PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA
Considerações Gerais e aspectos relevantes
Sumário:
1. INTRODUÇÃO
As normas referentes à prescrição e decadência possuem sua disciplina geral disposta nos artigos 189 a 211 do Código Civil, os quais reduzem alguns prazos anteriormente previstos.
Embora se trate de prazos, assemelhando-se em vários pontos, a prescrição e a decadência comportam regras singulares, que dependem do campo específico do Direito em que serão aplicadas.
Deste modo, face às peculiaridades inerentes à matéria e à especial importância atribuída ao tema, analisaremos nos tópicos a seguir as semelhanças e diferenças entre estes dois institutos jurídicos.
2. RENÚNCIA E NÃO EXERCÍCIO: ELEMENTOS EXTINTIVOS DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS
Para que se possa traçar as reais semelhanças e distinções entre os institutos da prescrição e da decadência, necessário torna-se estabelecer as diferenças entre a renúncia e o não exercício de um direito como forma de extinção do mesmo.
Primeiramente, em ambos os casos, trata-se de um negócio jurídico que pode ser unilateral, ou bilateral. Na renúncia, a vontade declarada é considerada como um dos fatores mais importantes a serem analisados, pois o titular de um a direito que assume a obrigação de não exercê-lo ficará, sem volta, vinculado ao que declarou. Ou seja, na renúncia aquele que decidir por não exercer seu direito, não poderá se arrepender e fazê-lo depois, já que estará descumprindo a obrigação contraída.
Em contrapartida, no não exercício o titular, novamente
considerando o elemento volitivo, não realiza atos necessários a tornar o seu direito
efetivo, reservando-se o direito de voltar a exercê-lo, no futuro, se assim for sua
vontade.
Alguns direitos, em razão da importância ao objeto ou ao sujeito, são irrenunciáveis
por força legal, sendo que qualquer declaração de renúncia por parte de seu titular é
ineficaz e nula de pleno direito. Assim ocorre com os direitos trabalhistas e com os
patrimoniais que, além de irrenunciáveis, não podem ser objeto de negócios jurídicos.
Deste modo, para os titulares de tais direitos, reserva-se apenas a faculdade, livre e espontânea, de não exercê-los.
A lei não traz brechas para que o titular de um direito o exerça contra a sua vontade, mas traz situações nas quais o mesmo poderá ser substituído por terceiros interessados. Muito embora alguns dos direitos sejam imprescritíveis, como o de propriedade, a inércia não será para sempre tolerada, existe um prazo para que o direito seja exercido por seu titular. Geralmente a lei estabelece um prazo limite para que o direito seja exercido, extinguindo-o por um fato jurídico: o decurso do tempo, "[...] em nome da segurança das relações jurídicas."
O decurso do tempo pode extinguir um Direito através da prescrição e da decadência.
3. PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA, CONCEITOS E PREVISÃO
LEGAL
Prescrição é a extinção de uma ação judicial
possível, em virtude da inércia de seu titular por um certo lapso de tempo e a
decadência é a extinção do direito pela inércia de seu titular, quando sua eficácia
foi, de origem, subordinada à condição de seu exercício dentro de um prazo prefixado,
e este se esgotou sem que esse exercício tivesse se verificado.
Considerando que a inércia e o tempo sejam elementos
comuns à decadência e à prescrição, estas diferem, contudo, relativamente ao seu
objetivo e momento de atuação. Assim, na decadência, a inércia diz respeito ao
exercício do direito e o tempo opera os seus efeitos desde o nascimento deste, ao passo
que, na prescrição, a inércia diz respeito ao exercício da ação e o tempo opera os
seus efeitos desde o nascimento desta, que, em regra, é posterior ao nascimento do
direito por ela protegido.
Baseando-se na estabilidade que a ordem jurídica deve
assegurar às relações jurídicas, é intuitivo que o tempo é o principal elemento da
prescrição.
São variados os prazos da prescrição, segundo a
importância do caso, a facilidade do exercício da ação etc. Vai de dez dias a cinco
anos, como se vê no artigo 178 do Antigo Código Civil; e aos casos, para os quais não
há prazo previsto, aplica-se a regra geral do art. 177 do mesmo Código.
Questão interessante, ainda relativa ao tempo, é saber-se
quando começa a correr o prazo da prescrição. A explicação mais lógica decorre da
regra segundo a qual a prescrição atuando, como atua, na ação, começa a correr do dia
em que a ação poderia ser proposta e não o foi. É o princípio da "actio
nata", ou seja, a prescrição começa do dia em que nasce a ação ajuizável. È
por estes motivos que a prescrição possui efeito "ex tunc", enquanto a
decadência "ex nunc".
Enquanto a prescrição é suscetível de ser interrompida
e não corre contra determinadas pessoas, os prazos de decadência fluem inexoravelmente
contra quem quer que seja, não se suspendendo, nem admitindo interrupção.
Os institutos da prescrição e da decadência estão
tratados pelo Código Civil de 2002 entre os artigos 189 a 211, nos quais situações
específicas são analisadas. Destarte, o legislador civilista novamente inovou ao tratar
da decadência, instituto não especificado pelo Código Civil de 1916.
O artigo 189 do Código Civil de Miguel Reale traz,
conforme a doutrina majoritária, a maneira de diferenciar os institutos, in verbis:
"Art. 189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue,
pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206."
Deste modo, o Direito de ação, surge com a violação do
Direito material, dando inicio ao prazo prescricional.
4. CRITÉRIOS DE DIFERENCIAÇÃO ENTRE A PRESCRIÇÃO E
A DECADÊNCIA
O critério mais difundido pela doutrina brasileira é este
de que a prescrição extingue a ação e a decadência extingue o direito. Este critério
é alvo de algumas críticas. Neste sentido entende o professor Fábio Ulhoa COELHO:
"Não há critério de distinção entre prescrição
e decadência. Se a própria norma jurídica não fixar a natureza do prazo extintivo do
direito, deve-se pesquisar o entendimento predominante na doutrina e
jurisprudência."
Outro critério também muito difundido é o que considera a época do surgimento do direito de ação. Este critério preleciona que sendo concomitantes direito e ação, o prazo será decadencial, enquanto que se o Direito surgir antes da ação, o prazo será prescricional.
Muitos, também o consideram insuficiente, já que
dependendo do caso concreto, difícil torna-se verificar uma ou outra situação.
Vários são os critérios para explicar a prescrição e a
decadência, contudo muitas também são suas críticas. Como são prazos diferentes, não
podem ser tratados de maneira igual, assim, em primeiro lugar, deve-se verificar se o
direito positivo definiu a natureza do prazo extintivo, se assim a lei não o fez, o passo
seguinte é verificar o entendimento dominante da doutrina e jurisprudência. A doutrina e
jurisprudência geralmente têm entendimento comum acerca dos prazos, mas se ainda assim
persistirem as dúvidas, deve-se entregar a discussão sob o crivo da justiça.
5. QUADRO COMPARATIVO
Veja as principais diferenças entre a prescrição e decadência:
PRESCRIÇÃO |
DECADÊNCIA |
Extingue a ação. |
Extingue o direito. |
Pode ser suspensa ou interrompida por causas preclusivas previstas em lei. |
Não se suspende, nem se interrompe, e só é impedida pelo exercício do direito a ela sujeito. |
Não corre contra todos, havendo pessoas que por consideração de ordem especial da lei, ficam isentas de seus efeitos. |
Corre contra todos, não prevalecendo contra ela as isenções criadas pela lei a favor de certas pessoas. |
A prescrição, depois de consumada, pode ser renunciada pelo prescribente. |
Se resultante de prazo extintivo imposto pela lei não pode ser renunciada pelas partes, nem depois de consumada. |
A prescrição das ações patrimoniais não pode ser, "ex officio", decretada pelo juiz. |
Se decorrente de prazo legal prefixado pelo legislador pode ser conhecida pelo juiz, de seu ofício, independentemente de alegação das partes. |