FORNECIMENTO
DE ÁGUA
INADIMPLÊNCIA - CORTE- LEGALIDADE
Processo : REREsp
337965 / MG ;
EMBARGOS DE DIVERGENCIA NO RECURSO ESPECIAL: 2003/0228498-0
Relator(a) : Ministro LUIZ FUX (1122)
Órgão Julgador : S1 - PRIMEIRA SEÇÃO
Data do Julgamento : 22/09/2004
Data da Publicação/Fonte : DJ 08.11.2004 p. 155
Ementa : ADMINISTRATIVO. CORTE DO FORNECIMENTO DE ÁGUA. INADIMPLÊNCIA
DO
CONSUMIDOR. LEGALIDADE.
1. A 1ª Seção, no julgamento do RESP nº 363.943/MG,
assentou o
entendimento de que é lícito à concessionária
interromper o
fornecimento de energia elétrica, se, após aviso prévio,
o
consumidor de energia elétrica permanecer inadimplente no pagamento
da respectiva conta (Lei 8.987/95, art. 6º, § 3º, II).
2. Ademais, a 2ª Turma desta Corte, no julgamento do RESP nº
337.965/MG entendeu que o corte no fornecimento de água, em
decorrência de mora, além de não malferir o Código
do Consumidor, é
permitido pela Lei nº 8.987/95.
3. Ressalva do entendimento do relator, no sentido de que o corte do
fornecimento de serviços essenciais - água e energia elétrica
-
como forma de compelir o usuário ao pagamento de tarifa ou multa,
extrapola os limites da legalidade e afronta a cláusula pétrea
de
respeito à dignidade humana, porquanto o cidadão se utiliza
dos
serviços públicos posto essenciais para a sua vida, curvo-me
ao
posicionamento majoritário da Seção.
4. A aplicação da legislação infraconstitucional
deve subsumir-se
aos princípios constitucionais, dentre os quais sobressai o da
dignidade da pessoa humana, que é um dos fundamentos da República
e
um dos primeiros que vem prestigiado na Constituição Federal.
5. Deveras, in casu, não se trata de uma empresa que reclama uma
forma de energia para insumo, tampouco de pessoas jurídicas
portentosas, mas de uma pessoa física miserável, de sorte que
a
ótica tem que ser outra. O direito é aplicável ao caso
concreto, não
o direito em tese. Imperioso, assim tenhamos, em primeiro lugar,
distinguir entre o inadimplemento de uma pessoa jurídica portentosa
e o de uma pessoa física que está vivendo no limite da sobrevivência
biológica.
6. Em segundo lugar, a Lei de Concessões estabelece que é possível
o
corte considerado o interesse da coletividade, que significa não
empreender o corte de utilidades básicas de um hospital ou de uma
universidade, tampouco o de uma pessoa que não possui módica
quantia
para pagar sua conta, quando a empresa tem os meios jurídicos legais
da ação de cobrança. A responsabilidade patrimonial no
direito
brasileiro incide sobre patrimônio devedor e, neste caso, está
incidindo sobre a própria pessoa!
7. Ressalvadas, data maxima venia, opiniões cultíssimas em contrário
e sensibilíssimas sob o ângulo humano, entendo que 'interesse
da
coletividade' a que se refere a lei pertine aos municípios, às
universidades, hospitais, onde se atingem interesses
plurissubjetivos.
8. Por outro lado, é mister considerar que essas empresas consagram
um percentual de inadimplemento na sua avaliação de perdas,
por isso
que é notório que essas pessoas jurídicas recebem mais
do que
experimentam inadimplementos.
9. Destacada a minha indignação contra o corte do fornecimento
de
serviços essenciais de pessoa física em situação
de miserabilidade e
absolutamente favorável ao corte de pessoa jurídica portentosa,
que
pode pagar e protela a prestação da sua obrigação,
submeto-me à
jurisprudência da Seção.
10. Embargos de divergência rejeitados, por força da necessidade
de
submissão à jurisprudência uniformizadora.
Acórdão
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da
PRIMEIRA SEÇÃO do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade
dos
votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer
dos embargos e negar-lhes provimento, nos termos do voto do Sr.
Ministro Relator. Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha,
Castro
Meira, Denise Arruda, José Delgado e Franciulli Netto votaram com o
Sr. Ministro Relator.
Ausentes, ocasionalmente, os Srs. Ministros Teori Albino Zavascki,
Francisco Peçanha Martins e Francisco Falcão.