PARECER OAB SEÇÃO -SC
I- Ementa:
SOCIEDADES DE ADVOGADOS E ADVENTO DO NOVO CÓDIGO CIVIL. INCIDÊNCIA DO ART. 966, PARÁGRAFO ÚNICO. SOCIEDADE NÃO-EMPRESÁRIA (SIMPLES). DISCIPLINA EM LEI ESPECIAL, QUE PREVALECE DIANTE DO PRECEITO GERAL, DE CARÁTER MERAMENTE SUBSIDIÁRIO. MANUTENÇÃO DO STATUS QUO. NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DO DISPOSTO NOS ARTS. 15 A 17, DO EAOAB E NO PROVIMENTO N. 92/00. REGISTRO PERANTE A OAB, QUE DEVE CONSTAR DO CADASTRO NACIONAL DE SOCEDADES DE ADVOGADOS (PROVIMENTO N. 98/02).
II- Relatório
Consulta-nos o ilustre Presidente desta Seccional acerca de eventual repercussão que o novo Código Civil possa ter tido sobre as sociedades de advogados regularmente constituídas, antes ou mesmo depois da vigência daquele diploma.
Segundo nos foi informado por Sua Excelência, a Ordem vem sendo iterativamente questionada acerca do assunto por inúmeros colegas, preocupados que estão com a regularidade das respectivas pessoas jurídicas de que fazem parte.
De outro lado, nós mesmos temos sido alvo de diversas indagações, o que, aliado à solicitação da Presidência da Seccional, justifica plenamente a elaboração do presente parecer, que, embora singelo, visa a tentar esclarecer o tema.
III- Fundamentação Jurídica
A Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, instituiu o Código Civil, em sua Parte Especial, trata, no Livro II, Do Direito de Empresa, regulando as relações jurídicas decorrentes de atividade econômica realizada entre pessoas de direito privado. Este Livro II, por sua vez, está dividido em quatro títulos, a saber: Título I - Do Empresário, Título II - Da Sociedade, Título III - Do Estabelecimento, Título IV - Dos Institutos Complementares.
Apesar da sociedade de advogados estar disciplinada em legislação especial - Lei nº 8.906, de 04 de julho de 1994 (Estatuto da Advocacia e da OAB), inclusive com Capítulo que trata do tema (arts. 15 a 17) - convém tecer-se algumas considerações sobre o advento do novo Código Civil e possíveis repercussões no âmbito daquelas.
Estabelece o art. 966, do referido diploma, o conceito de empresário, in verbis:
"Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.
Já o parágrafo único, do mencionado dispositivo, explica:
"Parágrafo único. Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento da empresa".
O Professor de Direito Comercial Bruno Mattos e Silva, em seu artigo "A TEORIA DA EMPRESA NO NOVO CÓDIGO CIVIL E A INTERPRETAÇÃO DO ART. 966: OS GRANDES ESCRITÓRIOS DE ADVOCACIA DEVERÃO TER REGISTRO NA JUNTA COMERCIAL?" interpreta o comando legal nos seguintes termos:
"A idéia do parágrafo único do art. 966 do novo Código Civil é que a princípio a profissão intelectual não é empresarial por características próprias, isto é, não compreende a organização de fatores de produção. O parágrafo único do art. 966 diz a profissão intelectual, a despeito de ter conteúdo econômico (o parágrafo único usa a palavra "profissão", o que denota o caráter econômico) não é empresarial, mesmo se existentes auxiliares ou colaboradores" (http://www.rantac.com.br/users/jurista/art-966.htm)
Na lição de Miguel Reale "a sociedade se desdobra em sociedade econômica em geral e sociedade empresária. Têm ambas por fim a produção ou a circulação de bens ou serviços, sendo constituídas por pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir para o exercício de atividade econômica e a partilha entre si dos resultados." (in Invencionices sobre o Código Civil, fonte: http://www.estado.estadao.com.br/editoriais/03/02/15/ aberto001.html).
E, no tocante àquelas objeto do presente estudo, continua o mestre:
"Exemplo típico de sociedade econômica não-empresária é a constituída entre profissionais do mesmo ramo, como, por exemplo, a dos advogados, médicos ou engenheiros, configurando-se como sociedade simples (artigos 966 e 981) cujo contrato social é inscrito no Registro Civil das Pessoas Jurídicas, salvo quando se tratar de sociedade de advogados que se inscreve apenas na OAB (artigo 16 da Lei 8.906/94).(...)
Exemplos corriqueiros de sociedade simples são as numerosas sociedades que reúnem os que exercem a mesma profissão, tal como se dá com advogados, engenheiros, médicos, etc., à vista do parágrafo único do artigo 966, segundo o qual ´não se considera empresário quem exerce profissão intelectual de natureza científica, literária ou artística, ainda que com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento da empresa´" (op. cit.).
Ressalte-se, novamente, que a atividade de advocacia está disciplinada em lei especial, a Lei nº 8.906, de 04 de julho de 1994 (Estatuto da Advocacia), inclusive com Capítulo que trata da Sociedade de Advogados.
O artigo 15, do Estatuto da Advocacia, dispõe:
"Art. 15º Os advogados podem reunir-se em sociedade civil de prestação de serviço de advocacia, na forma disciplinada nesta Lei e no Regulamento Geral."
E o § 1o, do mesmo dispositivo, é taxativo:
"A sociedade de advogados adquire personalidade jurídica com o registro aprovado dos seus atos constitutivos no Conselho Seccional da OAB em cuja base territorial tiver sede."
O Provimento nº 92/2000 do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil elencou os requisitos necessários à elaboração do contrato social de constituição da sociedade de advogados, facultando a sua celebração por instrumento público ou particular, porém, vedando a adoção de qualquer das espécies de sociedade mercantil, inclusive na composição da razão social e reiterando que as sociedades serão inscritas junto à Instituição.
Reforçando o disposto no dito Provimento, o mesmo eg. Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, editou o Provimento n. 98/2002, onde, além de reforçar o exposto no referido Provimento, criou o Cadastro Nacional das Sociedades de Advogados, que será mantido por aquele próprio Conselho Superior.
Além de tudo isto, há que não se olvidar o princípio basilar segundo o qual "lex specialis derogat lex generalis", vale dizer, havendo lei específica tratando das sociedades de advogados, as mesmas devem por ela ser regidas, restando o Código Civil apenas a aplicação subsidiária.
Assim é que, embora não pareça concordar com esta conclusão, Bruno Mattos e Silva admite que seja a interpretação que acabará vigorando. É o que se denota da seguinte passagem de seu texto já referido:
"Embora tecnicamente equivocada, é bem provável que prevaleça interpretação ao art. 966 do novo Código Civil no sentido de que a profissão intelectual (incluindo, portanto, as sociedades de advogados), mesmo se tiverem trabalhadores contratados e contem com forte estrutura material, não são sociedades empresárias" (op. cit.).
É no que também acreditamos, embora discordemos, data venia, da premissa colocada pelo ilustre autor.
III- Conclusão
Conclui-se, portanto, que as sociedades de advogados se enquadram como sociedades econômicas não-empresárias (simples), previstas no parágrafo único, do artigo 966, do Código Civil, disciplinadas em lei especial, a Lei nº 8.906, de 04 de julho de 1994 (Estatuto da Advocacia e da OAB) e o Provimento nº 92/2000 do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.
Logo, o advento do novel diploma em nada alterou a disciplina das sociedades civis de advogados, que continuam a ser regidas pelas disposições estatutárias pertinentes.
É o que nos parece, s.m.j.
Florianópolis, 30 de abril de 2003.
André Luiz Tambosi Marcos André Bruxel Saes
OAB/SC 11.671 OAB/SC 6.267-II