CANCELAMENTO DO CONTRATO COM PRESTADORA DE TELEFONIA CELULAR
Órgão |
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2Ş Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais |
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Classe |
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ACJ Apelação Cível no Juizado Especial |
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N. Processo |
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2002.01.1.047513-2 |
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Apelante(s) |
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AMERICEL S.A |
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Apelado(s) |
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WANDERLEY MARCELINO DE SOUSA |
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Relator(a) Juiz(a) |
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TEÓFILO RODRIGUES CAETANO NETO |
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EMENTA |
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RESPONSABILIDADE CIVIL. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE TELEFONIA MÓVEL CELULAR. RELAÇÃO DE CONSUMO CARACTERIZADA . RESGATE DOS DÉBITOS EXISTENTES. DISTRATO DO AVENÇADO. IMPUTAÇÃO DE DÍVIDA REMANESCENTE E RECUSA NA READMISSÃO DO ANTIGO CLIENTE COMO USUÁRIO DOS SERVIÇOS OFERECIDOS. DANO MORAL CARACTERIZADO. COMPENSAÇÃO PECUNIÁRIA DEVIDA. Concertado um contrato de prestação de serviços de telefonia móvel celular entre a prestadora de serviços e um consumidor, a operação qualifica-se como relação de consumo, sujeitando-se à incidência do Estatuto Consumerista. Resgatadas as obrigações pecuniárias geradas pela utilização dos serviços e distratado o ajuste em decorrência da iniciativa do próprio consumidor, exaure-se o avençado e as obrigações dele derivadas. Restando desobrigado, o consumidor, não qualificando-se como devedor inadimplente, não pode ter seu nome anotado em qualquer cadastro de devedores inadimplentes, ainda que de uso exclusivo e restrito da prestadora de serviços, sob pena de, em assim procedendo, a operadora de serviços de telefonia praticar um ilícito passível de caracterizar-se como dano moral ante o abalo no crédito que provoca, tanto que o consumidor vira uma compra que almejava consumar ser frustrada e fora recusado como usuário dos serviços por ela oferecidos em decorrência da sua qualificação como inadimplente. Caracterizada a anotação e qualificação indevidas, porque desprovidas de lastro material e não evidenciada a causa excludente da ilicitude aventada pela prestadora de serviços, e sendo presumidos os danos morais experimentados pelo consumidor, ainda mais quando deparara-se com a frustração da transação que almeja consumar e fora recusado como usuários dos serviços públicos oferecidos pela própria prestadora de serviços, assiste-lhe o direito de merecer uma compensação pecuniária pelas ofensas à sua credibilidade, bom nome e decoro que experimentara. Recurso conhecido e improvido. Unânime. |
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ACÓRDÃO |
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Acordam os Senhores Juízes da Segunda Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, TEÓFILO RODRIGUES CAETANO NETO - Relator, - BENITO AUGUSTO TIEZZI Vogal, LUCIANO MOREIRA VASCONCELLOS Vogal, sob a presidência do Juiz BENITO AUGUSTO TIEZZI, em CONHECER E NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, POR UNANIMIDADE, de acordo com a ata do julgamento. |
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Brasília (DF), 16 de outubro de 2002. |
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BENITO AUGUSTO TIEZZI Presidente TEÓFILO RODRIGUES CAETANO NETO Relator |
RELATÓRIO |
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Cuida-se de ação de indenização de danos morais manejada por Wanderley Marcelino de Sousa em desfavor da empresa Americel S/A almejando a obtenção de provimento jurisdicional que assegure-lhe o recebimento da importância que apontara como compensação pelos danos morais que lhe teriam sido impingidos, ao argumento de que, não obstante tenha cancelado o contrato de prestação de serviços telefônicos que havia concertado com a demandada e resgatado integralmente as obrigações que até então lhe estavam afetas, ela, ignorando a quitação havida, continuara a imputar-lhe um débito inexistente, determinando que, quando fora efetivar a compra de um aparelho celular em um supermercado e habilitá-lo junto à mesma, fora negada a habilitação que almejava, frustrando a consumação da transação, o que sujeitara-o a situações vexatórias e constrangedoras que se transmudaram em sofrimento e abatimento psicológico, afetando sua estima e moral, merecendo, pois, uma compensação pecuniária pelos danos que experimentara. Ultrapassada a fase conciliatória, a ação fora regularmente processada e, ao final, o pedido acolhido parcialmente, condenando-se a ré a pagar a quantia de R$ 1.500,00 (hum mil e quinhentos reais), reputada pelo Juízo monocrático como suficiente para compensar o autor pelos danos morais que experimentara em decorrência do débito que indevidamente lhe fora imputado e da frustração da compra que almejava ultimar em decorrência dessa indevida imputação. Inconformada com a condenação que lhe fora imposta, a ré recorrera almejando sua absolvição. Argumentara, em suma, que na data em que fora distratado o contrato de prestação de serviços de telefonia celular que jungira as partes, a despeito do pagamento promovido pelo autor, ainda persistia um débito referente a serviços que prestara e que somente não havia sido computado em decorrência dos procedimentos de processamento eletrônico que adota. Dessa forma, não tendo havido o resgate do débito remanescente existente, o apontamento da sua existência nos seus controles é legítimo e encontra-se revestido de aparato material, não configurando abuso de direito negar-se, então, a entabular novo contrato enquanto não solvida a pendência existente. Assevera que, além de encontrar-se em mora quanto ao resgate do débito remanescente que o aflige, a recusa que manifestara quanto à entabulação de novo contrato com o autor não pode, jamais, configurar-se em fato gerador de dano moral, qualificando-se o ocorrido como simples aborrecimento próprio da vida em sociedade e dos avanços tecnológicos, mesmo porque não ficara ele impedido de adquirir o aparelho celular que almejava, sendo-lhe negada tão somente sua habilitação como seu cliente, denotando que o ocorrido efetivamente não pode ensejar sua condenação no pagamento de uma excessiva compensação pecuniária como forma de compensá-lo pelo simples transtorno que experimentara em decorrência da sua própria inércia e inadimplência. Ao final, asseverando que a condenação que lhe fora imposta afigura-se excessiva e desconforme com o princípio da razoabilidade, fomentando o enriquecimento sem causa, defendera o acolhimento da irresignação que agitara para que reste absolvida da cominação que lhe fora imposta, pois não praticara qualquer ato passível de ser reputado ilícito e nem o autor experimentara quaisquer danos em decorrência da recusa em admiti-lo como usuário dos serviços de telefonia móvel que oferece, ou, alternativamente, para que a indenização fixada seja reduzida consideravelmente. O autor, regularmente intimado, contrariou tempestivamente o apelo aviado, pugnando, em suma, pela manutenção do decisório vergastado por seus próprios e jurídicos fundamentos por ter aplicado perfeitamente o direito positivo ao caso concreto debatido. É o relatório. |
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VOTOS |
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O Senhor Juiz TEÓFILO RODRIGUES CAETANO NETO Relator |
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Estando patente o interesse da recorrente, sendo o recurso apropriado, tendo sido atempadamente manejado, regularmente preparado e subscrito por advogado regularmente constituído, fazendo-se presentes, pois, os pressupostos de admissibilidade, dele conheço. Cuida-se de ação de indenização de danos morais aviada ao estofo de que, não obstante tenha havido o resgate do débito que o afligia por ocasião do distrato do contrato de prestação de serviços de telefonia celular concertado entre as partes, a ré, ignorando o pagamento que lhe fora destinado, anotara em seus assentamentos e controles financeiros a coexistência de um débito remanescente afeto ao autor, determinando que, ao tentar adquirir um novo aparelho celular junto a um estabelecimento comercial, a transação fosse frustrada ante a recusa proveniente da prestadora de serviços em readmiti-lo como usuário dos serviços de telefonia que oferece, pois o aparelho cuja aquisição era almejada tinha preço diferenciado em se verificando sua imediata habilitação junto a ela, o que teria sujeitado-o a situações vexatórias e constrangedoras que se transmudaram em sofrimento e abatimento psicológico, afetando sua estima e moral. O pedido fora parcialmente acolhido e, inconformada com a condenação que lhe fora imposta, a ré recorrera perseguindo sua integral absolvição da cominação que lhe fora imposta ou, ainda, a mitigação da expressão pecuniária da condenação, donde apura-se que o cerne da controvérsia estabelecida nesta sede reside na investigação acerca da legitimidade do débito que fora imputado ao autor e determinara a frustração da compra que almejava e da recusa proveniente da demandada em readmiti-lo como usuário dos serviços de telefonia móvel que oferece enquanto não resgatasse o débito remanescente que ainda o aflige e, se ilícitos, se a compensação que lhe fora assegurada guarda vassalagem aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Em conformação com a argumentação delineada pela recorrente na defesa que agitara e, agora, ao alinhavar sua pretensão reformatória infere-se, de forma indene, que efetivamente não se irresignara contra a circunstância de que efetivamente recusara-se a readmitir o recorrido como usuário dos serviços que presta e nem quanto ao fato de que, almejando adquirir um aparelho celular, a transação por ele efetivada fora frustrada ante a nuance de que, diante da recusa manifestada, o valor do equipamento seria diferenciado, onerando-o consideravelmente. Sua irresignação, ao revés, está adstrita à alegação de que, encontrando-se inadimplente quanto ao resgate de um débito remanescente originário do contrato de prestação de serviços que anteriormente haviam concertado e restara distratado, a recusa em readmiti-lo como usuário dos serviços que presta enquanto não resgatada a dívida consubstancia-se em mero exercício de um direito, pois não pode ser compelida a inserir no rol dos seus assinantes um consumidor que sequer resgatara débitos que anteriormente havia gerado, revelando que o ocorrido, de qualquer sorte, não pode ser qualificado como fato gerador de danos morais. Do que fora acima alinhavado em conformação com os elementos de convicção que foram amealhados durante a instrução processual e com a própria argumentação tecida pelos litigantes emerge a ilação de que restara apurado de forma incontroversa que efetivamente concertaram um contrato de prestação de serviços tendo por objeto a utilização dos serviços de telefonia celular móvel oferecidos pela recorrente, donde deriva a irreversível constatação de que o relacionamento havido qualifica-se como uma relação de consumo, sujeitando-se, pois, ao regrado pelo Código de Defesa do Consumidor, devendo o conflito de interesses estabelecido ser equacionado sob as bitoladas das normas protetivas que estão amalgamadas nesse estatuto protetor. Estabelecidas essas premissas resta a ser apurado, então, se a recorrente desincumbira-se do ônus probatório que atraíra para si ao invocar como estofo para sua absolvição da cominação que lhe fora imposta a coexistência de um débito remanescente de responsabilidade do antigo usuário dos serviços de telefonia que presta. É que a coexistência dessa dívida qualifica-se como fato impeditivo e, mesmo, extintivo do direito invocado pelo recorrido na medida em que, evidenciado que efetivamente encontra-se em mora quanto ao resgate de uma obrigação pecuniária que o aflige, a recusa proveniente da prestadora de serviços revestiria-se de legitimidade, autorizando-a a se recusar a inserir na sua base de assinantes um usuário que sequer resgatara os débitos originários do contrato que anteriormente haviam concertado. E isso fica mais evidente quando se depara com a constatação de que o recorrido, ao aviar sua pretensão indenizatória, ilustrara a inicial com um recibo emitido pela própria recorrente, sustentando que, na ocasião em que efetivara esse pagamento, cancelara o contrato de prestação de serviços que jungira as partes e quitara integralmente as obrigações pecuniárias que lhe estavam afetas em decorrência dos serviços que lhe haviam sido prestados, tanto que, posteriormente ao pagamento e distrato havidos, não lhe fora encaminhado qualquer aviso de cobrança ou da existência de qualquer débito remanescente afligindo-o. Com efeito, malgrado a argumentação que delineara e desprezando o ônus probatório que atraíra para si, a recorrente, em verdade, não evidenciara a coexistência de qualquer débito remanescente de responsabilidade do recorrido passível de legitimar sua qualificação como devedor inadimplente e estofar a recusa que lhe fora dirigida quanto à sua readmissão como usuário dos serviços de telefonia que oferece. E isso porque, ao invés de exibir as competentes faturas que retratassem os serviços prestados e que ainda não haviam merecido a correspondente contraprestação pecuniária por parte do consumidor, a prestadora de serviços restringira-se a carrear para o seio dos autos um simples demonstrativo de pagamentos que confeccionara de forma unilateral e cópias de extratos que, ao que tudo indica, extraíra do "sítio" que mantém na rede mundial de computadores, consoante se infere do simples cotejo dos documentos que estão entranhados às fls. 33/38. Esses extratos e demonstrativo, em conformidade com os mais comezinhos princípios de direito comercial e processual, não podem, evidentemente, ser acolhidos como expressão e comprovação do débito que fora imputado ao recorrido, pois foram confeccionados de forma unilateral e, além disso, não se qualificam como faturas demonstrativas de serviços prestados. Caracterizam-se, em verdade, como simples demonstrativos confeccionados unilateralmente pela prestadora de serviços e sua admissão como comprovante de débito, consoante sustentara a própria recorrente ao hostilizar a sentença que lhe fora desfavorável, implicaria no estabelecimento da insegurança nas relações jurídicas e comerciais, pois o consumidor ficaria vulnerável e sujeito à imputação de débitos em seu desfavor desprovidos de comprovação efetiva e regular e sem a exibição, ao menos, da competente fatura que estampe os serviços efetivamente prestados. E isso fica mais latente quando se depara com a circunstância de que, ao aviar sua pretensão compensatória, o consumidor exibira um comprovante de pagamento confeccionado pela própria prestadora de serviços e nele inexiste qualquer ressalva quanto à coexistência de qualquer débito remanescente, consoante se infere do recibo que está entranhado à fl. 08. Esse recibo, aliás, consigna como data para pagamento o dia 19 de abril de 1999, data em que efetivamente fora consumado, consoante assegura a autenticação mecânica que nele está estampada. Conseqüentemente, se a prestadora de serviços sustentara que o débito remanescente referia-se aos serviços prestados entre os dias 13 a 19 daquele mês, pois as faturas eram emitidas em desfavor do recorrido com vencimento fixado para o dia 13 de cada mês e não houve tempo para computar os serviços oferecidos dentro desse interstício, competia-lhe evidenciar a coexistência dessa dívida através de elementos idôneos e revestidos de verossimilhança, pois refoge à normalidade das práticas comerciais a consumação de um pagamento sem qualquer ressalva e, em seguida, a credora reclamar débitos gerados anteriormente à sua ocorrência, o que efetivamente não se verificara. Dessas irreversíveis ilações deriva a constatação de que a recorrente não evidenciara, mediante elementos de prova idôneos e passíveis de atestarem a coexistência de um débito passível de ser imputado ao seu primitivo cliente, que efetivamente encontra-se ele em mora quanto ao resgate do débito que lhe fora imputado, donde se apura que os serviços que oferecera não foram prestados de forma perfeita e adequada, pois permitira que, após emitir um recibo espelhando a integralidade das obrigações de responsabilidade do consumidor, viesse a imputar-lhe uma dívida que teria sido gerada anteriormente à própria emissão desse instrumento de pagamento. Aliada à completa ausência de comprovação do débito que imputara ao recorrido, a própria postura processual adotada pela recorrida milita em desfavor da argumentação que delineara como álibi para sua absolvição das conseqüências dos atos que praticara. É que, consoante bem assinalado pelo eminente sentenciante, não chegara, a despeito de insistir na imputação de um débito remanescente ao recorrido, a aviar pedido contraposto destinado a perseguir o importe que lhe julga devido. Ora, é evidente que a recorrente, se efetivamente estivesse revestida de aparato material, usaria dessa faculdade para perseguir aquilo que lhe julga devido, tendo em conta a celeridade do procedimento ao qual sujeita-se a lide aviada em seu desfavor e, principalmente, o importe alcançado pelo débito que insiste em imputar ao seu antigo cliente, que em valores históricos alcança a importância de R$ 14,74 (quatorze reais e setenta e quatro centavos), revelando que não autoriza o manejo de uma ação de cobrança junto ao Juízo Cível comum ante a circunstância de que as próprias custas processuais suplantariam o importe a ser reclamado. Por conseguinte, a não utilização daquela faculdade consubstancia-se em mais um elemento que infirma a efetiva existência daquela dívida e denuncia, de qualquer sorte, a ilegitimidade do comportamento que adotara, pois, a despeito de sustentar sua coexistência e qualificar o recorrido como devedor, não adota qualquer providência com escopo de ser solvida essa pendência. Aliás, a par da expressa previsão legal para inversão do ônus da prova em se tratando de relação consumerista, que na espécie se mostra inteiramente pertinente ante a verossimilhança da argumentação tecida pelo consumidor e da circunstância de que afigura-se carente de lastro jurídico dele exigir que comprovasse que, após efetivar um pagamento mediante instrumento da emissão da própria prestadora de serviços, não persistia qualquer débito remanescente afligindo-o, à recorrente ficara imputado o encargo de, sustentando a coexistência da dívida que insiste em imputar ao seu antigo cliente, evidenciar essa ocorrência mediante elementos idôneos e suficientes para afastar as evidências que militam em seu desfavor. Contudo, ignorando o ônus que lhe estava debitado, não produzira qualquer elemento de prova passível de afastar as evidências que emergem do recibo cotejado e do relacionamento que existira entre as partes. Patenteado, então, que a recorrente não evidenciara a coexistência do débito que invocara em socorro da argumentação que delineara, afigura-se ilícita sua imputação em desfavor do recorrido e, mais ainda, sua qualificação como inadimplente, a inserção do seu nome no cadastro de devedores inadimplentes que mantém e a recusa por ela manifestada quanto à sua readmissão como usuário dos serviços de telefonia móvel que oferece. A anotação promovida e recusa havidas revelam, assim, o profundo menosprezo da recorrente para os consumidores e para os seus antigos clientes, pois, ignorando sua condição de prestadora de serviços públicos, imputa um débito cuja causa subjacente não evidenciara a um antigo usuário dos seus serviços e, com estofo nessa dívida indemonstrada, recusa-se a readmiti-lo como seu assinante e com ele concertar novo ajuste. Em sendo assim, comprovada a inexistência do débito indevidamente imputado ao recorrido e a ilegitimidade da recusa que lhe fora endereçada em ser readmitido como usuário dos serviços de telefonia móvel oferecidos pela recorrente, sua qualificação como devedor inadimplente, sua inadmissão como cliente da prestadora de serviços e a própria frustração da compra do aparelho celular que almeja adquirir, que fora motivada pela recusa em ser habilitado como assinante, caracterizam-se como ofensas indevidas contra a sua credibilidade, decoro e bom nome, qualificando-se como danos de natureza intrínseca e fato gerador da compensação pecuniária almejada, mesmo porque não podem ser reputados como meros transtornos próprios da vida em sociedade e das relações comerciais que estão impregnadas no cotidiano de todo e qualquer consumidor. Ressalte-se, inclusive, que os danos que experimentara não derivaram da inadimplência e caracterização da mora do recorrido, pois essas ocorrências restaram afastadas ante o pagamento que promovera e a inexistência de comprovação acerca de qualquer débito remanescente afetando-o, mas, isso sim, da sua inserção no rol dos maus pagadores mantido pela recorrente quando não havia incorrido em mora ou deixado de adimplir quaisquer obrigações assumidas junto a ela, o que deixa patente o nexo de causalidade jungindo a ação da ofensora ao resultado danoso advindo. Inexiste, outrossim, qualquer excludente de ilicitude apta a retirar da recorrente a responsabilidade pelo fator gerador da pretensão indenizatória aduzida em seu desfavor, pois os atos lesivos emergiram exclusivamente da sua iniciativa e do seu menosprezo para com os usuários dos serviços públicos que oferece e honra alheia. Diante de tão inequívocos parâmetros deflui a nítida evidência de que, a despeito de não se encontrar em mora quanto a qualquer das obrigações que eventualmente havia assumido junto à recorrente ou a quaisquer outros estabelecimentos comerciais, fora o recorrido inscrito no rol de inadimplentes por ela mantido e, diante dessa anotação, tratado como devedor relapso e renitente quanto ao cumprimento das obrigações que assume. Essa ocorrências derivaram da exclusiva culpa da recorrente pois, descurando-se quanto às obrigações que lhe estavam afetas na condição de fornecedora de serviços e ignorando a circunstância de que os serviços que prestara haviam sido integralmente quitados, continuara obrando como se o avençado entre as partes não houvesse se exaurido ante o resgate dos débitos que estavam afetos ao seu assinante e o seu conseqüente cancelamento. As situações vexatórias enfrentadas pelo recorrido são impassíveis de questionamento e independem mesmo de prova ante a circunstância de que atualmente, consoante é público e notório, a inadimplência campeia soberana nos vínculos obrigacionais derivados dos mais variados relacionamentos contratuais existentes, denunciando que presumivelmente fora alcançado por esse estigma e por comentários não condizentes com sua postura em decorrência de débito que não era da sua responsabilidade, caracterizando-se, efetivamente, como sofrimentos de natureza íntima que efetivamente afetaram sua auto-estima e macularam sua reputação e dignidade. Essas ocorrências ficam ainda mais evidentes quando se depara com a situação em que, a par de lhe ter sido imputado um débito inexistente, pois carente de comprovação, fora tratado como inadimplente e compelido a desfazer uma transação comercial que havia engendrado, o que restara apurado de forma incontroversa por ter merecido qualquer contrariedade proveniente da própria ofensora. Aliás, é inexorável o vexame e os constrangimentos que qualquer consumidor experimenta quando, ao se dirigir a um estabelecimento comercial objetivando adquirir determinado bem de consumo, tem seu intento frustrado em decorrência de ser indevidamente qualificado como inadimplente. Essas máculas são otimizadas quando o ocorrido é presenciado por estranhos e determina a frustração da transação comercial almejada, impregnando no âmago do antigo profunda e indelével nódoa que o acompanhará pelo resto da sua existência, merecendo, pois, uma compensação pecuniária como forma de minorar o sofrimento que experimentara e conferir-lhe um lenitivo para as ofensas que sua honra sofrera. Ora, diante do realce conferido à proteção dos direitos individuais pelo legislador constituinte, os enunciados constantes do artigo 5ş, inciso X, da vigente Constituição Federal, sepultando controvérsias até então reinantes, içaram à condição de dogmas constitucionais a possibilidade do dano moral derivado de ofensa à vida privada, à honra e à imagem das pessoas ser indenizado. A novidade decorrente desse dispositivo é a introdução do dano moral como fato gerador do direito à reparação, pois não integrava a tradição do nosso direito a indenização material do dano puramente moral. E o dano moral, como se sabe, é a ofensa a interesses não patrimoniais de pessoa física ou jurídica, proveniente de um ato lesivo. Qualquer lesão que alguém sofra no objeto do seu direito repercutirá, necessariamente, em seu interesse, gerando, conseqüentemente, o direito de ser indenizado. Assim, qualquer ofensa que a pessoa sofra na sua integridade física ou moral, provocando-lhe danos materiais efetivos ou afetando seu bem-estar intrínseco, ceifando-lhe as perspectivas de vida ou felicidade, causando-lhe uma diminuição da sua capacidade de viver bem consigo mesmo e no contexto social, desviando-a do seu projeto de vida inicial, é passível de merecer a correspondente reparação. O que é relevante é que, em conformação com o consignado no dispositivo constitucional em cotejo, a responsabilidade civil derivada de ofensa à integridade física, moral ou à imagem de qualquer pessoa adquirira outro patamar, uma vez que o cabimento da indenização já não depende da caracterização ou ocorrência de qualquer prejuízo material efetivo, bastando, para sua caracterização, tão somente a ocorrência do ato lesivo e seu reflexo na personalidade do ofendido. E não se trata, ressalte-se, de pagar a dor do lesado, ainda que não tenha enfrentado qualquer desfalque patrimonial, mas, em verdade, de outorgar-lhe uma compensação pecuniária como forma de atenuar as dores que lhe foram impregnadas pela ação lesiva do agente.
Das balizas alinhavadas emerge a irreversível evidência de que na hipótese em tela se divisam nitidamente a presença dos pressupostos necessários para que o recorrido efetivamente mereça uma compensação pecuniária compatível com as ofensas que foram direcionadas à sua dignidade e bom nome pelos percalços e dissabores que experimentara em decorrência da negligência da recorrente ao permitir que seu nome fosse anotado no cadastro de devedores renitentes que mantém quando não havia incorrido em mora ou sequer apresentava-se como devedor. Ademais, estando patenteado que a recorrente exorbitara os direitos que lhe são assegurados pelo ordenamento jurídico, pois imputara ao consumidor débito que já havia sido resgatado e, em seguida, recusara-se a readmiti-lo como usuário dos serviços públicos de telefonia celular que oferece, fica caracterizado que praticara um ilícito ao qualificá-lo como inadimplente quando não detinha a condição de sua credora e nem estava caracterizada a inadimplência apta a legitimar a recusa que manifestara, não estando, pois, legitimada a promover qualquer medida, judicial ou extrajudicial, objetivando receber a satisfação de um direito que não detém e negar-se a prestar serviços aos quais estava legalmente obrigada. Apurados, então, a ação da recorrente, que consistira na indevida anotação do nome do recorrido no cadastro de devedores inadimplentes que mantém quando não havia incorrido em mora e nem podia ser reputado inadimplente, o dano, que é representado pelas ofensas direcionadas ao bom nome do recorrido e às situações vexatórias a que fora submetido em decorrência de ser qualificado como mau pagador e ser recusado como usuário de serviços de telefonia celular oferecidos pela ofensora, afetando sua dignidade, decoro e auto-estima, o nexo de causalidade jungindo o proceder do lesante às lesões intrínsecas experimentadas pelo ofendido e, por fim, a irreversível culpabilidade da recorrente, ficam caracterizados todos os pressupostos para a geração da obrigação de compensar os danos que provocara. Desse modo, estando evidente que o recorrido fora indevidamente atingido em sua dignidade e reputação em decorrência da sua indevida qualificação como devedor inadimplente e que a causa originária do fato lesivo fora a exclusiva negligência da recorrente, consoante acima delineado, deve-lhe ser assegurada uma satisfação de ordem pecuniária, que não constitui, como é cediço, um pagamento da honra ou dignidade ultrajadas, pois que são imensuráveis e impassíveis de serem ressarcidas, mas representa a consagração e o reconhecimento, pelo ordenamento jurídico, do valor inestimável e importância desses atributos da personalidade, que devem ser passíveis de proteção tanto quanto os bens materiais e interesses pecuniários que também são legalmente tutelados. Outrossim, a expressão pecuniária dos danos experimentados pelo recorrido fora bem mensurada pelo eminente sentenciante, que arbitrara-a em R$ 1.500,00 (hum mil e quinhentos reais) levando em conta as circunstâncias que envolveram a anotação que afligira-o, a recusa que experimentara quanto ao fornecimento dos serviços de telefonia oferecidos pela recorrida e sua situação pessoal, de forma que não merece qualquer mitigação, sob pena de, inclusive, converter-se a reparação deferida em estímulo e prêmio para a ofensora e caracterizar-se como mais uma ofensa para o ofendido, que veria os abalos que experimentara em sua dignidade, bom nome e auto-estima serem compensados por uma quantia irrisória que não representa qualquer compensação, por mínima que seja, aos dissabores e transtornos que experimentara. Da argumentação alinhada deflui a irreversível evidência de que a pretensão indenizatória alinhavada na inicial deve efetivamente ser acolhida e, afigurando-se adequada e conforme com os princípios da proporcionalidade e razoabilidade a mensuração da reparação pecuniária assegurada ao recorrido, ser integralmente improvido o apelo aviado pela recorrente. Diante do exposto, nego provimento ao recurso manejado, mantendo incólume o ilustrado provimento vergastado. Em vassalagem ao princípio da sucumbência albergado pelo artigo 55 da Lei de Regência dos Juizados Especiais (Lei nş 9.099/95), condeno a recorrente no pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios do recorrido que, observados os parâmetros delineados por aludido dispositivo, fixo no equivalente a 15% (quinze por cento) do valor alcançado pela condenação, regularmente apurado nos moldes fixados pelo decisório hostilizado. É como voto. |
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O Senhor Juiz BENITO AUGUSTO TIEZZI Presidente e Vogal |
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Com o Relator. |
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O Senhor Juiz LUCIANO MOREIRA VASCONCELLOS Vogal |
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Com a Turma. |
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DECISÃO |
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Conhecido. Negado provimento ao recurso. Unânime. |
Fonte: Tribunal de Justiça do Distrito Federal