ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA

PROCESSUAL CIVIL. ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA. DUPLICIDADE DE RECURSOS DE APELAÇÃO EM NOME DAS MESMAS PARTES. NÃO CONHECIMENTO DO SEGUNDO RECLAMO. SUSCITADA A ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DO CREDOR HIPOTECÁRIO. OBRIGAÇÃO DE LIBERAR O GRAVAME QUE COMPETE EXCLUSIVAMENTE À CONSTRUTORA, ANTE O RECEBIMENTO INTEGRAL DO PREÇO. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 380 DO STJ. PRELIMINAR ACOLHIDA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO COM RELAÇÃO AO BANCO APELANTE. APLICAÇÃO DO ART. 267, VI, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. MULTA COMINATÓRIA (ASTREINTE) ARBITRADA EM R$ 1.000,00 POR DIA DE ATRASO E COM LIMITE TOTAL DE R$ 30.000,00. VALORES CONDIZENTES COM SUA FINALIDADE E COM OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. EXEGESE DO ART. 461, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS FIXADOS COM BASE NO ART. 20, § 4º, DO REFERIDO DIPLOMA LEGAL. IMPOSSIBILIDADE. DEMANDA EM QUE HOUVE CONDENAÇÃO E QUE DEVE SER VINCULADA AO § 3º. ARBITRAMENTO DO PERCENTUAL DE 10% SOBRE O VALOR DA CAUSA ATUALIZADO. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO DO BANCO RÉU PROVIDO. RECURSO DOS AUTORES PARCIALMENTE PROVIDO.

1. É de responsabilidade exclusiva da construtora/vendedora a outorga da escritura pública definitiva de imóvel integralmente pago, ainda que para seu cumprimento dependa do credor hipotecário, pois tal dependência decorre de relação exclusiva entre ambos, não afetando ou alcançando os adquirentes do imóvel. Nesse sentido, estabelece a Súmula 380 do STJ que: "a hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel".

2. Embora a fixação da multa prevista no art. 461, § 4º, do Código de Processo Civil seja ato discricionário do Magistrado e não exista, a priori, limite para a sua quantificação, o julgador, ao analisar as particularidades do caso concreto, a capacidade econômica das partes e a natureza da obrigação a ser cumprida, deverá buscar um valor adequado a influir no ânimo do devedor, sem que cause sua ruína ou a ineficiência da medida.

3. Os honorários advocatícios a serem pagos pelo sucumbente ao ex adverso devem se amoldar aos parâmetros previstos nas alíneas do § 3º do art. 20 do Código de Processo Civil.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2007.040514-6, da comarca da Capital (4ª Vara Cível), em que são apelantes e apelados Antônio Carlos Alfredo Gaudioso e outros e Banco Bamerindus do Brasil S/A em Liquidação Extrajudicial e outro:

ACORDAM, em Terceira Câmara de Direito Civil, por votação unânime, não conhecer do recurso da autora Anaíze Maria Plentz, dar provimento ao recurso do banco réu para extinguir o feito com relação a ele ante sua ilegitimidade passiva ad causam e dar provimento parcial ao recurso dos autores. Custas legais.

RELATÓRIO

Antônio Carlos Alfredo Gaudioso, Leila Norma Yampey, Fábio Firmino Lopes, Anaíze Maria Plentz, Luiz Antônio Ferreira Magalhães e Rúbia Albers Magalhães ajuizaram "ação declaratória de inexistência de ônus hipotecário c/c pedido de tutela antecipada" em face de BBS - Engenharia e Construções Ltda. e Banco Bamerindus do Brasil S/A, aduzindo, em síntese, que adquiriram apartamentos da construtora ré no Condomínio Residencial Andorra, porém, esta os deu em garantia hipotecária para o banco réu.

Asseveraram que, diante da intervenção do Banco Central na administração do banco réu e do anúncio de sua venda parcial, temem pela perda de seu patrimônio. Salientaram que não pode haver alienação dos imóveis, tendo em vista que as respectivas unidades autônomas constituem bem de família. Por estas razões, requereram a averbação da presente ação nas matrículas dos imóveis e, ao final, a procedência do pedido de cancelamento das hipotecas.

Devidamente citado, o réu ofereceu resposta em forma de contestação (fls. 234/253), alegando, em preliminar, sua ilegitimidade passiva ad causam. No mérito, aduziu que a empresa ré possui dívida pendente, razão pela qual não pode liberar os bens dados em garantia. Sustentou a impossibilidade de concessão de tutela antecipada e ao final, requereu a improcedência do pedido.

Houve réplica (fls. 308/312).

A construtora ré também ofereceu resposta mediante contestação (fls. 344/350), alegando que a liberação da hipoteca depende de autorização da instituição bancária, motivo pelo qual não lhe deve ser imposta multa pelo não cumprimento da obrigação.

Novamente, os autores manifestaram-se por réplica (fls. 375/378).

Em seguida, o MM. Juiz de Direito, Doutor Guilherme Nunes Born, proferiu sentença (fls. 379/386), julgando antecipadamente a lide nos seguintes termos:

Ex positis, JULGO PROCEDENTE o pedido inicial em Ação Ordinária Declaratória de Inexistência de ônus Hipotecário ajuizada por Antonio Carlos Alfredo Gaudioso, Leila Lopes Yampey, Fábio Fermino Lopes, Anaize Maria Plentz, Luiz Antônio Ferreira Magalhães e Rúbia Albers Magalhães em desfavor de BBS - Engenharia e Construções Ltda e Banco Bamerindus S/A, para em conseqüência, DETERMINAR que os réis, dentro do prazo de 10 (dez) dias a contar da presente data, promovam a liberação do ônus real (hipoteca) que recai sobre as unidades imobiliárias adquiridas pelos autores (apto 902 e box duplo de garagem 11 e 11A, apto 701 e box duplo de garagem 07 e 07A e apto 802 e box duplo de garagem sob pena de multa diária no valor de R$ 1.000,00 (hum mil reais) ao arrimo dos §§ 4º e 5º do art. 461, do CPC até o limite de R$ 30.000,00 (trinta mil reais). Com o trânsito em julgado, a emissão de declaração de vontade das partes resta suprida por esta sentença nos termos do art. 466-A do CPC.

Condeno os réus ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, quais fixo em R$ 2.000,00 (dois mil reais), nos termos do art. 20, § 4º, do CPC (grifos originais).

Irresignados, os autores interpuseram recurso de apelação (fls. 391/396) postulando a majoração da multa diária e do valor arbitrado a título de honorários advocatícios. Findaram requerendo o prequestionamento de dispositivos legais.

A advogada e parte Anaíze Maria Plentz, apelou somente em nome próprio (fls. 398/401), pleiteando a majoração da verba honorária.

O banco réu, por sua vez, manifestou sua insurgência às fls. 425/437, reiterando a sua ilegitimidade passiva ad causam e acrescentando a preliminar de carência da ação por falta de interesse processual, pois os autores não comprovaram a quitação de suas dívidas com a construtora ré e, portanto, não podem exigir a liberação do ônus hipotecário. No mérito, defendeu a validade da hipoteca constituída sobre imóvel adquirido em incorporação imobiliária, mesmo porque os autores tinham conhecimento do gravame que constava em cláusula expressa nos respectivos contratos de compra e venda. Ademais, aduziram que devem ser levados em consideração os princípios da boa-fé objetiva e da segurança das relações jurídicas.

Em contra-razões (fls. 410/413), a construtora ré pugna pela manutenção do veredicto.

Os autores e o banco réu deixaram transcorrer in albis o prazo para ofertar contra-razões (certidões de fls. 415 e 442).

VOTO

1. Ab initio, impende salientar que embora seja possível o causídico da parte postular, em nome próprio, o aumento dos honorários advocatícios, no presente caso, em razão de determinada particularidade, o recurso interposto por Anaíze Maria Plentz em 29.06.07 não deve ser conhecido.

Isto porque o advogado que efetivou o substabelecimento com reserva de poderes à autora, Doutor José Darci da Rosa, já havia apeladono dia 19.06.07 em nome de todos os autores às fls. 391/396, irresignando-se, inclusive, acerca do valor arbitrado a título de honorários advocatícios, razão pela qual pleiteou sua majoração.

Dessa forma, ante a impossibilidade de existência de duas apelações interpostas pela mesma parte versando sobre idêntica matéria, não se conhece do recurso interposto por Anaíze Maria Plentz.

2. A respeito das condições da ação, lecionam Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery:

Para que o juiz possa aferir a quem cabe a razão no processo, isto é, decidir o mérito, deve examinar questões preliminares que antecedem lógica e cronologicamente a questão principal: o mérito, vale dizer, o pedido, a pretensão, o bem da vida querido pelo autor. O mérito é a última questão que, de ordinário, o juiz deve examinar no processo. Essas questões preliminares dizem respeito ao próprio exercício do direito de ação (condições da ação) e à existência e regularidade da relação jurídico processual (pressupostos processuais). As condições da ação possibilitam ou impedem o exame da questão seguinte(mérito). Presentes todas, o juiz pode analisar o mérito, não sem antes verificar se também se encontram presentes os pressupostos processuais. Ausente uma delas ou mais de uma, ocorre o fenômeno da carência de ação (CPC 301, X), circunstância que torna o juiz impedido de examinar o mérito. A carência de ação tem como conseqüência a extinção do processo sem julgamento do mérito (CPC 267 VI). As condições da ação são três: legitimidade das partes (legitimatio ad causam), interesse processual e possibilidade jurídica do pedido. As condições da ação são matérias de ordem pública a respeito da qual o juiz deve pronunciar-se ex officio, a qualquer tempo e grau de jurisdição, pois a matéria é insuscetível de preclusão (Código de Processo Civil Comentado, 9ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 435/436).

Especificamente acerca da legitimidade das partes, dispõem os citados autores que: "parte, em sentido processual, é aquela que pede (parte ativa) e aquela em face de quem se pede (parte passiva) a tutela jurisdicional. [...] quando existe coexistência entre a legitimidade do direito material que se quer discutir em juízo e a titularidade do direito de ação, diz-se que se trata de legitimação ordinária para a causa, que é a regra geral: aquele que se afirma titular do direito material tem legitimidade para, como parte processual (autor ou réu), discuti-lo em juízo. Há casos excepcionais, entretanto, em que o sistema jurídico autoriza alguém a pleitear, em nome próprio, direito alheio. Quando isso ocorre há legitimação extraordinária, que, no sistema brasileiro, não pode decorrer da vontade das partes, mas somente da lei" (ob. cit. p. 436).

Na hipótese dos autos, com sustentáculo no adimplemento integral do débito, pleiteiam os autores a liberação do ônus hipotecário pendente sobre seus imóveis, o qual decorre de empréstimo realizado junto ao banco réu pela construtora. Esta, por sua vez, reluta em cumprir sua obrigação ao argumento de que cabe ao banco liberar os imóveis.

Ora, se por um lado é verdade que só o credor hipotecário (no caso o Bamerindus), pode fornecer o documento de liberação da garantia, por outro, é exclusivamente da construtora ré, e jamais dos autores, a obrigação de propiciar os meios para a sua concretização. Vale dizer que se a BBS Engenharia e Construções Ltda valeu-se de financiamento para incrementar sua empresa, cumpre apenas à ela a liberação da garantia real das unidades vendidas e inteiramente pagas pelos compradores, não lhe aproveitando qualquer escusa.

Nesse sentido, aliás, é o disposto na Súmula 380 do Superior Tribunal de Justiça: "A hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel".

As Cortes Nacionais não divergem deste entendimento, senão vejamos:

CIVIL E PROCESSUAL. ACÓRDÃO ESTADUAL. NULIDADE NÃO CONFIGURADA. COMPRA E VENDA. IMÓVEL DADO EM HIPOTECA PELA CONSTRUTORA A AGENTE FINANCEIRO. QUITAÇÃO DO PREÇO PELO ADQUIRENTE. OUTORGA DE ESCRITURA DEFINITIVA POR DETERMINAÇÃO JUDICIAL. LIBERAÇÃO DO ÔNUS REAL. SÚMULA N. 308-STJ.

[...]

II. 'A hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel' - Súmula 308 -STJ (STJ, Resp. n.º 248781/MG, Min. Aldir Passarinho Junior).

AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PRECEITO COMINATÓRIO AJUIZADA EM FACE DE COMPROMITENTE VENDEDORA DE APARTAMENTO. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO DO CREDOR HIPOTECÁRIO INEXISTENTE. OBRIGAÇÃO DA VENDEDORA EM OUTORGAR ESCRITURA PÚBLICA SEM O ÔNUS HIPOTECÁRIO DIANTE DO RECEBIMENTO INTEGRAL DO PREÇO. MULTA COMINATÓRIA DIÁRIA. MANUTENÇÃO DO VALOR.

1. Sem que atinja a esfera jurídica do credor hipotecário porquanto a ação de obrigação de fazer limita-se a exigir da compromitente vendedora o cumprimento do contrato com a outorga de escritura pública sem ônus, depois de pago o preço integral, não existe litisconsórcio necessário, conforme inteligência do artigo 47, do CPC.

2. Ainda que a compromitente vendedora concorde em outorgar a escritura pública, deixa de cumprir sua obrigação se o faz sem a liberação da hipoteca em razão de financiamento para o término da obra, sendo lídima a pretensão do compromissário comprador em compeli-la a esse desiderato, uma vez paga a integralidade do preço.

3. A pena de multa diária tem por finalidade persuadir a devedora à realização da obrigação à qual foi condenada, razão pela qual seu valor não pode ser ínfimo. RECURSO NÃO PROVIDO (TJPR, AC n.º 334.639-2, Des. Hayton Lee Swain Filho).

CONTRATO - Compromisso de compra e venda - Obrigação de fazer - Tutela antecipada - Desconstituição de hipoteca - Citação do credor hipotecário, na condição de terceiro - Desnecessidade - Direitos deste que não serão alcançados pelo resultado da causa - Hipótese, ademais, de pessoa estranha ao vínculo negociar entre autor e réu - Litisconsórcio necessário não configurado - Dispensa da emenda da inicial para inclusão do credor hipotecário no pólo passivo - Recurso provido para esse fim (TJSP, JTJ 252/245).

LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO - Inocorrência - Compromissário comprador de imóvel dado em garantia hipotecária - Contratante que, apesar de estar ciente do gravame, não responde por ele, eis que o compromisso de compra e venda não transfere o domínio do imóvel, não existindo nenhuma vinculação desse com o credor hipotecário, mas, sim, a do proprietário devedor (1º TACívSP, RT 802/249).

OBRIGAÇÃO DE FAZER - DESONERAÇÃO DE ÔNUS HIPOTECÁRIO INCIDENTE SOBRE IMÓVEL VENDIDO - RESPONSABILIDADE DO VENDEDOR - LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO DO CREDOR HIPOTECÁRIO - NÃO OCORRÊNCIA - MULTA POR INADIMPLEMENTO - LIMITAÇÃO.

Aquele que se obriga a obter desoneração, de ônus hipotecário, existente sobre imóvel por ele alienado, é parte passiva legítima para o processo de execução de obrigação de fazer, não existindo litisconsórcio passivo necessário com o credor hipotecário, que não participou do contrato de compra e venda (TJMG, AC n.º 380.428-8, Des. Guilherme Luciano Baeta Nunes).

Igualmente, entende este Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO COMINATÓRIAPARA A ENTREGA DE ESCRITURA PÚBLICA DEFINITIVA DE IMÓVEL. INTERLOCUTÓRIA QUE REVOGA DECISÃO ANTECIPATÓRIA DE TUTELA PROFERIDA HÁ 6 (SEIS) ANOS, E CONFIRMADA PELO TRIBUNAL DE JUSTIÇA HÁ 3 (TRÊS) ANOS. IMPOSSIBILIDADE. MATÉRIA ENFRENTADA NA INSTÂNCIA SUPERIOR. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA SEGURANÇA JURÍDICA E DA HIERARQUIA DOS ÓRGÃOS JUDICANTES. INTERLOCUTÓRIA REVOGADA. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA MANTIDA. DETERMINADA A CITAÇÃO DA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, CREDORA HIPOTECÁRIA DA RÉ/AGRAVADA, PARA INTEGRAR O PÓLO PASSIVO DA DEMANDA. DESNECESSIDADE. OBRIGAÇÃO EXCLUSIVA DA AGRAVADA (CONSTRUTORA) DE OUTORGAR A ESCRITURA PÚBLICA SEM O ÔNUS HIPOTECÁRIO, ANTE O RECEBIMENTO INTEGRAL DO PREÇO. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 380 DO STJ. DECISÃO REFORMADA. RECURSO PROVIDO.

1. "A retratação do despacho agravado sobre a intempestividade torna, em princípio, prejudicado o recurso dele interposto, porém não quando o órgão ad quem, ao qual foi devolvida a matéria, já houver se manifestado pela sua manutenção, improvendo o agravo de instrumento por decisão do relator, porquanto, aí, a jurisdição não mais pertence à 1ª instância e implicaria em subversão à hierarquia dos órgãos judicantes" (Resp n.º 679.351/PR, Min. Aldir Passarinho Junior).

2. É de responsabilidade exclusiva da construtora/vendedora a outorga da escritura pública definitiva de imóvel integralmente pago, ainda que para seu cumprimento dependa do credor hipotecário, pois tal dependência decorre de relação exclusiva entre ambos, não afetando ou alcançando os adquirentes do imóvel. Nesse sentido, estabelece a Súmula 380 do STJ que: "a hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel" (AI n.º 2007.006562-9, deste relator, com votos vencedores dos Exmos Srs. Desembargadores Fernando Carioni e Salete Silva Sommariva - sem grifo no original).

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO ORDINÁRIA DE CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER - PRECEITO COMINATÓRIO - OUTORGA DE ESCRITURA DEFINITIVA - CONTRATO PARTICULAR DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL - ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DO ENTE BANCÁRIO RESPONSÁVEL PELO FINANCIAMENTO DA OBRA - EXCLUSÃO DE OFÍCIO DA RELAÇÃO PROCESSUAL - MÉRITO - CIÊNCIA DO PROMITENTE COMPRADOR ACERCA DO GRAVAME HIPOTECÁRIO - IRRELEVÂNCIA - INTEGRALIZAÇÃO ANTECIPADA DO PREÇO - OUTORGA DA ESCRITURA PELA CONSTRUTORA DEVIDA - PREVISÃO CONTRATUAL - CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - APLICABILIDADE - PENA COMINATÓRIA - INCIDÊNCIA - INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 84, §4º, DO CDC E 461, §4º, DO CPC - SENTENÇA REFORMADA - RECURSO PROVIDO.

Quitado o imóvel e verificado o vencimento da obrigação assumida pela apelada junto ao ente financeiro, deverá aquela providenciar, imediatamente, a outorga definitiva da escritura, não obstante hipotecado o bem junto ao banco credor e ciente o promitente comprador do gravame (AC n.º 2003.024043-8, Des. Wilson Augusto do Nascimento, com votos vencedores deste relator e do Exmo. Sr. Des. Sérgio Izidoro Heil - sem grifo no original).

Logo, se a obrigação de fazer se circunscreve à atuação da construtora ré, ainda que para seu cumprimento dependa do credor hipotecário, tal dependência, repita-se, decorre de relação exclusiva entre ambos, não afetando e nem alcançando o comando judicial buscado pelos autores.

Dessa forma, dá-se provimento ao recurso do Banco Bamerindus do Brasil S/A - em Liquidação Extrajudicial para declarar sua ilegitimidade passiva ad causam e, por conseqüência, julgar extinto o feito com relação a ele com fulcro no art. 267, VI, do Código de Processo Civil.

3. Pleiteiam os autores a majoração da multa imposta no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), limitada ao máximo de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), com a finalidade de compelir a ré ao cumprimento da determinação para que seja a cancelada a hipoteca pendente sobre os imóveis de suas propriedades. Todavia, a sentença não merece reparo neste ponto.

A multa por descumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, decorrente de título judicial, visando garantir a efetividade da medida, ou seja, o cumprimento da obrigação, está prevista no art. 461, § 4º, do Código de Processo Civil, in verbis:

Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.

[...]

§ 4º O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do preceito.

Sobre a fixação das astreintes, ressalta Nelson Nery Junior:

O objetivo das astreintes não é obrigar o réu a pagar o valor da multa, mas obrigá-lo a cumprir a obrigação na forma específica. A multa é apenas inibitória. Deve ser alta para que o devedor desista de seu intento de não cumprir a obrigação específica. Vale dizer, o devedor deve sentir ser preferível cumprir a obrigação na forma específica a pagar o alto valor da multa fixada pelo juiz (Atualidades sobre o Processo Civil, RT, 3ª ed., p. 899).

Assim, a multa diária - astreinte - deve ser fixada em valor razoável, justamente para compelir a parte obrigada a cumprir a determinação judicial e, de outro norte, impedir que não volte a reincidir em atitude perniciosa.

É deste Tribunal:

Conquanto a fixação da multa seja ato discricionário do Magistrado e não exista, a priori, limite para a quantificação, o julgador, ao analisar as particularidades do caso concreto, a capacidade econômica das partes e a natureza da obrigação a ser cumprida, deverá buscar um valor adequado a influir no ânimo do devedor, sem que cause sua ruína ou a ineficiência da medida (AI n.º 2006.001105-6, deste Relator).

É legal a fixação de multa cominatória por dia de atraso, com o escopo de forçar o cumprimento da obrigação, consoante o artigo 461, § 4º, do Código de Processo Civil. Assim, deve ser fixada em valor razoável justamente para compelir a parte obrigada a cumprir a determinação judicial e, de outro norte, impedir que não volte a reincidir em atitude perniciosa (AI n.º 2003.014389-0, Des. Fernando Carioni).

A multa imposta em ação de natureza cominatória não se reveste da menor ilegalidade, com a sua imposição importando em uma verdadeira coação estatal, coação essa que constitui-se na característica básica da sanção cominatória, pois, se diferente fosse, não exerceria sobre o obrigado a necessária força de cominação (AC n.º 1997.011324-2, Des. Trindade dos Santos).

Destarte, diante da finalidade da multa pecuniária estabelecida, bem como das diretrizes dos princípios que a norteiam (proporcionalidade e razoabilidade), entende-se que a majoração da astreinte causaria enriquecimento ilícito aos autores, razão pela qual mantém-se o valor fixado por cada dia de atraso (R$ 1.000,00), bem como a limitação máxima (R$ 30.000,00).

4. É cediço que as demandas nas quais não há condenação, não têm o arbitramento de honorários advocatícios vinculado aos limites máximo e mínimo, e sim, aos parâmetros estampados nas alíneas do § 3º do art. 20 aproveitados para a regra do § 4º, do Código de Processo Civil.

Sobre o tema, colhe-se da doutrina pátria:

Por causa onde não houver condenação devem ser entendidas aquelas que culminam com sentença meramente declaratória (incluídas aqui as que julgam improcedente ação condenatória) ou constitutiva. Nestas não há valor da condenação para servir de base para a fixação dos honorários. O juiz deverá servir-se dos critérios das alíneas do CPC 20 § 3º para fixar a verba honorária (NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante. 10. ed. rev. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 224).

Deixarão de ser observados os limites em questão (máximos e mínimos) quando a causa for de pequeno valor ou de valor inestimável, bem como quando não resultar em condenação, tal como se dá nas sentenças de improcedência do pedido, nas constitutivas e nas declaratórias. E, de modo gera, em todas as condenações em que for vencida a Fazenda Pública (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 1. Rio de Janeiro: Forense, 2007. p. 108).

Todavia, equivocou-se o Magistrado a quo ao arbitrar os honorários advocatícios em valor fixo, uma vez que o presente caso não culminou em sentença declaratória ou constitutiva, e sim, condenatória, inclusive com imposição de multa cominatória para compelir o devedor ao cumprimento da obrigação.

Portanto, devem os honorários advocatícios ser fixados consoante dispõe o § 3º e alíneas do art. 20 do Código de Processo Civil, entre os limites de proporção à condenação, por apreciação eqüitativa do julgador, levando-se em consideração o grau de zelo e o trabalho do profissional, o lugar da prestação do serviço, a natureza e a importância do feito e o tempo dispensado.

Ensina Yussef Said Cahali, citando julgado do Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul, que "a verba advocatícia deve ser dosada com observância do critério fixado pelo art. 20, § 3º, do CPC, considerando que a natureza e importância da causa devem ser sopesadas como o trabalho dos advogados; e o tempo que lhes é exigido para o serviço não diz respeito apenas à duração do processo, mas também ao estudo e preparo das razões apresentadas em ambos os graus de apelação; por isso, não tem, nesse ponto, a relevância que a apelante quer dar, o fato do julgamento antecipado da lide; interessa mais a qualidade do trabalho realizado e o proveito obtido para os constituintes que o número de laudas apresentadas" (in Honorários Advocatícios, RT, 3ª ed., p. 469).

Na situação em apreço, a causa nãoexigiu dos advogados dos autores tempo - houve julgamento antecipado da lide - ou trabalho extravagantes, nem estudos que envolvessem questões complexas e grande arcabouço fático. Além disso, o local da prestação dos serviços realizados pelos causídicos é o mesmo em que exercem atividade (Florianópolis).

Diante de tais motivos, com fulcro no art. 20, § 3º, do Código de Processo Civil, arbitra-se os honorários advocatícios devidos pela ré em 10% sobre o valor dado à causa, o qual deverá ser atualizado com base nos índices da Corregedoria-Geral de Justiça desde o ajuizamento da ação até a data do efetivo pagamento.

5. No tocante ao prequestionamento requerido pelos autores da matéria mencionada em sua peça recursal, registra-se que, conforme entendimento reiteradamente explicitado na jurisprudência, "o juiz não está obrigado a responder todas as alegações das partes, quando já tenha encontrado motivos suficientes para fundar a decisão, nem se obriga a ater-se aos fundamentos indicados por ela e tampouco a responder um ou todos os seus argumentos" (EDREsp n.º 231.651, Min. Vicente Leal), sendo dispensável emitir juízo a respeito de mera menção a dispositivos legais e constitucionais para efeito de prequestionamento.

6. Ante o exposto, vota-se no sentido de: a) não conhecer do recurso de apelação de Anaíze Maria Plentz; b) dar provimento ao recurso do Banco Bamerindus do Brasil S/A - em Liquidação Extrajudicial para extinguir o feito sem julgamento do mérito com relação a ele, ante sua ilegitimidade passiva ad causam; c) dar provimento ao recurso dos autores para arbitrar os honorários advocatícios devidos pela ré no percentual de 10% sobre o valor dado à causa, o qual deverá ser atualizado com base nos índices da Corregedoria-Geral de Justiça desde o ajuizamento da ação até a data do efetivo pagamento.

DECISÃO

Nos termos do voto do relator, à unanimidade, não conheceram do recurso da autora Anaíze Maria Plentz, deram provimento ao recurso do banco réu para extinguir o feito com relação a ele ante sua ilegitimidade passiva ad causam e deram provimento parcial ao recurso dos autores.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Fernando Carioni, com voto, e dele participou a Exma. Sra. Des.ª Maria do Rocio Luz Santa Ritta.

Florianópolis, 21 de outubro de 2008.