Acórdão na Íntegra
APELAÇÃO CÍVEL Nº 120.071-7, DA VARA CÍVEL DA COMARCA DE SANTO ANTONIO DA PLATINA

Apelante: BANCO BANESTADO S/A
Apelado: WILLIAM BRANDANI
Relator: Juiz Convocado MANASSÉS DE ALBUQUERQUE

APELAÇÃO. INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. CHEQUE COM ASSINATURA FALSIFICADA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.
Os bancos como prestadores de serviços estão submetidos às disposições do Código de Defesa do Consumidor (artigo 3º, § 2º).
O banco é responsável pelo pagamento de cheque falso, por ter assumido o risco e a obrigação de vigilância, garantia ou segurança sobre o objeto do contrato, só se eximindo se houver culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro (artigo 14, § 3º, inciso II, do Código de Defesa do Consumidor).
Recurso desprovido.




VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 120.071-7, da Vara Cível da Comarca de Santo Antonio da Platina, em que figura como apelante BANCO DO ESTADO DO PARANÁ S/A e apelado WILLIAM BRANDANI.

1. WILLIAM BRANDANI propôs ação de Indenização em face do BANCO DO ESTADO DO PARANÁ S/A aduzindo que há muito tempo é titular de contas correntes junto ao banco réu, mantendo regular movimentação, porém no ano de 1997 constatou diversas irregularidades consubstanciadas por pagamentos de diversos cheques contendo assinatura falsificada; que referidos cheques foram submetidos a exame grafotécnico perante o Instituto de Criminalística do Estado do Paraná onde se constatou a falsidade; que o banco agiu de forma negligente, não examinando nem mesmo superficialmente a firma existente nos cheques, pois as assinaturas foram grosseiramente falsificadas. Requereu a condenação na quantia de R$ 36.056,00, acrescidos de juros e correção monetária a partir da data do pagamento de cada cheque.
Em contestação o réu alegou, preliminarmente, ilegitimidade passiva ad causam. No mérito, argumenta ter o autor agido com dolo por não ter comunicado ao banco ou mesmo sequer ter juntado boletim de ocorrência questionando o que ocorreu com seu talonário de cheques.
Por sentença proferida às fls. 58 e verso, o MM. Juiz julgou procedente o pedido, condenando o réu ao pagamento de R$ 36.056,00 (trinta e seis mil e cinqüenta e seis reais), corrigidos monetariamente desde a data do efetivo prejuízo, pelo índice do INPC, acrescido de juros de mora da data do pagamento indevido. Condenou, também, ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios arbitrado em 10% sobre o valor da condenação.
Inconformado, tempestivamente, apela o Banco do Estado do Paraná S/A, aduzindo que não poderia ter sido julgada a causa sem ao menos levar em consideração os fatos descritos na contestação e os documentos juntados aos autos; que o Código de Defesa do Consumidor somente poder ser aplicado quando houver desequilíbrio entre as partes contratantes, expondo o consumidor a ampla desvantagem; que não acatar os fatos que realmente ocorreram, alegando aplicação do Código de Defesa do Consumidor, não é a forma mais justa de dirimir o conflito; que o apelado em momento algum comunicou o apelante ou mesmo juntou boletim de ocorrência questionando o que ocorreu com seu talonário de cheques; que a Lei nº 8.078/90 não revogou os enunciados e súmulas nº 28 do Supremo Tribunal Federal; que para ser responsabilizado sobre o evento danoso, precisava haver nexo causal entre a conduta do apelante e o dano experimentado, o que não ocorreu, já que não era falso grosseiro tanto que foi submetida a exame grafotécnico.
Contra-arrazoado o recurso (fls. 70/77) vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.


2. Presentes os requisitos de admissibilidade impõe-se o conhecimento do presente recurso.
Cuida-se de pedido de indenização onde o apelado assevera que detinha uma conta corrente junto ao apelante, mantendo regular movimentação, quando percebeu ter havido o pagamento de vários cheques falsificados.
Mister se faz inicialmente verificar-se se trata ou não de relação de consumo.
Analisando-se o artigo 3º, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor, deduz-se que as instituições bancárias estão inseridas dentro do rol apresentado como pessoas de direito consideradas como fornecedoras, devendo submeter-se às regras ali estabelecidas.
Assim tem sido o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

(...) Os bancos, como prestadores de serviços contemplados no art. 3º, § 2º, estão submetidos às disposições do Código de Defesa do Consumidor. Precedentes do STJ.
Recurso especial não conhecido. (RESP 287828/SP, relator Min. BARROS MONTEIRO, Quarta Turma, decisão 17.05.01).

Nesse sentido também são os seguintes julgados: AGA 296516/SP, AGRESP 219092/RS, AGA 152497 e AGRESP 253953/RS, relatora Min NANCY ANDRIGHI, Terceira Turma; RESP 57974/RS, relator RUY ROSADO DE AGUIAR, Quarta Turma.
Segundo escólio de JOSÉ GERALDO BRITO FILOMENO o conceito de consumidor adotado pelo Código foi exclusivamente de caráter econômico, ou seja, levando-se em consideração tão-somente o personagem que no mercado de consumo adquire bens ou então contrata a prestação de serviços, como destinatário final, pressupondo-se que assim age com vistas ao atendimento de uma necessidade própria e não para o desenvolvimento de uma outra atividade negocial.
Considerando-se que no presente caso trata-se de contrato realizado entre o banco e pessoa física, conclui-se que houve uma relação de consumo onde se buscou a satisfação pessoal de uma necessidade, existindo, portanto, uma atuação como destinatário final.
Pelo exposto, é aplicável, portanto, o Código de Defesa do Consumidor, uma vez que existe uma relação jurídica entre fornecedor e consumidor, atuando este como destinatário final.
Observando-se as normas estabelecidas nesse Código os bancos respondem objetivamente, pelos danos causados aos seus clientes. Ocorrendo defeito no fato do serviço o banco terá que indenizar a vítima independentemente de culpa, bastando a relação de causa e efeito entre o defeito do serviço e o dano (artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor).
Em julgamento proferido pelo Superior Tribunal de Justiça, assim se manifestou:

(...) Tratando-se de relação de consumo, a responsabilidade do fornecedor perante o consumidor é objetiva, sendo prescindível a discussão quanto à existência de culpa. (AGA 268585, relator Min. NANCY ANDRIGHI, Terceira Turma).

Ensina ZELMO DENARI:

A exemplo do que foi estabelecido no artigo anterior, o caput do dispositivo dispõe que a responsabilidade do fornecedor de serviços independe da extensão da culpa, acolhendo, também nesta sede, os postulados da responsabilidade objetiva.
As causas excludentes de responsabilidade do prestador de serviços são as mesmas previstas na hipótese do fornecimento de bens, a saber: que tendo prestado o serviço, o defeito inexiste, ou que a culpa é exclusiva do usuário ou de terceiro.
Reportamo-nos, por isso, aos comentários feitos ao art. 12, lembrando que, também nesta sede, as eximentes do caso fortuito e da força maior atuam como excludentes de responsabilidade do prestador de serviços. E de uma forma muito mais intensa, por isso que podem se manifestar durante ou após a prestação de utilidade ou comodidade ao consumidor.
Desta mesma forma, ensina RODRIGO BERNARDES BRAGA No que tange à responsabilidade do banco sacado pouco importa se o cheque é falso, falsificado ou alterado, pois cumpre-lhe indenizar sempre, salvo nas hipóteses de culpa concorrente ou exclusiva do correntista.
Assim dispõe também o artigo 39, parágrafo único, da Lei nº 7.357/85 e a Súmula 28 do Supremo Tribunal Federal:

Ressalvada a responsabilidade do apresentante, no caso da parte final deste artigo, o banco sacado responde pelo pagamento do cheque falso, falsificado ou alterado, salvo dolo ou culpa do correntista, do endossante ou do beneficiário, dos quais poderá o sacado, no todo ou em parte, reaver o que pagou. (Os grifos não constam do original).

Súmula 28 do STF: O estabelecimento bancário é responsável pelo pagamento de cheque falso, ressalvadas as hipóteses de culpa exclusiva ou concorrente do correntista.

É evidente que, nos termos da lei, deve o Banco manter pessoa treinada para a função de verificar os cheques, sob pena de responder por eventual falha na verificação da assinatura do cheque, que culmine em prejuízo do correntista.
Muito embora, não se exija do bancário capacitação própria de perito grafotécnico, no entanto não se admite que proceda com inépcia ou inexperiência própria de leigo. Ademais, os estabelecimentos bancários devem oferecer atendimento profissional apto e especializado, com aparelhamentos hábeis a detectar falsificações de assinaturas, arcando com os riscos, vigilância, garantia e segurança inerentes ao desempenho desse mister.
No caso dos autos, o falso apresentado não é de difícil percepção, tanto que a perícia afirma que pode-se verificar divergências de ordem genética entre as peças confrontadas, estas sim, significativas (fl. 04).
Destaque-se que a submissão dos cheques a exame grafotécnico não significa que a falsidade não era grosseira, mas apenas tem como finalidade comprovar e assegurar mediante a apreciação de um expert no assunto, a falsidade realizada.
Leciona WILSON RODRIGUES ALVES asseverando que a responsabilidade civil é da instituição financeira porque a ela é que coube a obrigação de conferir a assinatura do emitente através do autógrafo existente na agência, ou mesmo de exigir documento de identidade do apresentante, para o pagamento.
Prossegue o autor destacando que não provada a culpa do correntista, é do banco a responsabilidade pelo pagamento do cheque falso, uma vez que é o estabelecimento bancário quem assume o risco e a obrigação de vigilância, garantia ou segurança sobre o objeto do contrato.
Frise-se, desta forma, que o banco só se eximirá da responsabilidade pelo pagamento de cheques falsificados, se houver culpa exclusiva da vítima ou de terceiro. Assim, o fato de não ter havido comunicação a respeito do desaparecimento das folhas de cheques poderia levar apenas a concorrência de culpa, no entanto isto não é suficiente para excluir a responsabilidade do banco, por ser exigido culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro (artigo 14, § 2º, inciso II, da Lei nº 8.078/90).
Por tais fundamentos, nega-se provimento ao recurso, mantendo-se in totum sentença recorrida.

3. Diante de todo o exposto, ACORDAM os Senhores Desembargadores integrantes da Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em negar provimento à apelação.
O julgamento foi presidido pelo Senhor Desembargador NERIO SPESSATO FERREIRA, com voto, e dele participou o Desembargador RUY FERNANDO DE OLIVEIRA.
Curitiba, 11 de junho de 2002.

Juiz Convocado MANASSÉS DE ALBUQUERQUE
Relator

Não vale como certidão ou intimação.