIO - PARTILHA - BEM OBJETO DE DOAÇÃO - AUSÊNCIA DE REGISTRO NO CARTÓRIO DE IMÓVEIS - AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE NÃO EFETIVADA - EXCLUSÃO DO BEM DO PATRIMÔNIO COMUM - SENTENÇA REFORMADA PARCIALMENTE. A aquisição da propriedade se opera através "do registro do título translativo no Registro de Imóveis", conforme dispõe o artigo 1.245, do Código Civil. Sendo a doação de imóvel registrada no Cartório Imobiliário, após a separação de fato do casal, com nítido propósito de somente contemplar a filha do doador, não há que se falar em aquisição do bem para fins de partilha.

APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0701.07.190056-0/001 - COMARCA DE UBERABA - APELANTE(S): M.G.B.M.A. - APELADO(A)(S): H.A.A. - RELATOR: EXMO. SR. DES. EDILSON FERNANDES - RELATOR PARA O ACÓRDÃO: EXMO SR. DES. MAURÍCIO BARROS

ACÓRDÃO

(SEGREDO DE JUSTIÇA)

Vistos etc., acorda, em Turma, a 6ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, EM NEGAR PROVIMENTO, VENCIDO O RELATOR.

Belo Horizonte, 28 de julho de 2009.

DES. MAURÍCIO BARROS - Relator para o acórdão.

DES. EDILSON FERNANDES - Relator vencido.

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

O SR. DES. EDILSON FERNANDES:

VOTO

Trata-se de recurso interposto contra a r. sentença de f. 183/185, proferida nos autos da Ação de Divórcio Direto ajuizada por M. G. B. M. A. em desfavor de H. A. A., na parte que determinou a partilha dos imóveis descritos à f. 115, na proporção de 50% para cada cônjuge.

Em suas razões, a apelante sustenta, em síntese, que o registro da doação no Cartório de Imóveis se operou quando as partes já se encontravam separadas de fato, não podendo haver a comunicação dos bens com o patrimônio em comum do casal, por estar o imóvel gravado com cláusulas de incomunicabilidade e de impenhorabilidade. Pugna pelo provimento do recurso para que os bens controvertidos não sejam objeto de partilha (f. 189/202-TJ).

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

A matéria a ser analisada no presente recurso diz respeito à determinação de partilha dos bens descritos às f. 114/117-TJ, entre o casal e em igual proporção.

Conforme se verifica dos autos, os imóveis descritos às f. 114/117-TJ foram objeto de doação em favor da apelante, através de escritura pública lavrada em 28 de março do ano de 2002, e re-ratificada em 11 de dezembro de 2003 (f. 118/120-TJ).

Entretanto, o registro de doação dos bens junto ao Cartório de Imóveis somente se operou em 10 de agosto de 2007 (f. 212/219-TJ), época em que os litigantes já se encontravam separados de fato (f. 139/140-TJ).

Como se sabe, o registro da doação junto ao Cartório de Imóveis constitui requisito indispensável para a aquisição da propriedade, conforme dispõe o artigo 1.245 do Código Civil, ensinando a renomada Professora MARIA HELENA DINIZ que:

"O registro de imóveis tem por finalidade a obtenção da aquisição da propriedade inter vivos, pois o contrato, a título oneroso ou gratuito, apenas produz efeitos pessoais ou obrigacionais. Assim sendo somente a intervenção estatal, realizada pelo oficial do Cartório imobiliário, conferirá direitos reais, a partir da data em que se fizer o assentamento do imóvel, transferindo a propriedade do alienante para o adquirente. Tríplice será a finalidade legal do registro imobiliário, pois servirá como garantia de autenticidade, segurança e eficácia dos assentos de atos jurídicos inter vivos ou mortis causa, constitutivos, declaratórios, translativos e extintivos de direitos reais sobre imóveis (Lei n. 6.015/73, arts. 1º e 172), preservando-lhe a confiabilidade"(Código Civil Anotado, 9ª ed., Saraiva, p. 803, destaquei).

Desse modo, forçoso concluir que somente em 10 de agosto de 2007 é que a apelante de fato teve os imóveis transferidos para sua propriedade, situação que inviabiliza a inclusão dos bens no patrimônio em comum do casal, por estarem as partes, à época, separadas de fato.

No mesmo sentido, já teve a oportunidade de decidir este egrégio Tribunal:

"REIVINDICATÓRIA - DOAÇÃO - IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO.

A aquisição da propriedade imóvel, nos moldes do inciso I, do art. 530, do Código Civil, é efetuada pela transcrição do título de transferência no registro do imóvel. O contrato, por si só, não opera a transferência do domínio. É inviável a pretensão de anulação de doação que não se aperfeiçoou ante a falta de registro dos instrumentos junto à competente circunscrição imobiliária" (Ap. Cível 2.000.00.418359-1.001, Rel. Des. DOMINGOS COELHO, J. 11.02.2004).

Isso porque a manifestação de vontade do doador somente surtiu os efeitos legais no momento que apresentou as escrituras no registro imobiliário competente, com o nítido propósito de apenas contemplar a sua filha, ora apelante, com a devida vênia, inviabilizando a partilha determinada na r. sentença impugnada.

DOU PROVIMENTO AO RECURSO para afastar da partilha os bens descritos às f. 114/117-TJ, mantida a verba de sucumbência em observância ao disposto no artigo 20 do CPC.

Custas recursais, pelo apelado.

O SR. DES. MAURÍCIO BARROS:

VOTO

A apelante pretende que sejam excluídos da partilha os imóveis que recebeu de seus pais, em doação, ao argumento de que o registro da escritura somente foi feito quando o casal já estava separado de fato, de modo que tais bens são incomunicáveis, não tendo o apelado direito à metade deles, mormente pelo fato de que a doação foi feita com as cláusulas de incomunicabilidade e impenhorabilidade.

Verifica-se dos autos que os pais da apelante lhe doaram os imóveis descritos em escritura pública lavrada em 28/03/2002, na constância de seu casamento com o apelado (fl. 114/117). Em 11/12/2003 foi lavrada escritura pública de re-ratificação da primeira escritura (fl. 118/120), ocasião em que os imóveis foram gravados com as cláusulas de incomunicabilidade e impenhorabilidade.

Para ter validade, a doação deve ser aceita pelo donatário. O contrato não se aperfeiçoará, enquanto o beneficiário não aceitar a doação, pois desconhece o nosso ordenamento jurídico a doação não aceita (art. 1.166 do Código Civil de 1916 e art. 539 do Código Civil de 2002).

Ao tempo da doação (28/03/2002) ainda estava em vigor o Código Civil de 1916, cujo art. 1.166 dispunha que "O doador pode fixar prazo ao donatário, para declarar se aceita, ou não a liberalidade. Desde que o donatário, ciente do prazo, não faça dentro nele, a declaração, entender-se-á que aceitou, se a doação não for sujeita a encargo".

Essa regra - também existente no Código Civil de 2002 - ou seja, poder o doador fixar prazo para o donatário declarar se aceita ou não a doação, por óbvio que não se aplica se, em se tratando de doação de bem imóvel, o donatário assinar a escritura de doação. No momento em que assina a escritura o donatário manifesta a inequívoca declaração de aceitação da liberalidade.

No caso em julgamento, a aceitação da doação ocorreu no momento em que a apelante assinou a escritura pública, 28/03/2002, na condição de donatária.

Os litigantes casaram-se em 04/12/1982, sob o regime de comunhão universal de bens, que implica na comunicação de todos os bens presentes e futuros dos cônjuges, excetuando-se os bens doados ou legados com a cláusula de incomunicabilidade, nos termos do art. 262 do Código Civil de 1916, vigente ao tempo do casamento, e do art. 1.667 do Código Civil de 2002.

São excluídos da comunhão os bens doados ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar, e também os bens doados em vida e os deixados em testamento, se houver cláusula de incomunicabilidade.

O apelado não assinou a escritura de re-ratificação, através da qual a doação acabou sendo gravada com a cláusula de incomunicabilidade. Sendo assim, tal cláusula não o atinge, pois a comunicação fora antes consumada.

Entendendo que a incomunicabilidade não atinge o varão, pois, tendo sido aceita pela varoa a doação, da escritura de re-ratificação não participou o varão, e que, por ser fato consumada a comunicação, o douto sentenciante determinou que os aludidos imóveis fossem partilhados entre o casal, no que se mostrou acertada.

Entretanto, o eminente Relator está a reformar a sentença, ao fundamento de que a doação somente se concretizou com o registro da escritura de doação, ocorrido depois da separação de fato do casal litigante, de modo que o apelado não tem direito à metade dos aludidos bens.

Ouso divergir do eminente Relator, pois os imóveis questionados entraram para o patrimônio do casal no momento em que a apelante aceitou a doação, assinando a escritura pública, sendo que naquele exato momento ocorreu a comunicação, sendo absolutamente irrelevante o fato de a escritura ter sido registrada somente após a separação de fato do casal, mormente pelo fato de que a doação somente poderia vir a ser revogada por ingratidão do donatário.

Com essas considerações, rogando vênia ao douto Relator, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO.

Custas recursais, pela apelante, observada a gratuidade judiciária.

É como voto.

O SR. DES. ERNANE FIDÉLIS:

Entendo, com a devida vênia do ilustre Relator, seguindo fielmente o voto do digno Revisor, que se a doação se concretizou antes da separação judicial, o bem se comunicou, evidentemente, e, ainda que estivessem separados de fato no período da escritura, creio que seja irrelevante, porque a separação de fato não justifica a separação de patrimônio.

Acompanho o Revisor, data venia.

SÚMULA :      NEGARAM PROVIMENTO, VENCIDO O RELATOR.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0701.07.190056-0/001