DOAÇÃO DE AÇÃO DE DIVÓRCIO
EMENTA: AÇÃO DE DIVÓRCIO DIRETO LITIGIOSO - PARTILHA DE BENS - COMUNHÃO
UNIVERSAL DE BENS - IMÓVEL DOADO AO CÔNJUGE VIRAGO NA CONSTÂNCIA DO CASAMENTO -
CLÁUSULA DE INCOMUNICABILIDADE INCLUÍDA
V.V.
AÇÃO DE DIVÓRCIO - PARTILHA - BEM OBJETO DE DOAÇÃO - AUSÊNCIA DE REGISTRO NO CARTÓRIO DE
IMÓVEIS - AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE NÃO EFETIVADA - EXCLUSÃO DO BEM DO
PATRIMÔNIO COMUM - SENTENÇA REFORMADA PARCIALMENTE. A aquisição da propriedade
se opera através "do registro do título translativo
no Registro de Imóveis", conforme dispõe o artigo 1.245, do Código Civil.
Sendo a doação de imóvel
registrada no Cartório Imobiliário, após a separação de fato do casal, com
nítido propósito de somente contemplar a filha do doador, não há que se falar
em aquisição do bem para fins de partilha.
APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0701.07.190056-0/001 - COMARCA DE UBERABA -
APELANTE(S): M.G.B.M.A. - APELADO(A)(S): H.A.A. -
RELATOR: EXMO. SR. DES. EDILSON FERNANDES - RELATOR PARA O ACÓRDÃO: EXMO SR. DES. MAURÍCIO BARROS
ACÓRDÃO
(SEGREDO DE JUSTIÇA)
Vistos etc., acorda, em Turma, a 6ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de
Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na
conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas,
Belo Horizonte, 28 de julho de 2009.
DES. MAURÍCIO BARROS - Relator para o acórdão.
DES. EDILSON FERNANDES - Relator vencido.
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
O SR. DES. EDILSON FERNANDES:
VOTO
Trata-se de recurso interposto contra a r.
sentença de f. 183/185, proferida nos autos da Ação de Divórcio Direto ajuizada
por M. G. B. M. A. em desfavor de H. A. A., na parte que determinou a partilha
dos imóveis descritos à f. 115, na proporção de 50% para cada cônjuge.
Em suas razões, a apelante sustenta, em síntese, que o registro da
doação no Cartório de
Imóveis se operou quando as partes já se encontravam separadas de fato, não
podendo haver a comunicação dos bens com o patrimônio em comum do casal, por
estar o imóvel gravado com cláusulas de incomunicabilidade e de
impenhorabilidade. Pugna pelo provimento do recurso para que os bens
controvertidos não sejam objeto de partilha (f. 189/202-TJ).
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
A matéria a ser analisada no presente recurso diz respeito à
determinação de partilha dos bens descritos às f. 114/117-TJ, entre o casal e
em igual proporção.
Conforme se verifica dos autos, os imóveis descritos às f.
114/117-TJ foram objeto de doação em favor da apelante, através de escritura pública lavrada em 28
de março do ano de 2002, e re-ratificada em 11 de dezembro de 2003 (f.
118/120-TJ).
Entretanto, o registro de doação dos bens junto ao Cartório de Imóveis somente se operou em 10 de
agosto de 2007 (f. 212/219-TJ), época em que os litigantes já se encontravam
separados de fato (f. 139/140-TJ).
Como se sabe, o registro da doação junto ao Cartório de Imóveis constitui requisito indispensável
para a aquisição da propriedade, conforme dispõe o artigo 1.245 do Código
Civil, ensinando a renomada Professora MARIA HELENA DINIZ que:
"O registro de imóveis tem por finalidade a obtenção da
aquisição da propriedade inter vivos, pois o contrato, a título oneroso ou
gratuito, apenas produz efeitos pessoais ou obrigacionais. Assim sendo somente
a intervenção estatal, realizada pelo oficial do Cartório imobiliário,
conferirá direitos reais, a partir da data em que se fizer o assentamento do imóvel,
transferindo a propriedade do alienante para o adquirente. Tríplice será a
finalidade legal do registro imobiliário, pois servirá como garantia de
autenticidade, segurança e eficácia dos assentos de atos jurídicos inter vivos
ou mortis causa, constitutivos, declaratórios, translativos e extintivos de direitos reais sobre imóveis
(Lei n. 6.015/73, arts. 1º e 172), preservando-lhe a
confiabilidade"(Código Civil Anotado, 9ª ed.,
Saraiva, p. 803, destaquei).
Desse modo, forçoso concluir que somente em 10 de agosto de 2007 é
que a apelante de fato teve os imóveis transferidos para sua propriedade,
situação que inviabiliza a inclusão dos bens no patrimônio em comum do casal,
por estarem as partes, à época, separadas de fato.
No mesmo sentido, já teve a oportunidade de decidir este egrégio Tribunal:
"REIVINDICATÓRIA - DOAÇÃO - IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO.
A aquisição da propriedade imóvel, nos moldes
do inciso I, do art. 530, do Código Civil, é efetuada pela transcrição do
título de transferência no registro do imóvel. O contrato, por si só, não opera
a transferência do domínio. É inviável a pretensão de anulação de doação que não se aperfeiçoou ante a falta de
registro dos instrumentos junto à competente circunscrição imobiliária" (Ap. Cível 2.000.00.418359-1.001, Rel. Des. DOMINGOS
COELHO, J. 11.02.2004).
Isso porque a manifestação de vontade do doador somente surtiu os
efeitos legais no momento que apresentou as escrituras no registro imobiliário
competente, com o nítido propósito de apenas contemplar a sua filha, ora
apelante, com a devida vênia, inviabilizando a partilha determinada na r. sentença impugnada.
DOU PROVIMENTO AO RECURSO para afastar da partilha os bens
descritos às f. 114/117-TJ, mantida a verba de sucumbência em observância ao
disposto no artigo 20 do CPC.
Custas recursais, pelo apelado.
O SR. DES. MAURÍCIO BARROS:
VOTO
A apelante pretende que sejam excluídos da partilha os imóveis que
recebeu de seus pais, em doação, ao argumento de que o registro da escritura somente foi feito quando
o casal já estava separado de fato, de modo que tais bens são incomunicáveis,
não tendo o apelado direito à metade deles, mormente pelo fato de que a doação foi feita com as cláusulas de
incomunicabilidade e impenhorabilidade.
Verifica-se dos autos que os pais da apelante lhe doaram os imóveis
descritos em escritura pública lavrada em 28/03/2002, na constância de seu
casamento com o apelado (fl. 114/117). Em 11/12/2003 foi lavrada escritura
pública de re-ratificação da primeira escritura (fl. 118/120), ocasião em que
os imóveis foram gravados com as cláusulas de incomunicabilidade e
impenhorabilidade.
Para ter validade, a doação deve ser aceita pelo donatário. O contrato não se aperfeiçoará,
enquanto o beneficiário não aceitar a doação, pois desconhece o nosso ordenamento jurídico a doação não aceita (art. 1.166 do Código Civil
de 1916 e art. 539 do Código Civil de 2002).
Ao tempo da doação (28/03/2002) ainda estava em vigor o Código
Civil de 1916, cujo art. 1.166 dispunha que "O doador pode fixar prazo
ao donatário, para declarar se aceita, ou não a liberalidade. Desde que o
donatário, ciente do prazo, não faça dentro nele, a declaração, entender-se-á
que aceitou, se a doação não for sujeita a encargo".
Essa regra - também existente no Código Civil de 2002 - ou seja,
poder o doador fixar prazo para o donatário declarar se aceita ou não a doação, por óbvio que não se aplica se, em se
tratando de doação de bem imóvel, o donatário assinar a escritura de doação. No momento em que assina a escritura
o donatário manifesta a inequívoca declaração de aceitação da liberalidade.
No caso em julgamento, a aceitação da doação ocorreu no momento em que a apelante
assinou a escritura pública, 28/03/2002, na condição de donatária.
Os litigantes casaram-se em 04/12/1982, sob o regime de comunhão
universal de bens, que implica na comunicação de todos os bens presentes e
futuros dos cônjuges, excetuando-se os bens doados ou legados com a cláusula de
incomunicabilidade, nos termos do art. 262 do Código Civil de 1916, vigente ao
tempo do casamento, e do art. 1.667 do Código Civil de 2002.
São excluídos da comunhão os bens doados ou herdados com a
cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar, e também os bens
doados em vida e os deixados em testamento, se houver cláusula de
incomunicabilidade.
O apelado não assinou a escritura de re-ratificação, através da
qual a doação acabou
sendo gravada com a cláusula de incomunicabilidade. Sendo assim, tal cláusula
não o atinge, pois a comunicação fora antes consumada.
Entendendo que a incomunicabilidade não atinge o varão, pois,
tendo sido aceita pela varoa a doação, da escritura de re-ratificação não participou o varão, e que,
por ser fato consumada a comunicação, o douto sentenciante
determinou que os aludidos imóveis fossem partilhados entre o casal, no que se
mostrou acertada.
Entretanto, o eminente Relator está a reformar a sentença, ao
fundamento de que a doação somente se concretizou com o registro da escritura de doação, ocorrido depois da separação de fato do
casal litigante, de modo que o apelado não tem direito à metade dos aludidos
bens.
Ouso divergir do eminente Relator, pois os imóveis questionados
entraram para o patrimônio do casal no momento em que a apelante aceitou a doação, assinando a escritura pública, sendo
que naquele exato momento ocorreu a comunicação, sendo absolutamente
irrelevante o fato de a escritura ter sido registrada somente após a separação
de fato do casal, mormente pelo fato de que a doação somente poderia vir a ser revogada por ingratidão do donatário.
Com essas considerações, rogando vênia ao douto Relator, NEGO
PROVIMENTO AO RECURSO.
Custas recursais, pela apelante, observada a gratuidade
judiciária.
É como voto.
O SR. DES. ERNANE FIDÉLIS:
Entendo, com a devida vênia do ilustre Relator, seguindo fielmente
o voto do digno Revisor, que se a doação se concretizou antes da separação judicial, o bem se comunicou,
evidentemente, e, ainda que estivessem separados de fato no período da
escritura, creio que seja irrelevante, porque a separação de fato não justifica
a separação de patrimônio.
Acompanho o Revisor, data venia.
SÚMULA : NEGARAM PROVIMENTO, VENCIDO O
RELATOR.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS
APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0701.07.190056-0/001