RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO BANCO PELA RETENÇÃO DO CARTÃO MAGNÉTICO

 

APELAÇÃO CÍVEL Nº 100.294-4, DE APUCARANA - 2ª VARA CÍVEL.

APELANTE: HSBC BAMERINDUS S/A

APELADOS: IRENE MARIA BIAZIM E OUTRA

RELATOR: JUIZ EUGÊNIO ACHILLE
GRANDINETTI


AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANO MATERIAL. RETENÇÃO DO CARTÃO MAGNÉTICO PELO CAIXA ELETRÔNICO. SAQUES REALIZADOS POR TERCEIROS NO DIA SEGUINTE DO OCORRIDO. CULPA CONCORRENTE. INOCORRÊNCIA.

1. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO BANCO.
Art. 14 O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
§ 1º. O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:
I o modo de seu fornecimento;
II o resultado dos riscos que razoavelmente dele se esperam;
III à época que foi fornecido.

RESPONSABILIDADE CIVIL DE BANCO SAQUE BANCÁRIO COM CARTÃO MAGNÉTICO CARTÃO DE CRÉDITO BANCÁRIO CANCELAMENTO ART. 14 § 1º CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR ART. 1524 CC DANO MATERIAL DANO MORAL PROCEDÊNCIA DO PEDIDO Reparação de dano. Banco 24 Horas. Retenção do cartão, imediatamente comunicada à operadora do serviço. Saques posteriores, levados a débito da usuária. Ação visando a indenização por danos moral e material. Denunciação da operadora. Improcedência. O fornecedor de serviço deve resguardar o usuário contra o risco inerente ao tipo de atividade prestada, pelo que responde ele objetivamente pelo dano causado. A fixação da indenização por dano moral será feita em consideração à gravidade da ofensa e à repercussão do dano. Recurso provido. (TJRJ AC 6987/97 (Reg. 270498) Cód. 97.001.06987 5ª C.Cív. Rel. Des. CARLOS FERRARI J. 02.12.1997).

RECURSO DESPROVIDO.



1.RELATÓRIO

Irene Maria Biazim e Letícia Biazim moveram Ação Ordinária de Indenização contra o Hsbc-Bamerindus S/A, a qual foi julgada procedente.

Inconformado com a decisão, o HSBC Bamerindus S/A interpôs recurso de apelação, alegando que ficou comprovado que os saques foram efetuados por golpistas; e que além disso, o filho da apelada foi instruído a proceder o cancelamento do cartão, entrando em contato com o Telebanco no próprio dia do extravio do cartão, mas não o fez, deixando a situação sem maiores cuidados até a metade do dia seguinte, razão pela qual foi possível a ocorrência dos demais saques.

Afirma que se o agravado comparecesse ao Banco no dia útil posterior, logo após a abertura do estabelecimento, o prejuízo máximo seria de R$ 1.200,00. O apelante finaliza argüindo que o fato de o cartão magnético estar na posse do correntista, a guarda, zelo e vigilância são de responsabilidade exclusivamente sua.

Recurso tempestivo, preparado e respondido.

É o relatório.

2. O VOTO E A SUA MOTIVAÇÃO

Infere-se dos autos que o Sr. Eleandro Biazim se dirigiu ao Hsbc Bamerindus S. A, no dia 02.08.98, com intuito de retirar dinheiro, utilizando-se do cartão de sua mãe. Porém, este teve seu cartão retido pelo caixa eletrônico 24 horas.

Os fatos foram devidamente comprovados através dos depoimentos do apelante e apelado.

Nas fls. 89 dos autos, o preposto do apelante, Sr. José Vanderlei Fabri, afirmou que:

... respondeu que foi aplicado o golpe do cartão...; ... a central dos caixas não funcionava...; ... confirma que a máquina foi mexida, com colocação de duas fitas para reter o cartão magnético, que tais fitas foram fixadas com cola super bonder...; ... que também constataram no dia seguinte que os fios de aparelho de telefone das máquinas haviam sido cortados.

... confirma que houve uma ligação de Eleandro para o gerente Sr. Martos no Domingo...; ... que o gerente Martos é o gerente geral da agência...; ... que o gerente Martos orientou para retornar à agência na segunda feira para saber sobre o ocorrido...; que Eleandro foi pessoalmente na agência, no período da tarde, reclamar o cartão, ....

E ainda confirmou que :

que houve dois casos semelhantes na mesma agência, ocorridos pouco tempo depois deste e, também houve saques nas referidas contas dos correntistas...; acrescenta que as máquinas estão sendo substituídas por outras, nas quais não será necessário se inserir os cartões.

Verifica-se dos autos, que o Apelante não contestou o fato de que os serviços prestados em seu caixa eletrônico estavam defeituosos, e admitiu que o apelado sofreu um golpe no interior de sua agência.

ANTONIO HERMEN DE VASCONCELLOS E BENJAMÍN, em sua obra Código de Defesa do Consumidor Comentado fls. 78, edita que:

Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.
O defeito é o elemento que detona a responsabilidade civil objetiva do prestador de serviço,ao causar um acidente de consumo.

O apelante alega que houve culpa exclusiva ou concorrente do apelado, que teria oportunizado a terceira pessoa o conhecimento de sua senha pessoal e secreta.

Porém, o banco não juntou aos autos nenhuma prova concreta de que haviam pessoas no interior do Caixa eletrônico. Cabe ressaltar que o Banco possui sistema de filmadoras nos interiores de todos os seus caixas eletrônicos.

O fato é que o banco é responsável pela segurança de seus clientes. Restou evidente, que golpistas ingressaram no recinto onde se localizam os terminais eletrônicos. Tal fato se confirma com o depoimento do gerente do apelante aonde se admitiu que havia cola super bonder nos caixas e os fios telefônicos estavam cortados.

No que tange a alegação de que o filho da apelada deveria ter telefonado ao Telebanco, vale consignar que o apelado procurou entrar em contato com a central de atendimentos, porém os fios do interfone estavam cortados. Este fato é comprovado com o depoimento do gerente administrativo do apelante que afirmou que um funcionário esteve no local e constatou que tudo estava normal, e que não reparou na cola super bonder e nos fios de telefones cortados.

Ressalte-se que a partir do momento em que o cartão magnético das apelantes ficou retido no caixa eletrônico do Banco, e este fato foi comunicado pelo filho da apelante, a responsabilidade pela guarda do cartão foi transferida para a instituição financeira.


O Código de Defesa do Consumidor, dispõe em seu art.14:

Art. 14 O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
§ 1º. O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:
I o modo de seu fornecimento;
II o resultado dos riscos que razoavelmente dele se esperam;
III à época que foi fornecido;
§ 2º (omissis)
§ 3º - O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:
I que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;
II a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

A prestação do serviço pelo banco não teve a segurança necessária, enquadrando-se perfeitamente no disposto no §1º, art.14 do CDC, eis que quando de sua utilização pelo consumidor, a máquina (caixa eletrônico) encontrava-se alterada pela ação de golpistas, os serviços de segurança (telefone), não estavam funcionando, e independentemente do consumidor ter entrado em contato com o gerente do banco, não agiu com a presteza necessária a impedir o prejuízo suportado pelas apeladas.

O caixa localiza-se dentro da agência.

Portanto, o Banco deveria proporcionar segurança permanente ao consumidor.

ZELMO DELARI em comentários ao artigo 14 do CDC, nos ensina:

O art. 14 oferece critérios para aferição do vício de qualidade do serviço prestado, e o item mais importante, neste particular, é a segurança do usuário...; O serviço presume-se defeituoso quando é mal apresentado ao público consumidor (inc. I), quando sua fruição é capaz de suscitar riscos acima do nível de razoável expectativa (inc. II), bem como quando, em razão de decurso do tempo, desde a sua prestação, é de se supor que não ostente sinais de envelhecimento (inc. III).

Nesse sentido, a jurisprudência:

RESPONSABILIDADE CIVIL DE BANCO CADERNETA DE POUPANÇA SAQUE BANCÁRIO COM CARTÃO MAGNÉTICO CULPA CONFIGURAÇÃO DANO MATERIAL DANO MORAL INDENIZAÇÃO ÔNUS DA PROVA ART. 6 INC. VIII CDC Responsabilidade Civil. Banco. Conta de poupança. Retiradas de valores. Utilização de sistema informatizado e eletrônico. Movimentação atribuída ao titular. Situação não demonstrada. Evidência de saques indevidos. Culpa da instituição configurada. Danos materiais e morais. Reparação que se impõe. Ônus da prova. Regra do Código de Defesa do Consumidor. Aplicabilidade na hipótese. Agravo retido desacolhido. Provimento da apelação. É típica relação de consumo, enquadrando-se, pois, nas normas do Código de Defesa do Consumidor, aquela decorrente da atividade de serviço que o banco presta ao seu cliente, ai incluindo-se as aplicações financeiras e o movimento de contas de qualquer espécie. Assim, tratando-se de retiradas de valores de conta de poupança através da utilização de sistema informatizado e eletrônico, e não restando demonstrado que o correntista tenha diretamente promovido essa utilização, ou contribuído indiretamente para o acionamento desse mecanismo operacional, evidente é que tais retiradas representam saques indevidos, a configurar a culpa da instituição bancária, na modalidade da negligência, do que resulta o seu dever de reparar os danos materiais e morais sofridos pelo cliente.
(TJRJ AC 2062/97 (Reg. 110598) Cód. 97.001.02062 RJ 3ª C.Cív. Rel. Des. ANTÔNIO EDUARDO F. DUARTE J. 09.12.1997).


RESPONSABILIDADE CIVIL DE BANCO SAQUE BANCÁRIO COM CARTÃO MAGNÉTICO CARTÃO DE CRÉDITO BANCÁRIO CANCELAMENTO ART. 14 § 1º CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR DENUNCIAÇÃO DA LIDE ART. 1524 CC DANO MATERIAL DANO MORAL PROCEDÊNCIA DO PEDIDO Reparação de dano. Banco 24 Horas. Retenção do cartão, imediatamente comunicada à operadora do serviço. Saques posteriores, levados a débito da usuária. Ação visando a indenização por danos moral e material. Denunciação da operadora. Improcedência. O fornecedor de serviço deve resguardar o usuário contra o risco inerente ao tipo de atividade prestada, pelo que responde ele objetivamente pelo dano causado. Entre a empresa prestadora do serviço e o banco integrante da rede Banco 24 Horas há inequívoca relação de preposição, pelo que este é responsável perante o usuário pelo dano causado, cabendo-lhe, no entanto, ação regressiva contra aquela (art. 1.524 do Código Civil). A fixação da indenização por dano moral será feita em consideração à gravidade da ofensa e à repercussão do dano. Recurso provido. (TJRJ AC 6987/97 (Reg. 270498) Cód. 97.001.06987 5ª C.Cív. Rel. Des. CARLOS FERRARI J. 02.12.1997).


RESPONSABILIDADE CIVIL INDENIZAÇÃO CARTÃO MAGNÉTICO ESTABELECIMENTO BANCÁRIO GOLPE DE "TROCA DE CARTÃO" NO INTERIOR DAS DEPENDÊNCIAS FALTA DE SEGURANÇA DANO MORAL PROVA DESNECESSIDADE É de responsabilidade do usuário o uso do cartão magnético e o sigilo de sua senha. Porém, se o usuário é vítima de golpe de troca de cartão no interior das dependências da instituição bancária, vindo a sofrer vários desfalques em seu crédito em conta corrente, responde o banco pelos prejuízos causados em razão de ter oferecido um serviço defeituoso, sem a segurança necessária à realização de operações financeiras em caixa eletrônico. (Inteligência do art. 14 da Lei nº 8.078/90).O dano moral independe de prova, exigindo-se somente a prova do fato que gerou a dor e o mal psicológico para a condenação. (Precedentes do STJ). (TAMG AC 0300385-4 4ª C.Cív. Relª Juíza MARIA ELZA J. 22.03.2000).

Assim, diante dos defeitos na prestação de serviços, e da negligência do apelante por não ter adotado as medidas de segurança necessárias ao consumidor, nego provimento ao recurso.

3. DISPOSITIVO

Ante ao exposto, acordam os julgadores integrantes da 4.ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em negar provimento ao recurso.

O julgamento foi presidido pelo Des. WANDERLEY REZENDE, sem voto, e dele participaram o Des. DILMAR KESSLER, e o Juiz MIGUEL KFOURI NETO.

Curitiba, 19 de junho de 2002.

EUGÊNIO ACHILLE GRANDINETTI
Relator

Fonte: Tribunal de Justiça do Paraná