COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA

EMENTA: EMBARGOS DE TERCEIRO - COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA - SÚMULA 84 DO STJ - COMPROVAÇÃO DA POSSE - REGISTRO PÚBLICO - DESNECESSIDADE - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - RESISTÊNCIA DO EXEQÜENTE. - São cabíveis embargos de terceiro para defesa de posse anterior à penhora e decorrente de compromisso de compra e venda, ainda que este não tenha sido registrado, nos termos da súmula 84 do STJ. - Pela natureza e finalidade dos embargos de terceiro, entende-se que o registro público do compromisso de compra e venda é dispensável, haja vista que se objetiva resguardar não apenas o proprietário, mas o possuidor, contra ato judicial de constrição do bem sobre o qual tem a posse. - No caso de embargos de terceiros, não tendo o embargante registrado a compra e venda no Cartório de Registro de Imóveis, deverá ser afastada a condenação do exeqüente ao pagamento dos honorários advocatícios, desde que este não ofereça resistência aos embargos.

APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0433.07.220137-2/002 - COMARCA DE MONTES CLAROS - APELANTE(S): UNICRED NORTE MINAS COOP ECON CRED MUTUO MEDICOS DEMAIS PROFISSIONAIS NIVEL SUPE - APELADO(A)(S): JOHSON SOARES LIMA - RELATOR: EXMO. SR. DES. ELPÍDIO DONIZETTI

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 18ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.

Belo Horizonte, 28 de julho de 2009.

DES. ELPÍDIO DONIZETTI - Relator

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

O SR. DES. ELPÍDIO DONIZETTI:

VOTO

Trata-se de apelação interposta à sentença que, nos autos dos embargos de terceiro opostos por Johson Soares Lima à execução de título extrajudicial promovida por Unicred Norte de Minas Ltda., acolheu os embargos e, por conseguinte, desconstituiu a penhora realizada nos autos da execução.

Na sentença (f. 45-46), o juiz de primeiro grau asseverou que o feito comporta julgamento antecipado, e que o embargante provou ter celebrado contrato de compromisso de compra e venda, cujo objeto é o bem penhorado, antes da propositura da ação de execução, o que o legitima a opor embargos de terceiro, a teor da súmula 84 do STJ.

Inconformada, a embargada interpôs apelação às f. 51-55, alegando, em síntese, que:

a) o compromisso de compra e venda não transfere a propriedade do bem, o que só ocorre com o registro no Cartório de Imóveis;

b) o embargante não provou ter a posse do imóvel a que se refere o caso dos autos;

c) o contrato apresentado pelo apelado não contém os requisitos formais exigidos para sua validade e, ademais, não foi registrado, razão pela qual não gera efeitos perante terceiros;

d) de acordo com a súmula 303 do STJ, quem deu causa à constrição indevida - no caso, o apelado - deve arcar com os honorários advocatícios.

Arremata requerendo o provimento da apelação para reformar a sentença e rejeitar os embargos de terceiro. Caso assim não se entenda, pugna pela inversão dos ônus de sucumbência.

O apelado apresentou contra-razões às f. 86-94, nas quais requer a manutenção da sentença.

1 - DO MÉRITO DOS EMBARGOS DE TERCEIRO

Na sentença, o juiz de primeiro grau entendeu que a celebração do contrato de compromisso de compra e venda, cujo objeto é o bem penhorado, antes da propositura da ação de execução, legitima o autor (apelado) a opor embargos de terceiro, nos termos da súmula 84 do STJ.

A apelante, a seu turno, afirma que o compromisso de compra e venda não transfere a propriedade do bem e que o embargante não provou ter a posse deste.

Pois bem. Dispõe o art. 1.046 do CPC que:

"Art. 1.046. Quem, não sendo parte no processo, sofrer turbação ou esbulho na posse de seus bem por ato de apreensão judicial, em casos como o de penhora, depósito, arresto, seqüestro, alienação judicial, arrecadação, arrolamento, inventário, partilha, poderá requerer lhe sejam manutenidos ou restituídos por meio de embargos.

§ 1º Os embargos podem ser de terceiro senhor e possuidor, ou apenas possuidor.

§ 2º Equipara-se a terceiro a parte que, posto figure no processo, defende bens que, pelo título de sua aquisição ou pela qualidade em que os possuir, não podem ser atingidos pela apreensão judicial.

§ 3º Considera-se também terceiro o cônjuge quando defende a posse de bens dotais, próprios, reservados ou de sua meação."

Conforme se verifica da norma transcrita, tanto o proprietário quanto o possuidor que forem atingidos em seu patrimônio por ato de constrição judicial decorrente de relação processual da qual não façam parte podem opor embargos de terceiro, a fim de defender sua posse sobre o bem.

Assim se faz necessário que o embargante faça prova da qualidade de terceiro e de sua posse.

No que tange a comprovação da posse, dispõe a Súmula 84 do Superior Tribunal de Justiça que:

"É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido de registro."

No caso dos autos, o embargante argüiu em sua petição inicial que, conforme o compromisso de compra e venda juntado à f. 11 dos autos, adquiriu, em 16/10/2003, "um lote de terreno de número 23 (vinte e três), da quadra número 2 (dois), com área total de 2.412 (dois mil, quatrocentos e doze), situado à Rua 06 (seis), do loteamento 'Chácaras das Paineiras', localizada na Fazenda Rocinha" (f. 02).

Aludido imóvel foi objeto de penhora em execução movida por Unicred Norte de Minas Ltda (apelante) em face de Marta Elizabeth Gomes dos Santos, conforme se verifica à f. 26.

Ressalte-se que, ao analisar as datas dos documentos juntados aos autos, percebe-se que o instrumento foi firmado em 16/10/2003 (f. 11), razão pela qual o apelado já detinha a posse do bem quando da efetivação da penhora, ocorrida em 20/04/2007 (f. 26).

Ressalve-se ainda que, pela natureza e finalidade dos embargos de terceiro, a jurisprudência entende que o registro público do compromisso de compra e venda é dispensável, haja vista que se objetiva resguardar não apenas o proprietário, mas o possuidor, contra ato judicial de constrição do bem sobre o qual tem a posse. Nesse sentido:

EMBARGOS DE TERCEIRO - ART. 1.046, DO CPC - DEFESA DA POSSE OU PROPRIEDADE - SÚMULA Nº 84, DO STJ - ESCRITURA DE COMPRA E VENDA - TRANSMISSÃO IMEDIATA DA POSSE - FRAUDE À EXECUÇÃO NÃO CONFIGURADA - EMBARGOS PROCEDENTES - SENTENÇA REFORMADA.

De acordo com a jurisprudência do STJ, consubstanciada na Súmula nº 84 e também com o entendimento desta Corte, é admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em compromisso particular de compra e venda. Assim, com muito maior razão, devem ser julgados procedentes embargos de terceiro fundados em contrato definitivo de compra e venda, cujo preço foi quitado no ato da lavratura da escritura pública, tendo sido imediatamente transferida a posse ao adquirente.

Não havendo que se falar em fraude à execução, mormente porque o bem foi alienado ao embargante cerca de três anos antes do ajuizamento da ação executiva, devem ser julgados procedentes os embargos de terceiro, desconstituindo-se a penhora. (TJMG, 17ª Câmara Cível, AC nº 2.0000.00.517790-0/000, Relator: Des. Eduardo Marine da Cunha, DJ: 19/01/2006).

"EMBARGOS DE TERCEIRO - CONTRATO PARTICULAR DE COMPRA E VENDA - REGISTRO DISPENSÁVEL.

- São admissíveis os embargos de terceiro amparados em contrato particular de compra e venda desprovido de registro junto ao cartório de registro de imóveis, a teor do entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, na Súmula 84, cabendo à parte contrária, se for o caso, a desconstituição de seu valor probante, mediante produção de prova cabal." (TAMG, 2a Câmara Cível, AC No 440.725-2, relator: juiz Alberto Aluízio Pacheco de Andrade, data do julgamento: 22/2/2005)

Por fim, destaca-se que a apelante não comprovou as alegadas irregularidades no compromisso de compra e venda firmado, sendo necessário frisar que não são exigidas, como requisito de validade do instrumento, assinaturas de testemunhas.

Destarte, deve-se manter a sentença nesse ponto, uma vez que restou comprovada a qualidade de terceiro do apelado, bem como a posse sobre o bem penhorado nos autos em apenso.

2 - DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

Na sentença, o juiz de primeiro grau julgou procedentes os embargos de terceiro, condenando a embargada (apelante) ao pagamento de custas e honorários advocatícios.

Inconformada, aduz a recorrente que o apelado, ao não registrar o contrato de compra e venda, deu causa à constrição indevida, razão pela qual deve ser condenado a arcar com a verba honorária.

Em primeiro lugar, cumpre esclarecer que a fixação dos ônus da sucumbência é balizada por dois princípios: o da sucumbência e o da causalidade.

De acordo com o princípio da sucumbência, todos os gastos do processo devem ser atribuídos à parte que foi vencida na causa, independentemente da sua culpa pela derrota.

Ocorre que esse princípio, por si só, não é suficiente para resolver com segurança todas as situações do cotidiano jurídico. Por esse motivo, em alguns casos, há de se considerar também, na fixação dos honorários advocatícios, o princípio da causalidade, segundo o qual "deve-se considerar que é responsável pelas despesas processuais aquele que tiver dado causa à instauração do processo" (CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. vol. I. 9ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003. p. 158).

No caso de embargos de terceiros, não tendo o embargante registrado o compromisso de compra e venda no Cartório de Registro de Imóveis, entende-se que a condenação da exeqüente deverá ser afastada, desde que este não ofereça resistência aos embargos.

Todavia, no caso sob julgamento, observa-se que a apelante insurgiu-se tanto na contestação quanto nas razões recursais contra a pretensão do apelado, requerendo, em síntese, a manutenção da penhora efetivada nos autos da execução.

Disso se conclui, evidentemente, que, com a rejeição das questões suscitadas pela apelante, houve a sua sucumbência na demanda, razão pela qual ela deve ser condenada ao pagamento das despesas que o apelado teve com o processo.

Corroborando tal entendimento, transcreve-se o seguinte julgado:

"PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. EMBARGOS DE TERCEIRO. IMÓVEL VENDIDO ANTERIORMENTE. TÍTULO NÃO REGISTRADO. RESISTÊNCIA FORMAL DO EXEQÜENTE MANIFESTADA NA IMPUGNAÇÃO AOS EMBARGOS. ALEGAÇÃO DE DESCONHECIMENTO DA SITUAÇÃO JURÍDICA. EMBARGOS ACOLHIDOS PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. SUCUMBÊNCIA DEVIDA.

I - Incabível, em princípio, a condenação do banco réu na sucumbência em embargos de terceiro, onde ao exeqüente é impossível o conhecimento de venda anterior de imóvel através de contrato não registrado no cartório de imóvel respectivo.

II - Todavia, se, após tomar ciência do fato em juízo, o credor, ao invés de prontamente concordar com o levantamento da penhora, resiste ao pedido, impugnando os embargos e postulando pela manutenção da constrição, torna-se responsável pelo pagamento das custas e da verba honorária dessa demanda.

III - Recurso especial conhecido e desprovido"

(REsp nº 440.789/SP, Quarta Turma, Relator o Ministro Aldir Passarinho Junior, DJ de 17/2/03). (Grifo nosso)

Assim, não merece reforma a sentença que condenou a apelante ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios.

CONCLUSÃO

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação.

Custas recursais pela apelante.

Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): FABIO MAIA VIANI e ARNALDO MACIEL.

SÚMULA :      NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO.

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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0433.07.220137-2/002